Política em Análise

Bolsonaro do centrão

Filiação ao PL de Valdemar Costa Neto é capítulo final do retorno do presidente ao seu seio político

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 09 de novembro de 2021 | 14:59
 
 
 
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Depois da entrada do centrão no governo, agora é o governo que formalmente entra para o centrão. A confirmação da iminente filiação do presidente Jair Bolsonaro ao PL, de Valdemar Costa Neto, é o capítulo final de uma aproximação que arranha de vez o discurso do presidente da República na campanha e que devolve o ex-deputado federal e hoje chefe do Executivo à posição no cenário político em que construiu sua carreira. O Bolsonaro de 2018, que dizia ser contra tudo o que está aí, não existe mais, e isso estará cravado em seu próprio registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

A escolha pelo PL de Valdemar Costa Neto tem ainda mais simbologia. Depois de negociar com o PTB do igualmente mensaleiro Roberto Jefferson, e com o PP, partido com mais alvos na operação Lava Jato, Bolsonaro escolheu Valdemar, um ex-deputado que renunciou para escapar de um processo de cassação, que foi condenado por corrupção e preso. Que cumpriu pena e se reabilitou, ganhou espaço no atual governo, indicou nomes para bancos públicos que movimentam gigantescas quantias de dinheiro e que agora sela um acordo para levar o presidente para seus braços às custas de fundo eleitoral e boa estrutura de campanha.

Ao escolher o PL, aliás, Bolsonaro dá ainda mais munição para a revolta de Roberto Jefferson, que aliou-se ao presidente para defendê-lo até ser preso por ameaças ao Supremo Tribunal Federal (STF). Da cadeia, há algumas semanas, Jefferson soltou uma carta descascando o chefe do Executivo, assim como os filhos dele. Tudo por já saber, de bastidores, da escolha do presidente pelo PL. Jefferson é inimigo figadal de Valdemar Costa Neto. Na CPI dos Correios, em 2005, quando era investigado o mensalão patrocinado pelo PT, cara a cara, o petebista acusou o agora maior parceiro do presidente. Disse que ele recebia e repassava recursos ilicitamente. A acusação levou à renúncia e à prisão dos dois e de mais alguns parlamentares. Eles nunca se perdoaram e, ao optar por Valdemar, Bolsonaro escanteou Roberto Jefferson.

Quem também poderia se sentir desprestigiado é o PP de Ciro Nogueira e Arthur Lira. Injustamente aliás, já que o presidente deu a Casa Civil para o primeiro e contribuiu com a eleição do segundo à Presidência da Câmara dos Deputados. Mas como a fome dos caciques é grande, está sendo necessário também oferecer a vaga de vice na campanha eleitoral ao partido que sustenta Bolsonaro no poder. Proposta arriscada, aliás. Se nas crises atuais o vice-presidente Hamilton Mourão ajudou o presidente a ficar no cargo simplesmente não realizando nenhuma articulação, é difícil imaginar que alguém do PP, com a capacidade de articulação e a possibilidade de assumir o Palácio do Planalto não fizesse qualquer movimento. O presidente só aceita hoje discutir a hipótese de correr esse risco pois está nas mãos dos caciques de seu grupo político: o centrão, que um dia ele criticou e do qual hoje faz parte como sua estrela maior.

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