Um projeto que começou há apenas sete anos, mas já está dando frutos e, também, orgulho. De 2019 - quando começou a competir na Série A2 - até hoje, quando aparece como um dos candidatos ao título do Campeonato Brasileiro, o Cruzeiro Feminino passou, e ainda passa, por provações. Mas a presença frequente nas fases decisivas de torneios e as conquistas mostram que o projeto veio para ficar.
Logo em sua ‘inauguração’, o time feminino do Cruzeiro já conseguiu o acesso para a divisão principal do Brasileiro, sendo vice-campeão da Série A2. Na sequência, a crise que abalou o clube - com queda do time masculino para a Série B e a consequente perda brusca de receitas - respingou também na equipe feminina, que mesmo assim conseguiu se manter na primeira divisão.
A partir de 2023, um gás extra com o primeiro de seus três títulos mineiros e a primeira classificação para o mata-mata do Brasileiro. A consolidação como uma força do futebol feminino no Brasil veio nos anos seguintes, com uma presença mais consistente nas fases importantes das grandes competições. O momento, hoje, é de otimismo, com a liderança na primeira fase do Campeonato Brasileiro.
O planejamento é uma das palavras-chave para o sucesso das Cabulosas. Pelo menos é assim que avalia a gerente executiva da equipe, Bárbara Fonseca. Ela cita como ponto importante a permanência do técnico Jonas Urias e a antecipação do Cruzeiro no mercado da bola.
“A permanência do Jonas (Urias, treinador) foi uma grande conquista para a gente, quando ele chega e assume o comando técnico da equipe. É um cara extraordinário. Também, a gente começou a captar atleta no mercado de maneira antecipada, de uma maneira que o Cruzeiro nunca tinha feito antes. A primeira atleta que eu converso no ano passado já foi em maio. A gente já estava conversando com a Isadora Haas, que está aí dentro dos grandes reforços que a gente trouxe para essa temporada”, enumera.
Rebaixamento do masculino e dificuldades
A queda do time masculino da Raposa para a Série B abalou toda a estrutura do clube, inclusive o time feminino. Após o descenso à Segunda Divisão, o clube precisou voltar todo seu foco para o retorno à Série A. Com isso, o departamento de futebol feminino sofreu um grande baque, com o fim de suas categorias de base.
“O clube todo em crise, falido. Como convencer as pessoas a manterem o futebol feminino? São tantas pessoas, foram tantas ideias, tantos projetos que a gente teve que fazer e refazer para em 2020 se manter vivo. Eu tive que acabar com a categoria de base naquele ano. Em 2019 eu tenho um sub-18, um sub-16, e com toda a crise eu tenho que extinguir as categorias, porque era pouco dinheiro, e eu precisava redirecionar todo esse investimento para a equipe principal, porque na minha cabeça era muito importante que a gente sobrevivesse naquele momento”, relembra.
Crescimento do clube, crescimento do feminino
A recuperação do Cruzeiro como marca - com a transformação em SAF - e a atenção especial de Pedrinho ao departamento também são citados por Bárbara como fundamentais para que as Cabulosas pudessem ter mais investimentos e se fortalecessem. A gestora cita que São Paulo é um local mais beneficiado em termos de organização das competições, salários e abertura de mercados para as jogadoras, o que foi um desafio.
“A gente ainda precisava quebrar essa ideia que o futebol feminino, bem desenvolvido, bem estruturado, só acontece em São Paulo. Quando o Ronaldo compra e o Pedrinho fortalece, empodera a marca Cruzeiro no mercado, isso também facilitou para que a gente pudesse ter sucesso nesse momento”, avalia Bárbara, que também celebra a ida da equipe feminina para a Toca da Raposa I.
“A decisão naquela oportunidade de colocar todo o departamento de futebol feminino dentro da Toca II, agora dentro da Toca I, também é um grande chamariz de atleta. As atletas estão acostumadas a treinar e jogar em estruturas externas do clube. Isso também é uma carta-convite, que teve muito peso. Quando você chega para a atleta e entrega esse tipo de planejamento, esse tipo de estrutura, isso atrai”, afirma.
Bom momento do futebol feminino mineiro
Além do Cruzeiro Feminino em bom momento, Minas Gerais também tem o América, que se manteve na 1ª divisão, o Atlético que está forte na briga para retornar à elite e o Itabirito que subiu para a Série A2. Embora se alegre com o momento do futebol feminino mineiro, Bárbara aponta uma falta de fomento e incentivo à categoria no estado.
“A Federação Mineira ainda não está atenta ao momento do futebol feminino. São Paulo começou a estruturar sua federação para olhar para o futebol feminino há muitos anos. Foi escolhida a Aline Pelegrino, que hoje faz um belíssimo trabalho na CBF, e teve a ideia de iniciar competições de base. Fez de uma maneira tão excelente que hoje a Federação Paulista, sem dúvida nenhuma dentro da América do Sul, tem a melhor competição. A Federação Mineira ainda não teve esse olhar”, lamenta.
O bom momento de Minas no futebol feminino se deve, na avaliação de Bárbara Fonseca, à dedicação dos profissionais dos clubes.
“Não vejo como um exercício excelente, sistêmico, acontecendo no estado de Minas Gerais. Eu vejo grandes pessoas, grandes profissionais, trabalhando de manhã, de tarde e de noite para conseguir fazer o futebol feminino, pelo menos com alguma dignidade, mas ainda não é autossistêmico. O estado de Minas Gerais ainda não abraçou o futebol feminino como um todo”, pontua.
E o futuro?
Já com uma equipe consolidada no cenário nacional, Bárbara Fonseca quer fazer com que o Cruzeiro Feminino recupere o que perdeu na crise de 2020. A gestora quer reconstruir as categorias de base das Cabulosas e já está dando os primeiros passos nessa direção.
“Eu não tenho como pensar em desenvolvimento e permanência de projeto se você não tratar bem a base. No mês de julho, a ideia é fazer a contratação da comissão técnica, fazer as seleções, para que na primeira semana de agosto as atletas já estejam em atividade. Neste primeiro momento, a gente vai eleger uma categoria - tudo indica que será a sub-17 - para que nos anos seguintes a gente evolua para ter mais categorias. Sempre pensando que eu não abro mão de um crescimento orgânico”, projeta.