A sociedade brasileira, atônita e impassível, assiste à escalada de conflitos e violência em uma nação corroída pela imoralidade e pela anomia nas relações sociais e políticas, padecendo, ademais, de liderança íntegra e legitimada pelo voto popular.
Não é apenas o uso de força física ou armada em disputas de qualquer natureza que caracteriza a violência, mas ela abrange também o constrangimento moral e a coerção ilegal à liberdade. Pode-se dizer que qualquer coação ao direito à vida e à liberdade, inclusive de expressão de opinião, ao direito ao trabalho, entre muitos outros, enseja alguma forma de violência. A democracia brasileira, conforme consagra a Constituição Federal, garante que todos os cidadãos desfrutem de seus direitos humanos, sem distinção de raça, cor, sexo, religião, opinião política, origem social ou, ainda, condição de nascimento ou riqueza.
Nesse contexto, o déficit atual de direitos humanos e, por consequência, de cidadania é muito grande. Basta elencar os inúmeros casos impunes de xenofobia, discriminação às mulheres, aos idosos e às crianças, homofobia, intolerância religiosa, discriminação racial, entre tantas outras formas de desrespeito aos direitos humanos básicos.
Em grande parte, a crescente violência resulta da intolerância à divergência ou às diferenças, que grassa em todas as esferas da sociedade brasileira, da impunidade e da ausência da legítima ação eficaz do Estado. As evidências são muitas. Cito, por exemplo, agressões a crianças, velhos e mulheres, conflitos entre traficantes, milícias e policiais, assassinatos por motivos fúteis, guerras entre torcidas organizadas no futebol e violência no trânsito. As instituições estão incompetentes para coibir a violência; e as redes sociais são canais livres para difundir e estimular os sentimentos mais perversos de intolerância.
A violência moral já chegou aos tribunais superiores da Justiça, como foi visto por todo o país nas exacerbações verbais de dois ministros da Suprema Corte e nas ameaças à sua família denunciadas pelo ministro Edson Fachin.
A violência física passou de seus limites quando chegou à política no bárbaro assassinato da vereadora Marielle Franco, em pleno centro do Rio de Janeiro, e no atentado à caravana de Lula, no interior do Paraná.
A soma de todos esses exemplos expõe a fratura da democracia brasileira e os riscos reais de uma ruptura institucional, principalmente quando violência e política se misturam explosivamente em visível crescimento. Pouco ou nada se pode esperar nos próximos meses quando as disputas políticas, incendiadas por falsas denúncias, fake news e agressões entre grupos radicais, deverão pôr fogo na campanha eleitoral.
Antes que seja tarde, é hora para o bom senso voltar à política brasileira. As simples declarações de vários candidatos condenando o atentado à caravana de Lula não são suficientes. Deve-se registrar que seu principal oponente nas pesquisas eleitorais, deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ), nem sequer acompanhou os outros postulantes.
Torna-se necessária clara e insofismável manifestação dos principais candidatos à Presidência da República a favor da restauração da concórdia e com efetivo compromisso de buscar a conciliação e a construção da paz no país, tão logo seja proclamado o vencedor das eleições.
Será dever do futuro presidente, legitimado pela escolha popular, tomar a iniciativa de convocar seus adversários e propor ação conjunta para a pacificação.