Exatos cento e sete dias depois de o clube ter sido registrado como Sociedade Anônima do Futebol, o Cruzeiro vive um momento decisivo. O ex-jogador Ronaldo, que em dezembro de 2021 assinou acordo de intenção de compra de 90% das ações da SAF, solicitou ao Conselho celeste alterações no contrato e sugeriu até um pedido de recuperação extrajudicial . O Fenômeno chegou a afirmar que, sem estas modificações, “ficará difícil manter o projeto”. A torcida então passou da euforia à apreensão. Entenda abaixo o passo a passo de todo o processo até chegar a esta ‘encruzilhada’ atual.
29 de novembro de 2021 – Presidente Sergio Santos Rodrigues anuncia a transformação do Cruzeiro em clube empresa, o primeiro do país a registrar a SAF. A princípio, apenas 49% das ações poderiam ser vendidas a um ou mais potenciais investidores, com a condição de que aqueles que participem de outra SAF no país não podem estar na SAF Cruzeiro. O documento ressalta que as cores, o símbolo, a sede e o nome do clube serão preservados.
6 de dezembro de 2021 – Cruzeiro passa a ter um novo CNPJ como Sociedade Anônima de Futebol (SAF). O registro foi feito na Junta Comercial.
17 de dezembro de 2021 – Conselho Deliberativo do Cruzeiro aprova mudança no estatuto e ampliação de percentual de venda de até 90% das ações da SAF para investidores. Mudança foi aceita com 95,8% de aprovação (considerando o ‘peso’ estabelecido a cada votante) Em números absolutos, foram 544 votos a favor, 18 contra, um nulo e um branco.
18 de dezembro de 2021 – Menos de 24 horas após a mudança do estatuto, Ronaldo assina termo de compra de 90% das ações da SAF, com compromisso de investir R$ 400 milhões no clube nos próximos anos. Para efeito de comparação, para comprar 51% das ações do Real Valladollid, da Espanha, Ronaldo havia investido R$ 141 milhões (na cotação da época). Fica acordado um período de 120 dias para o processo de ‘transição’ da associação para a SAF Cruzeiro.
Janeiro de 2022 – Enquanto o time inicia a pré-temporada sob o comando do técnico uruguaio Paulo Pezzolano, a gestão Ronaldo começa a conviver com a ‘rotina’ de ações judiciais. Entre várias outras, do ex-fisioterapeuta Charles Costa (R$ 1,2 mi), do ex-atacante Marquinhos Gabriel (R$ 5,6 mi) e também de um ex-porteiro do clube (R$ 19,1 mil).
24 de janeiro de 2022 – Mesmo sem ainda ter efetuado a compra de fato das ações da SAF, Ronaldo Fenômeno usa recursos próprios para quitar dívida de R$ 23 milhões do clube para que o Cruzeiro colocasse fim ao transfer ban imposto pela Fifa e pudesse voltar a registrar seus novos reforços.
Fevereiro de 2022 – Nova ‘onda’ de ações judiciais, como o ex-atacante Airton (R$ 45 mil) e de ex-integrantes da comissão técnica como Ricardo Rocha (segredo de justiça) e Maurício Copertino (R$ 564 mil).
13 de fevereiro de 2022 – Após não aceitar redução salarial e ter a saída confirmada, ex-goleiro Fábio aciona Ronaldo extrajudicialmente na Justiça, alegando que o Fenômeno, enquanto proprietário da SAF, também teria ‘responsabilidade solidária’ em uma dívida do clube para com ele na casa dos R$ 20 milhões.
22 de fevereiro de 2022 – Cruzeiro consegue prazo de mais 60 dias para apresentar plano de credores à Justiça do Trabalho. No mesmo dia, é comunicado sobre novas ações movidas por ex-jogadores: atacante Vinícius Popó (R$2,2 mi) e zagueiro Gustavo Rissi (R$ 880 mil).
11 de março de 2022 - Justiça determina que seja cumprida resolução da Câmara Nacional de Resolução de disputas (CNRD), proibindo o Cruzeiro de inscrever jogadores pelo período de seis meses em função do não pagamento do valor de R$ 900 mil pela contratação do atacante Careca junto ao Atlético-AC, em 2017. Cruzeiro pode contestar a ordem judicial até o dia 26 de março, mas clubes tentam chegar a um acordo. No mesmo dia, laterais Norberto (R$ 240 mil) e Jean Victor (R$ 160 mil) também entram na justiça contra o clube.
14 de março de 2022 – Ronaldo Fenômeno se reúne com membros da Mesa Diretora do Conselho Deliberativo do Cruzeiro e apresenta ‘condições’ para adquirir “de fato” os 90% da SAF Cruzeiro. Entre estas condições estariam a inclusão de patrimônios do clube como a Toca I e a Toca II como ‘garantia’ do negócio. Possíveis alterações precisam ser aprovadas pelo Conselho.
14 de março de 2022 – Conselheiros relatam que uma das preocupações de Ronaldo estaria relacionada às dívidas tributárias do clube, na casa dos R$ 200 milhões. Segundo o Fenômeno, caso as dívidas também fossem repassadas a SAF, dentro da condição atual do acordo, seria inviável pagar.
15 de março de 2022 - Ronaldo Fenômeno confirma ter solicitado à Mesa Diretora do Conselho a inclusão das Tocas I e II como garantia ao novo acordo, mas se compromete a não vendê-las, em hipótese alguma, mantendo sempre para o treinamento da equipe. Ele ressalta que, do contrário, o clube pode ter até seus CTs penhorados. O Fenômeno também confirma ter sugerido aos conselheiros a entrada do pedido de recuperação judicial ou extrajudicial, o que, na visão dele, seria a única saída para a situação do clube.
Enquanto a nova reunião do Conselho Deliberativo não é convocada, a torcida segue em compasso de espera. A decisão deve ser tomada ainda nos próximos dias.
De concreto, apenas o fato de que, com a SAF, o Cruzeiro terá seis anos para pagar 60% da sua dívida, que já ultrapassa a casa de R$ 1 bilhão. Se conseguir, terá mais quatro anos para pagar o restante. O débito acumulado será equacionado com o recebimento de 20% da receita mensal da SAF e 50% do lucro que a mesma tiver no período.