Nos últimos meses o bolsonarismo sofreu nas redes, sempre na defensiva, com denúncias de corrupção no Ministério da Saúde e uma postura ineficiente do governo no combate à pandemia da Covid-19. Em um momento apenas houve uma reversão da situação, com os grupos de apoio ao presidente Jair Bolsonaro na ofensiva, conseguindo equilibrar o debate nas redes. Foi o que se deu com a defesa de parte da esquerda do regime ditatorial de Cuba. Não poderia ser melhor para o presidente, que tenta trazer para as eleições de 2022 o surrado argumento de que estamos sob o risco de uma ditadura comunista no Brasil.
No debate sobre a situação cubana, que ganhou atenção com os maiores protestos contra o governo em décadas, setores da esquerda brasileira mais uma vez colocaram-se do lado do governo autoritário que foi comandado por décadas pelos irmãos Castro e, hoje, está nas mãos do líder do Partido Comunista Cubano, Miguel Diaz-Canel. A reação aos protestos, com repressão policial e com internet desconectada, impedindo que as pessoas se organizassem para se manifestar, é só mais um exemplo para lembrar ao mundo inteiro que Cuba vive uma ditadura. E não há espaço para defendê-la.
Isso não deveria ter nada a ver com posição ideológica. Há ditaduras de esquerda, como a Coreia do Norte, ou de direita, como a Arábia Saudita. Há governos que mascaram a democracia, alterando regras para que permaneçam indefinidamente no poder, como a Venezuela de Nicolás Maduro (esquerda) ou a Hungria de Viktor Orbán (direita). No fundo, se olharmos bem, pouca diferença há entre os líderes desses países. Diferença deve haver, sim, entre os que defendem a liberdade qualquer que seja a ideologia e os que defendem a repressão e os regimes totalitários.
No caso cubano, isso não inviabiliza, claro, qualquer crítica ao embargo imposto pelos Estados Unidos há décadas à ilha. Um mecanismo que não tirou a ditadura do poder e que ajuda a dificultar as condições de vida de milhões de habitantes. Na pandemia, em especial, torna quase impossível o acesso a medicamentos e respiradores, o que é criminoso do ponto de vista humanitário. Mas, como dito, é possível criticar o embargo por seus efeitos deletérios sem, para isso, defender um regime autoritário.
A questão aí é se atualizar. Sair daquele velho debate da Guerra Fria, das disputas entre Estados Unidos e União Soviética, que boa parte dos países já superou. O Brasil também já deveria ter superado. Quando Bolsonaro lança a ideia de que o país está próximo de uma ditadura comunista – o que é um argumento ridículo, pois nunca estivemos tão longe disso – parte da esquerda dá-lhe um presente ao fazer defesas ardorosas dos regimes cubanos e venezuelanos. Embora, por aqui, não tenha aplicado medidas nem sequer semelhantes, a esquerda alimenta o imaginário pretendido por um governo que usa isso como argumento para se manter no poder. E que se aproveita disso para capturar as forças armadas e usá-las politicamente. Quem quer criticar os arroubos antidemocráticos de Bolsonaro, precisa fazê-lo em qualquer circunstância e em qualquer ideologia.