Nunca fui admirador nem do economista nem do político Delfim Netto, mas reconheço sua inteligência e sua palavra fácil. Em tempos “brabos” que ainda nos envergonham, além de ministro da Fazenda, do Planejamento e da Agricultura, foi embaixador do Brasil na França. O seu perfil de técnico, sobretudo pouco afeito às questões humanas, o levou a servir à ditadura. De ideias muito próprias, a economia é o seu deus infalível (como ocorre, aliás, com quase todos os seus companheiros de toga), embora tenha se mostrado, como parlamentar, sensível ao valor da política. Na redemocratização, foi eleito deputado federal por São Paulo cinco vezes (por PDS, PRB, PPB e PP).
Paradoxalmente, no primeiro governo do ex-presidente Lula, Delfim foi um de seus conselheiros mais chegados. Na época, dizia-se em cada esquina que seria outra vez ministro. De alguns anos para cá, escreve na “Folha de S.Paulo”. Depois de concordar com a decisão do Banco Central, que manteve a taxa Selic em 14,25% sob o argumento de que, “cinicamente, é melhor ser deselegante certo do que elegante errado”, concluiu assim seu último artigo, sob o título “Dilema”, na “FSP” de 27.1.2016: “O dilema é simples: ninguém sabe se haverá a necessária acomodação geopolítica e, na economia, se haverá tempo suficiente para uma desalavancagem controlada ou se, a qualquer momento, um evento crítico iniciará uma nova crise mundial”.
Aos 87 anos, o velho professor, consultor, economista, colunista e ex-deputado não esconde o que pensa sobre o Brasil. Em entrevista ao jornal “O Globo” de 28.1.2016, não se fez de rogado, foi claro. “A solução para a crise é política ou econômica?”, indagou-lhe o jornalista Sérgio Roxo. “É óbvio”, respondeu Delfim, “que a política precede a economia. Não adianta ser economista sem poder. Se você não tiver um controle da política, dificilmente terá controle da economia”.
Nem bem esfriou a entrevista de um dos magos da economia na ditadura, sua colega, economista e ex-deputada pelo PT, Maria da Conceição Tavares veio a lume para rebater, com sua palavra igualmente fácil, mas também ferina, em entrevista à jornalista Cássia Almeida, no mesmo jornal e no dia seguinte (29.1.2016), o que disse Delfim Netto: “Acho que Delfim”, afirmou, “está com saudades da ditadura. A proposta dele é absurda. Ele esquece o seguinte: o nosso presidencialismo é de coalizão. Não é um presidencialismo autoritário. Dilma tem que negociar”. Tudo isso para dizer, depois, que o cenário sombrio traçado pelo ex-ministro é bruxaria: “Essa previsão é bruxaria dele. A gente não sabe o que vai acontecer. É certo que este ano vai ser ruim. Agora, por quantos anos vai ficar ruim? Não tenho ideia, nem ele”.
Dois economistas, duas opiniões. Mesmo assim, a presidente Dilma insiste no tal Conselhão, composto de 98 participantes, capaz de ter o mesmo número de opiniões. Enquanto isso, leitor, o desafiante Aedes aegypti e a operação Lava Jato vão comendo o país pelas beiradas. O primeiro desafia a estrutura da nossa saúde, capenga e deficitária. O segundo desafia a nossa paciência e, pelo andar da carruagem, permite-nos uma fiel interpretação da personalidade do ex-presidente Lula.
Pois Lula, dependendo do que vier por aí, corre o risco de se destruir como líder popular e, depois, ainda sacramentar o fim do governo de sua pupila. Queiram ou não, ambos estão no mesmo barco.
E quem nos salvará do naufrágio?
Dois economistas e duas opiniões diametralmente opostas
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