Política em Análise

Queda de Decotelli traça nova linha no governo

Jair Bolsonaro tenta adotar postura menos polêmica diante da pressão no âmbito judicial e na sociedade

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 01 de julho de 2020 | 10:06
 
 
 
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A decisão do presidente Jair Bolsonaro de não dar posse a Carlos Alberto Decotelli no Ministério da Educação após as revelações de falhas em sequência em seu currículo traçam uma nova linha do limite tolerável de polêmicas aceito no atual governo. E isso é um ponto positivo.

Carlos Alberto Decotelli mentiu no currículo para se promover, como outros ministros fizeram no passado. Alguns dos que continuam na Esplanada dos Ministérios fizeram coisa parecida. Damares Alves, por exemplo, disse que era mestre em direito constitucional e família, sem nunca ser. Ricardo Salles dizia ser formado em Yale, sem nunca ter sido. E nada aconteceu com eles.

Além do mais, há casos mais graves de polêmicas relatadas sobre ministros do atual governo sem que tenham perdido os cargos. O próprio Ricardo Salles já foi condenado por fraude em uma ação ambiental. Continua no cargo, embora agora comece a balançar após pressões do setor do agronegócio, que tem visto dificuldades para fechar acordos internacionais por conta da postura negacionista do ministro na questão climática.

A postura um pouco menos tolerante do governo com as polêmicas dos ministros coincide com o aumento da pressão na Justiça, com inquéritos abertos contra apoiadores e com a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor da família. Ameaçado de queda, o governo tenta encontrar o rumo que ainda não tenha encontrado. Bolsonaro tem feito silêncio, evitado polêmicas, e tem olhado as questões relacionadas a ministros de forma mais pragmática.

Dito isso, não posso deixar também de colocar a posição de muitas pessoas de que uma dose de racismo pode ajudar a explicar o desfecho diferente no caso de Decotelli em relação a outros ministros que também mentiram no currículo. Para essas pessoas, isso explicaria mais do que uma eventual mudança de postura do governo. Posição que precisa ser respeitada por todos nós, que não sofremos isso na pele a vida toda.

Prefiro crer que, no caso específico, pesou mais o fato de as mentiras terem sido colocadas no Lattes, a mais importante plataforma para aferir títulos e produção acadêmica, e o fato de as mentiras terem vindo de um ministro da Educação, justamente a área em que isso é mais importante, e em um momento em que o governo tenta fazer uma inflexão para uma posição de mais bom senso na relação com os demais Poderes e com a sociedade. Se for isso, é bom sinal.

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