Entrevista

Presidente do Iphan sobre memorial do terrorismo: 'Para que não se repita'

Em entrevista realizada na redação de O TEMPO em Brasília, Leandro Grass diz que trabalho de recuperação dos estragos já foi iniciado e defende que vândalos paguem por prejuízos causados aos cofres públicos

Por Lucyenne Landim
Publicado em 13 de janeiro de 2023 | 14:47
 
 
 
normal

O novo presidente do Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Leandro Grass, confirmou a intenção do governo federal em criar um memorial que reúna informações sobre o ato de terrorismo praticado por bolsonaristas em Brasília (DF), no último domingo (8). O ataque terminou na depredação do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF) e na destruição de objetos e obras de arte de valores inestimáveis.

Em entrevista realizada na redação de O TEMPO na capital federal nesta sexta-feira (13), ele afirmou que a estrutura do espaço ainda está sendo pensada, assim com os objetos que serão expostos e o local onde será montado, mas que sairá do papel para contar o fato lamentável. "A gente precisa que isso seja mostrado para as atuais e futuras gerações para que não se repita, que é o que a política de memória provoca, é o que ela tem a intenção. Tudo isso está no nosso radar e a gente vai aos poucos realizar", afirmou. 

O memorial é defendido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pela primeira-dama Rosângela da Silva, conhecida como Janja, e pela ministra da Cultura, Margareth Menezes. A ideia, de acordo com Grass, "tem a ver justamente com a conexão do povo com a história, apontando para o futuro".

"Política de memória é muito importante no sentido de explicar à sociedade, para que a gente fixe também uma perspectiva de futuro sobre todos esses fatos. Porque não foi apenas depredação física, foi terrorismo, foi violência simbólica", acusou.

Grass informou que o espaço deve acolher sugestões e seguir a linha da política de memória adotada em várias partes do mundo. "Não só na Europa, como também na África e em vários países da América Latina, você tem pontos de memória, como no Brasil também temos, em que há fotografias, há registros visuais, eventualmente até objetos que sinalizam e representam aquilo que aconteceu e, acima de tudo, a mensagem, tudo isso o que foi contado, para que não se repita. É isso que a gente pretende com esse novo espaço que deve ser constituído nos próximos meses", acrescentou.

O presidente do Iphan apontou que um relatório preliminar feito por técnicos do órgão aponta danos deixados por bolsonaristas nos prédios públicos alvos dos vândalos e nos bens móveis, como obras de arte e mobiliário. Por conta do tombamento da Praça dos Três Poderes, que fica no centro dos três prédios atacados, ele informou que há gestão própria dos bens afetados nos locais, mas que o Iphan presta orientação técnica tanto na restauração do acervo destruído, quanto na recuperação do conjunto arquitetônico.

"A gente tem também a recomposição de mobiliário. Os órgãos têm condições já para fazer isso. Por exemplo, cadeiras que foram destruídas na Câmara dos Deputados já estão sendo repostas. Aos poucos a gente vai avançando nesse processo que não vai ser tão curto assim, vai ser longo para a gente concluir e entregar de novo a Praça dos Três Poderes ao povo do Brasil", declarou.

O documento deixa claro, ainda, a necessidade de aprofundar a avaliação de alguns danos para que técnicos entendam o melhor método de recuperação "Certamente alguma outra coisa vai ser irrecuperável, não tem como a gente restaurar. Mas isso agora é o próximo passo. Junto com esses acervos, olhar item por item, o que dá para restaurar, encaminhar, e o que que não dá. [Esse trabalho] já está acontecendo, inclusive. Vários itens do Congresso, por exemplo, e do Palácio, já estão sendo restaurados", afirmou.

Leandro Grass defendeu que os vândalos peguem financeiramente pela destruição que gerou prejuízos aos cofres públicos, mas pontuou que o processo será feito pela Justiça. Na quinta-feira (12), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou o bloqueio de R$ 6,5 milhões em bens de 52 pessoas e sete empresas que financiaram o frete de ônibus para os atos terroristas.

"Essa sinalização de ressarcimento é da própria Justiça. Também foi apontada por outros representantes do nosso governo. E é uma possibilidade. Mais do que uma defesa, eu vejo como a possibilidade, uma oportunidade. Até porque faz parte devido processo legal uma viável possível pena que tem a ver com o ressarcimento. Mas isso é uma decisão judicial, uma decisão do sistema de Justiça que nós vamos aguardar", comentou.

Enquanto não há ressarcimento por parte dos envolvidos nos atos, Grass afirmou que o governo mobiliza parcerias para ampliar o processo de recuperação dos estragos. Ele contou que há gestor no sentido de instituições e organismos internacionais, além de pessoas voluntárias, no sentido de prestar apoio técnico ao processo.

"Vai ser sem dúvida um grande esforço coletivo. Até porque isso que foi destruído, isso que foi depredado criminosamente, não foi apenas um patrimônio, um equipamento do Estado brasileiro e da sociedade brasileira. A violência e o estrago não são só materiais. É também simbólico e isso é incalculável. Quanto custa uma obra do Di Cavalcanti? Os curadores, os artistas e as pessoas que trabalham com obras de arte podem estimar, mas a gente nunca vai chegar a um valor que seja realmente consistente e dizer 'olha, vale tanto'", frisou.

Uma proposta de criação de um canal para doações também é desenhada pelo governo e será debatida em uma comissão intersetorial, liderada pelo Ministério da Cultura, para dar prosseguimento ao processo de restauração. Por parte da pasta comandada por Margareth Menezes, está a ex-presidente do Iphan, Jurema Machado.

Veja abaixo, em vídeo, a íntegra da entrevista com o presidente do Iphan, Leandro Grass:

O TEMPO agora está em Brasília. Acesse a capa especial da capital federal para as notícias dos Três Poderes.

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!