Governo

Lula defende desculpas e reparação para filhos de vítimas da hanseníase

O presidente da República sancionou uma lei que garante pensão ao público nesta sexta-feira (24)

Por Gabriela Oliva
Publicado em 24 de novembro de 2023 | 19:32
 
 
 
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O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), defendeu nesta sexta-feira (24) que é "preciso pedir desculpas" e "principalmente construir políticas públicas" para reparar os danos da segregação feito contra as pessoas com hanseníese no Brasil. A fala ocorreu durante cerimônia de sanção da lei que institui pensão vitalícia como forma de indenização aos filhos das pessoas que foram separadas de seus pais em colônias de hanseníase no século passado

"Não tem mais sentido a gente ter vergonha de ser chamado de leproso porque a doença pode ser tratada. Ela é como qualquer outra doença que a gente tem. (...)  A luta contra o preconceito é histórica. O preconceito é uma doença grave. Nenhum dinheiro no mundo é capaz de compensar ou apagar as marcas da segregação na alma e no coração das almas das pessoas portadoras de hanseníase", discursou.

De acordo com dados do Movimento de Reintegração dos Acometidos pela Hanseníase (MORHAN), cerca de 15 mil pessoas podem ser diretamente beneficiadas pela nova lei. Em Betim, cerca de 800 filhos que foram separados de seus pais com hanseníase na Colônia Santa Isabel, região do Citrolândia, devem ser atendidos pela proposta

Segundo o presidente, com a assinatura, o governo e a sociedade brasileira estão cumprindo "um compromisso ético e moral de reinserir os brasileiros que foram excluídos do exercício pleno de sua cidadania". "É preciso pedir desculpas e principalmente construir políticas públicas para reparar os danos da segregação nesse país".

 A nova legislação representa uma reparação histórica à decisão do Estado brasileiro que, desde os anos 1920, impunha o isolamento compulsório a pessoas com hanseníase, perdurando por mais de meio século.

Além disso, a legislação estabelece um novo patamar de indenização para aqueles que foram isolados compulsoriamente naquela época, fixando o valor mínimo em um salário mínimo por mês: R$ 1.320. Esse mesmo critério mínimo de indenização resguarda os filhos das pessoas isoladas, agora garantindo-lhes o direito a uma pensão. Os detalhes sobre os valores de indenização e os procedimentos para recebê-la serão regulamentados por meio de decreto posterior.

Ao chegar para a assinatura da lei, Lula recebeu o livro “A Rosa e o Machado, Memórias de um brasileiro excluído”, do escritor Nelson Pereira Flores, sobrevivente da hanseníase. A cerimônia ocorreu no Palácio do Planalto, em Brasília, e contou com a presença dos ministros Nísia Trindade (Saúde), Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Marina Silva (Meio Ambiente), Silvio Almeida (Direitos Humanos) e Márcio Macêdo (Secretaria Geral).

Repercussão

Diretor nacional do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas por Hanseníase (Morhan), morador do Citrolândia e filho de um casal de hansenianos que foi internado de forma compulsória na Colônia, o advogado Thiago Flores destacou que a data de hoje é histórica para o movimento social que luta em prol da causa.

Segundo ele, com a sanção da lei, o Brasil se torna pioneiro por ser o primeiro país do mundo a reconhecer como crime de Estado a separação compulsória de filhos que foram separados de seus pais, por conta da política de isolamento compulsório da hanseniase.

"Para o Morhan, esta é uma conquista fantástica pois conseguiremos dar um pouco de dignidade para essas pessoas, que tiveram seus direitos humanos, fundamentais e sociais violados. Elas foram separadas ainda no início da vida e a forma com que foram criadas, a falta de oportunidades, de acesso à educação e de cuidados básicos na primeira infância fizeram com que elas, socialmente, tivessem uma vida muito humilde. Com essa lei, conseguiremos dar a elas uma velhice mais tranquila", destacou.

Nildo Souza Porto, hoje com 63 anos, se enquadra no público que receberá o benefício. Encaminhado para um educandário em Belo Horizonte quando tinha apenas 10 anos, depois de o pai ter piorado da hanseníase e ter sido internado na Colônia Santa Isabel, ele viveu por anos separado da família.

"Só via minha mãe e meus irmãos por uma janelinha. O contato era pouco. Só com 17 anos, quando arrumei um trabalho, deixaram eu sair de lá", recorda. Morador da Colônia, ele defendeu o pagamento da pensão vitalícia também aos filhos das pessoas com hanseníase, mas afirmou que o benefício "não vai reparar" toda a dor que eles sofreram. "Eu superei o que passei, mas muitos ainda passam muitas dificuldades e não conseguiram superar os traumas", afirmou.

(Com Lisley Alvarenga e Sara Lira)

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