A morte da cantora Preta Gil, que desde o início de 2023 enfrentava um câncer de intestino, jogou luz sobre uma realidade urgente: o crescimento dos diagnósticos de câncer colorretal em pessoas cada vez mais jovens e a falta de um programa estruturado de rastreamento no Sistema Único de Saúde (SUS). Um estudo da American Cancer Society (ACS), publicado no ano passado, revelou que 13% dos pacientes diagnosticados com câncer colorretal têm menos de 50 anos, um aumento de 9% nas últimas décadas.

No Brasil, uma pesquisa da Fundação do Câncer, divulgada em março deste ano, projeta um aumento expressivo de ocorrências deste tipo de tumor para os próximos anos. Segundo o levantamento, o número de novos casos deve ter um crescimento estimado de 21% entre 2030 e 2040. Apesar da gravidade, o país ainda não conta com um programa nacional de rastreamento, como existe para o câncer de mama e do colo do útero. Desde 2023, um grupo de trabalho liderado pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca) estuda a criação de uma diretriz específica, que deve ser submetida à análise da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) ainda este ano. 

O exame mais eficaz para detectar precocemente o câncer colorretal é a colonoscopia. No entanto, o acesso a esse exame pelo SUS ainda é limitado. “É um exame invasivo, mas de baixo risco e com excelente capacidade de detecção. Infelizmente, muitos pacientes da rede pública só descobrem o câncer em cirurgias de emergência devido à falta de acesso à colonoscopia”, alerta o oncologista Victor Hugo Fonseca de Jesus, do CEPON, em Florianópolis.

O oncologista Rodrigo Fogace, do Hospital Albert Einstein, reforça que mesmo sendo um exame que envolve riscos, como sedação e possibilidade de perfuração intestinal, os benefícios superam as desvantagens. “Existe um risco associado. Mas quando colocamos na balança o risco em comparação com o benefício, certamente o benefício de diagnosticarmos um câncer precocemente ou até mesmo descobrirmos um pólipo, que é uma lesão pré-cancerígena, será superior ao risco. Nós, particularmente, continuaremos indicando a colonoscopia aos pacientes a partir dos 45 anos”, diz Fogace.

Idade indicada para rastreio

A idade ideal para iniciar o rastreamento ainda gera debates. O Ministério da Saúde recomenda o início aos 50 anos para pessoas de risco médio. Já entidades como a Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), a Sociedade Brasileira de Coloproctologia (SBCP) e a American Cancer Society recomendam iniciar aos 45 anos — ou até antes, em casos com histórico familiar ou doenças inflamatórias intestinais.

Conforme o Instituto Oncoguia, alternativas menos invasivas também poderiam ser consideradas. O teste de sangue oculto nas fezes, já disponível no SUS, é um exame simples que pode indicar a necessidade de uma investigação mais aprofundada. No entanto, esse teste ainda não é oficialmente utilizado para rastreamento de câncer colorretal na rede pública. O instituto defende a inclusão desse exame para pacientes a partir dos 45 anos, com repetição a cada dois ou cinco anos, usando técnicas como o teste imunoquímico fecal (TIF) ou o baseado em guáiaco (TSOFg).

Saiba mais sobre o câncer colorretal, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO):

O que é o câncer colorretal?

O câncer colorretal, também chamado de câncer de cólon e reto ou, simplesmente, de câncer de intestino, é uma doença heterogênea. Trata-se de uma neoplasia originada por tumores malignos que se iniciam no intestino grosso (cólon) ou no reto. Felizmente, esse tipo de câncer tem alto potencial de prevenção primária. Isso, graças à adoção de hábitos saudáveis e ao rastreamento (um pólipo encontrado em uma colonoscopia, por exemplo, pode ser retirado de forma preventiva). Além disso, apresenta elevado potencial de prevenção secundária, pois sua história natural viabiliza a detecção precoce.

Sinais e sintomas

Os sinais e sintomas relacionados ao câncer colorretal costumam se manifestar em estágios mais avançados. Além disso, não são exclusivos da doença, podendo ser desencadeados por outros problemas intestinais.

Ressalvas feitas, os sinais e sintomas mais comuns são:

  • presença de sangue nas fezes;
  • dor abdominal constante;
  • alternância entre prisão de ventre e diarreia;
  • protuberância abdominal.

Fatores de risco

Os fatores de risco para a ocorrência do câncer colorretal são diversos. Para começar, todas as pessoas com mais de 50 anos têm chances aumentadas de desenvolvê-lo. O tipo de alimentação também é determinante. Uma dieta pobre em frutas, vegetais, carnes magras e alimentos com fibras, assim como o consumo excessivo de carnes vermelhas e/ou processadas, também potencializa o risco para a doença.

Além disso, existem certos comportamentos associados à sua ocorrência. É o caso do sedentarismo, do consumo regular de álcool, do tabagismo e do uso regular de medicamentos anti-inflamatórios não esteroides. Da mesma forma, a presença de algumas doenças aumenta as chances de desenvolver neoplasia. É o que ocorre em pacientes com retocoliteulcerativa crônica, doença de Crohn, dentre outras.

Causas da doença

Apesar de vários fatores aumentarem o risco de desenvolver a doença, as causas específicas do câncer colorretal ainda não estão claras. O que se pode afirmar é que os tumores na região se desenvolvem, predominantemente, a partir de mutações genéticas ocorridas em pólipos (lesões benignas).

Como prevenir o câncer colorretal?

Para prevenir a doença, é fundamental:

  • evitar, ao máximo, os fatores de risco;
  • investigar qualquer relação de maior susceptibilidade, por meio do rastreamento;
  • redobrar a atenção a possíveis sinais e sintomas, investigando-os adequadamente.

Portanto, ao notar a presença recorrente de manifestações suspeitas, procure um especialista em trato digestivo e investigue o problema. Para isso, geralmente, o/a médico(a) solicita exames como pesquisa de sangue oculto nas fezes e, por vezes, colonoscopia.

Mas, é válido ressaltar que, mesmo quando não existem fatores de risco conhecidos ou sintomas de alterações, é importante realizar os exames de forma preventiva. Por isso, recomenda-se que, a partir dos 50 anos, todos façam a colonoscopia. No entanto, quem tem histórico familiar para esse tipo de câncer pode começar o rastreamento com antecedência, conforme indicação do médico responsável.

Como o diagnóstico é confirmado?

A colonoscopia possibilita identificar eventuais pólipos, os quais podem ser removidos antes de se transformarem em tumores malignos. Além disso, também permite identificar tumorações em estágios iniciais, quando as chances de cura são maiores. Para confirmar o diagnóstico, entretanto, é necessário realizar uma biópsia. O procedimento, feito durante a própria colonoscopia, exige a retirada de áreas suspeitas, para subsequente análise laboratorial. Isso é feito com o uso do colonoscópio, um tubo fino e flexível, equipado com câmera de vídeo, introduzido pelo ânus.

Como é o tratamento do câncer colorretal?

Geralmente, o tratamento começa com a ressecção cirúrgica do tumor e dos linfonodos próximos. O procedimento é realizado por cirurgiões oncológicos que possuem em sua formação também treinamento em Cirurgia do Câncer Colorretal. Dependendo das características do tumor (tipo, tamanho e localização) e das condições clínicas individuais, pode-se optar pela cirurgia aberta (convencional), laparoscopia (assistida por vídeo) ou cirurgia robótica. Além disso, conforme o caso, pode-se indicar radioterapia associada, ou não, à quimioterapia — visando diminuir o risco de recidiva (retorno do tumor).