Pandemia

Coronavírus: setor de intercâmbios estima queda de 75% a 80%

Brasileiros que não quiseram voltar estudam por plataformas online; empresas oferecem opções de crédito para remarcar viagem para 2021

Por Paulo Campos
Publicado em 17 de abril de 2020 | 18:21
 
 
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Fazer um intercâmbio é um sonho de muitos estudantes brasileiros. Mas, desde mês passado, muitos intercambistas viram seus sonhos interrompidos temporariamente ou precisaram se adaptar a uma nova rotina. Para as empresas, a pandemia impactou seriamente em seus negócios. Segundo Diogo Jansen, coordenador regional da Brazilian Educational & Language Travel Association (Belta), entidade que reúne 14 agências que trabalham com intercâmbio no país, o segmento teve uma queda de 75% a 80%.

É o caso do Student Travel Bureau (STB), agência com filial em Minas Gerais, que calcula uma queda de 60% a 70% na procura de intercâmbios. "Os atendimentos cairam de 2.000/2.500 diários para 800/900 no Brasil",  afirma Christina Bicalho, vice-presidente da agência. Os programas  para julho já foram cancelados. Cerca de 13 mil pessoas recrutadas para trabalhar nos parques e hotéis da Disney em janeiro aguardam a evolução da pandemia. "Vivemos um momento de incertezas para o segundo semestre", salienta. 

As agências estão trabalhando com remarcações sem custo para os clientes. Quem tinha viagem marcada e não viajou, transferiu para outra data. Quem já está lá fora, pode estudar por plataforma online ou retornar e ganhar um crédito para fazer a viagem em outro momento", explica Jansen. Para o advogado Rubens Gonçalves Leite, as agências de intercâmbio são, via de regra, agências de viagens e devem se encaixar na Medida Provisória 948, que estabelece regras para cancelamentos, reembolso e remarcação de eventos e viagens. 

De acordo com a MP, publicada pelo governo federal, a agência tem até 12 meses para reembolsar o cliente em caso de cancelamento ou disponibilizar o valor como crédito para remarcar a viagem. Além disso, enfatiza Leite, no caso de intercâmbio, a empresa tem de dar suporte para o estudante se manter ou regressar ao país. "Hoje, o cancelamento é o cenário menos ideal para ambas as partes", considera Diogo Jansen, da Belta. Ele argumenta que não vê motivos para cancelar um sonho se a pessoa pode realizá-lo nos próximos dois anos.

Desde março, nenhuma empresa fechou as portas, também as demissões foram pontuais, de acordo com a Belta. Mas a pandemia obrigou os gestores a repensar o planejamento. É o caso de Bruno Camargo de Jesus, proprietário da agência The Six International Studies, no Canadá. Bruno, que mora em Toronto com a esposa desde 2017 e atende a um público 100% de intercambistas brasileiros, sentiu fortemente os efeitos da Covid-19: 30% dos clientes cancelaram as viagens e houve redução de 50% no volume de atendimentos. 

Mas, segundo ele, a pandemia também abriu nova oportunidade de negócios. "O setor está passando por um momento de transformação. As escolas no exterior estão oferecendo cursos online, ou seja, a possibilidade para quem está no Brasil e quer estudar no Canadá de iniciar o programa", conta. Hoje, o Canadá - um dos países preferidos para intercâmbio, ao lado dos Estados Unidos, Austrália e Irlanda - recebe 500 mil intercambistas por ano, 50% deles oriundos do Brasil. Diante da crise, o executivo também recomenda postergar o projeto para 2021.

No ano passado, de acordo com a Belta, 386 mil brasileiros viajaram para fazer intercâmbio no exterior, 15% a mais do que em 2018. O mercado que vinha crescendo dois dígitos desde 2009 sofreu um novo revés com a pandemia. "A situação atual atingiu muito nosso business. Não se trata mais do cliente ter acesso à viagem ou não, mas de não poder viajar", lamenta Jansen. Hoje, de acordo com o STB, o tíquete médio de um intercâmbio no exterior é em torno de US$ 4.000, incluindo as aulas, a acomodação e o bilhete aéreo. 

"Cada caso é um caso, dependendo do programa", explica Christina.  Programas desenvolvidos em parcerias com universidades federais foram cancelados, porque o governo fechou temporariamente as universidades, e os estudantes tiveram de sair de suas acomodações. "Quem estuda em escolas de idiomas teve de voltar para casa", assinala. Dos que faziam Au Pair, programa em que as pessoas trabalham de dia e estudam à noite, informa a executiva do STB, a maioria já adultos, ninguém se prontificou a voltar.

Estudantes que faziam high school (ensino médio) em universidades e optaram por homestay (ficar em casa de família) também escolheram não retornar ao Brasil. É o caso da mineira Melissa Braga de Carvalho, 16, que estuda na Sands Secondary School, na cidade de Delta, em British Columbia, no Canadá. Com o apoio dos pais, ela tomou a decisão de permanecer no país e continuar os estudos. "Intercambistas de diversos países optaram por voltar para casa, mas eu considero mais seguro continuar por aqui", afirma a adolescente.

Hoje, Melissa tem aulas por plataformas online. Enquanto isso, ela vai seguindo as recomendações dos governos locais. "Como moro com uma família, temos alguns cuidados como manter distância, ir para caminhadas apenas sozinha ou acompanhada de alguém de casa e utilizar luvas e álcool e gel", conta a estudante. "Minha vida por aqui, apesar de um pouco mais parada, continua ótima", acrescenta. Desde fevereiro no Canadá, a adolescente deve terminar essa experiência apenas em junho.

A mãe da adolescente, a química Edilene Braga Carvalho, afirma que tem consciência de que a filha está muito bem-assistida e com recursos tanto no sistema de ensino quanto no de saúde. "É um momento difícil. Como mãe, me preocupo e gostaria de tê-la próxima de mim. Todos os dias conversamos por whatsApp e por chamadas de video", conta. No Canadá, onde ela a filha está agora, já tem cerca de 1.010 mortes e mais de 27 mil casos até ontem.

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