Se no último Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2022, foi constatado que 51,5% da população brasileira é composta por mulheres e 48,5% por homens, em relação aos diagnósticos de depressão essa diferença fica ainda maior. De acordo com a Pesquisa Vigitel de 2023, o índice de casos em pessoas do sexo feminino é de 16,8%, mais que o dobro da taxa masculina, de 7,1%, nas 26 capitais e no Distrito Federal. Em Belo Horizonte, o índice entre mulheres é de 18,2%, e o de homens, 10,5%.
Médico psiquiatra, Bruno Carreira explica que parte dessa grande diferença de diagnósticos está relacionada ao fato de que, geralmente, mulheres têm mais cuidados com a saúde e, por isso, buscam mais ajuda profissional, mas essa não é a única justificativa.
“Temos também os fatores sociais, como maior exposição à violência, inclusive de gênero, sobrecarga doméstica, desigualdade no mercado de trabalho, além de maior variação hormonal ao longo da vida, com ciclo menstrual, gravidez, menopausa. Enfim, tudo isso pode contribuir para essa maior prevalência de depressão nas mulheres”, avalia o especialista.
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É o caso de Silvana Garcia, de 46 anos, moradora do bairro Nova Suíça, na região Oeste de BH, que trata uma depressão. Ela conta que trabalhava como auxiliar administrativa em uma escola, no ano de 2022. Após troca de chefia, Silvana passou a ser pressionada além do normal, desenvolveu a síndrome de burnout, foi demitida em abril de 2024, e hoje tem que conviver com a depressão.
“Eu tento procurar um novo emprego, mas, só de pensar em voltar a trabalhar, começo a ter falta de ar, nervosismo, coração acelerado. Tem dias que me sinto um pouco melhor, e de uma hora para outra vem uma tristeza profunda e muita ansiedade. “Tenho procurado ajuda, fazendo tratamento com médicos e remédios para não piorar”, afirma a auxiliar administrativa.
Na luta para superar o transtorno, além de apoio psicológico e da família, Silvana conta que precisou ser medicada: são cinco remédios pela manhã e três à noite, uma rotina desgastante, mas que ela tem consciência de que precisa enfrentar.
“Eu tenho um apoio incondicional do meu marido e das minhas duas filhas. Desde o processo do burnout, do diagnóstico e do tratamento contra a depressão, eles estão comigo. É por conta deles que eu consigo enfrentar essa batalha, por eles que eu continuo na vontade de viver”, conclui.
É preciso acabar com o preconceito sobre a doença
A auxiliar administrativa Silvana Garcia, de 46 anos, lembra que as pessoas que estão no entorno de quem sofre com depressão precisam ser mais empáticas: “Nos julgam como preguiçosas, incapazes. A gente não tem um termômetro para medir o sentimento e a dor. As pessoas julgam muito a doença invisível, acreditam só no que enxergam”, diz.
Professora de psicologia, Renata Mafra reforça a fala de Silvana. “Vira e mexe, eu recebo algum relato de brincadeiras, falando que a pessoa não está com depressão, só está faltando serviço. No universo masculino ainda tem a questão da sexualidade e fragilidade. Homem ‘não pode demonstrar fragilidade’. Ainda há preconceito. As críticas que as pessoas recebem são cruéis e violentas”, explica.
Hereditariedade é fator de risco
Segundo o Ministério da Saúde, o histórico familiar é um dos fatores de risco para a depressão. Estudos com famílias, gêmeos e adotados indicam a existência de um componente genético para que isso aconteça. Estima-se que esse componente represente 40% da suscetibilidade para desenvolver a doença.
É o que explica o médico psiquiatra Bruno Carreira. “A causa da depressão pode ser ambiental, psicológica e biológica. A pessoa tem uma predisposição genética, e, como a gente vem sendo submetido a essa pressão diária por resultados no trabalho e comparações em redes sociais, isso tudo contribui de forma considerável para o aumento do índice de depressão nos últimos tempos”, afirma o especialista.
A família de Mariana* é um exemplo disso. Em 2011, quando ela tinha 19 anos, o tio acabou tirando a própria vida por causa da depressão. Anos mais tarde, o irmão e a mãe também foram diagnosticados com a doença.
“Minha mãe já tinha predisposição e, por conta de uma doença rara, agravou e foi diagnosticada. Ela tentou o suicídio, mas não conseguiu. Ela se sentia muito sozinha, perdida. Me disse que não queria morrer, mas acabar com o sofrimento que estava passando”, relata.
*Nome fictício para preservar a identidade.