Imagine uma sala comercial vazia. Bom, quase vazia. No centro do local de paredes brancas, um pedestal de madeira apoia um único livro. Ao fundo, um homem lê essa mesma obra sentado atrás de um balcão feito com antigas gavetas de arquivo, também de madeira. Você chamaria esse local de livraria? O livreiro japonês Yoshiyuki Morioka chama.
Com o nome de Morioka Shoten (Livraria do Morioka, em tradução livre), a loja é uma aplicação extrema do conceito de minimalismo ao mundo das vendas. Todas as semanas, Morioka seleciona uma única obra e a expõe em sua loja. Os compradores que não confundirem a sala vazia com uma instalação artística podem entrar no local, folhear o livro, tirar dúvidas com o vendedor e decidir se querem ler aquela história ou não. Ao contrário do que ocorre em grandes livrarias, a escolha não é entre os últimos cinquenta lançamentos. É um “sim” ou “não” para aquele livro. Só ele. Na semana seguinte, a obra muda, e a escolha pode ser feita novamente.
A notícia da livraria de Morioka correu o mundo. Basta uma simples pesquisa com o nome da loja para encontrar artigos de todas as línguas sobre a genialidade da ideia. Vale chamar a atenção, porém, para o fato de que nenhuma das centenas de matérias revela um único título selecionado pelo livreiro. Quem quiser se submeter à curadoria do vendedor, deve encontrar um caminho que lhe leve a Tóquio.
Ler sobre o negócio do japonês é se ver hipnotizado pela possibilidade de ser libertado do peso da escolha. E como poderia ser diferente? Cada um dos nossos dias são feitos de escolhas que ficam cada vez mais complexas a medida que as possibilidades se multiplicam. Afinal, quantas opções de molho de tomate realmente precisamos? Qual é o número de notícias que conseguimos ler em um único dia antes de pararmos de nos importar com o sofrimento do mundo? Quantas vezes precisamos escutar sobre a violência antes de agir?
Basta refletir por alguns minutos, porém, para perceber que, para todas as perguntas, a resposta é numérica e é maior do que um.
Estamos no meio de um furacão de informação e é compreensível que nossos sentidos estejam sobrecarregados. Tanto tempo atrás, quando a notícia ainda vinha exclusivamente escrita no jornal, Caetano Veloso já questionava: “quem lê tanta notícia?”. Imagine, então, agora. O volume de informação faz adormecer os sentidos, nos deixando insensíveis. Apesar disso, é preciso não cair na tentação do livreiro japonês e se fechar em uma sala vazia, onde vemos somente aquilo que queremos. Ou pior, é preciso não cair na tentação de entrar na sala dos outros, onde vemos somente aquilo que eles querem. Melhor juntar coragem e encarar o furacão.
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