Atual piloto da Ferrari, Charles Leclerc, relembrou a trajetória ao lado de Jules Bianchi, piloto francês que morreu há exatos dez anos, em 17 de julho de 2015, após graves ferimentos sofridos durante o Grande Prêmio do Japão de 2014. Bianchi, que tinha 25 anos, foi o primeiro piloto a morrer devido a lesões em um fim de semana de corrida da Fórmula 1 desde Ayrton Senna em 1994.

O acidente que vitimou Bianchi ocorreu no Circuito de Suzuka, quando ele colidiu com um veículo de recuperação a 125 km/h em condições de pista molhada. O piloto francês nunca recuperou a consciência após o impacto e morreu nove meses depois.

"Jules foi uma pessoa muito importante para mim", revelou Leclerc em entrevista ao The Athletic. "Não exatamente pelo que ele conquistou nas pistas — embora fosse muito inspirador ver isso — mas pela pessoa que ele era. Ele teve uma enorme influência na minha carreira. Sem ele, eu não estaria onde estou hoje."

A relação entre os dois começou na infância, quando Leclerc tinha apenas quatro anos e Bianchi doze. Apesar da diferença de idade, desenvolveram uma forte amizade através do kart na pista de Brignoles, propriedade do pai de Jules.

"Sempre disse que as famílias Bianchi e Leclerc eram uma só — estávamos realmente sempre juntos", afirmou Charles. "Todo fim de semana, eu estava na pista dele. Quando ele fez seu primeiro Grande Prêmio de Mônaco, dormiu no meu apartamento. Tínhamos uma relação muito especial", completou ao The Athletic.

Bianchi construiu uma carreira sólida antes de chegar à Fórmula 1. Em 2002, terminou em terceiro lugar no Trophée des Jeunes FFSA Cadets. Conquistou o título do Campeonato Ásia-Pacífico na categoria Formula A em 2005. Dois anos depois, avançou para corridas de carros, vencendo cinco provas e o campeonato em sua temporada de estreia na Fórmula Renault 2.0 francesa.

Durante esse período, Leclerc observava atentamente cada movimento do amigo. "Mesmo nas coisas mais bobas e irrelevantes que ele fazia", confessou o monegasco. "Eu o admirava — desde a maneira como ele limpava seu kart até seu estilo de pilotagem. Você tenta reproduzir todas as coisas boas que vê e experimenta para descobrir se funcionam para você. Todas as pequenas coisas. Apenas por ser ele mesmo, aprendi muito."

Uma das características que Leclerc incorporou foi o estilo de frenagem de Bianchi. "Eu nunca tiro completamente o pé do freio", explicou Leclerc. "Lembro que esta foi uma das primeiras lições de Jules. Recordo-me de ser criança e me concentrar nisso. Agora, é completamente natural. Jules teve uma grande influência."

Os pais de ambos filmaram a segunda vez que Leclerc andou de kart em Brignoles. Nas imagens, discutiam "como seria incrível ver nós dois na Fórmula 1". "Quando você vê essas filmagens, pode entender o quão distante você está da Fórmula 1 e desse mundo maluco", continuou Leclerc. "Então, tudo parecia muito improvável, mesmo para um de nós chegar lá, quanto mais o fato de que ambos conseguimos."

Bianchi ingressou na Academia de Pilotos da Ferrari em 2009 e tornou-se piloto de testes da equipe dois anos depois. Em 2012, atuou como piloto reserva da Force India e estreou na F1 no Grande Prêmio da Austrália de 2013 pela Marussia. No GP de Mônaco de 2014, conquistou seus primeiros e únicos pontos na F1, terminando em nono lugar.

O ex-presidente da Ferrari, Luca di Montezemolo, declarou à Sky Sports Italia em 2015 que Bianchi "era um membro da família Ferrari e era o piloto que havíamos escolhido para o futuro — uma vez que a colaboração com (Kimi) Räikkönen terminasse."

"É um esporte muito especial, porque você pode ser o piloto mais talentoso de todos, mas se não estiver no momento certo, no lugar certo, pode acabar não tendo nenhuma vitória", refletiu Leclerc. "Não por sua própria culta, mas simplesmente porque não estava destinado a ser. E isso é o que é triste sobre o esporte em geral. Em alguns casos, e especialmente no caso de Jules, ele definitivamente tinha o talento para se tornar um campeão mundial de Fórmula 1."

No final de 2010, quando a família de Leclerc enfrentava dificuldades financeiras para manter seu kart, Bianchi intercedeu junto a seu empresário Nicolas Todt sobre a situação. Esse investimento permitiu que Leclerc perseguisse seu sonho. Hoje, ele compete na F1 há oito anos, sete deles pela Ferrari.

Durante o outono, uma maratona de kart de 42 horas é realizada no Circuito Paul Ricard, na França, próximo a Brignoles, agora conhecida como Maratona de Kart Jules Bianchi. Leclerc e Bianchi competiram juntos neste evento sete vezes.

Uma lembrança particular marcou Leclerc profundamente. À 1h da manhã, em determinado ano, Bianchi e a equipe deixaram Leclerc no kart, dirigindo por várias horas seguidas, enquanto "todos eles foram para a balada", contou Leclerc. Eles retornaram por volta das cinco ou seis da manhã, e Leclerc disse: "Eu estava tão cansado, mas não queria parar nos boxes, porque não queria perder a corrida."

A maratona de kart foi interrompida após a morte de Bianchi, mas retornou em 2023. "Isso traz de volta memórias muito boas do passado, e também encontro pessoas que não vejo há muito tempo, mas é muito divertido", disse Leclerc. "Eu fiz isso com meus melhores amigos, que não são pilotos de corrida. Mas ainda conseguimos vencer."

O legado de Bianchi permanece vivo na F1 através das melhorias de segurança implementadas após seu acidente, incluindo o dispositivo halo e o sistema de safety car virtual. Cada vez que Leclerc entra na pista, leva consigo a memória do amigo, com o nome de Jules gravado na parte de trás de seu capacete.

"Infelizmente, nunca conseguimos correr juntos na F1 pelas razões que conhecemos. Mas ambos realizamos nosso sonho de nos tornarmos pilotos de F1. E, para mim, tenho certeza de que ele está orgulhoso."