Palmas para nossa entrevistada do dia, Lilian Nunes, diretora artística e executiva da Coreto Cultural, timão, porto alegre e seguro do projeto Somos Comunidade, há mais de 10 anos com o patrocínio do Instituto Unimed BH. Neste momento, pausa para divulgar o “Grupo Somos”: mais de 20 jovens da comunidade do Morro das Pedras, alunos dos cursos do Somos Comunidade. Lilian Nunes, também diretora do Instituto Periférico, é íntima de grandes festivais em Belo Horizonte, como a Virada Cultural, o Festival Internacional de Teatro (FIT) e o Festival de Quadrinhos (FIQ). Como se não bastasse, há 40 anos atua nos palcos, como cantora, atriz, locutora, produtora e diretora de espetáculos. Ótimo! Como a entrevista ficou grande, mas saborosa, paramos por aqui, para que vocês descubram o “Universo Lilian”, com ela mesma. Cultura e superação, desafios e conquistas, são ótimos temas e receitas perfeitas para encararmos uma segunda-feira, sem anestesia.
Lilian, quem era você antes da Coreto Cultural? Instituto Periférico?
Tenho longa trajetória na música, comecei criança, cantei em corais (Julia Pardini e Ars Nova) e viajei pelo mundo. Fiz vocal em vários trabalhos de palco e estúdio (Ouro de Tolo, J.Quest, 14 Bis), voz principal em outros (Dib Six, Zeeper), atuei como atriz (“Mulheres de Hollanda”), locutora (Rádio Guarani) e tenho dois CDs lançados. Já fui editora de imagens (SSV, TV Manchete), apresentadora em eventos culturais e institucionais, voz e imagem em vários trabalhos de publicidade. Mas sempre muito interessada no backstage e na produção, o que me levou muito cedo a participar de circulações como Balé Kirov, Pilobolus, Disney e produzir festivais como Natura Musical e Conexão Vivo.
Quem é você e o que faz hoje?
Filha de militar, nasci em Bom Despacho e me mudei para Santa Tereza, BH, aos dois anos. Fiz curso técnico de edificações, algumas graduações parciais e me formei em jornalismo, o que me proporcionou o desenvolvimento de múltiplas habilidades que muito somam em minha trajetória. Inquieta, durei um ano no funcionalismo público. Passei por vários palcos e várias produtoras e, hoje, sou proprietária da Coreto Cultural, assim como diretora executiva do Instituto Periférico, ambos com sede em Santê. Além de planejamento e gestão dos nossos projetos, muitos deles feitos em parceria com o poder público, dedico parte do meu tempo a atender demandas de direções geral e artística de eventos corporativos e espetáculos, assim como curadoria de projetos.
O que é a Coreto Cultural?
Coreto é uma produtora de eventos que atua na elaboração e produção de projetos culturais, corporativos e artísticos e que, ao longo dos últimos anos, se especializou no gerenciamento de ações de grande porte, em locais públicos, como a Virada Cultural, evento no qual atuamos em sete edições; o Descontorno Cultural e o Programa Somos Comunidade. A Coreto atende clientes públicos e privados, além de colaborar com outras produtoras no desenvolvimento de seus projetos proprietários.
Dentro da Coreto, o que é o projeto Somos Comunidade? Uma escola?
O Somos nasceu em 2012, oferecendo oportunidades para jovens que frequentavam cursos de artes no contraturno de escolas públicas do Morro das Pedras, comunidade periférica de Belo Horizonte. O projeto iniciou como espetáculo de resultados, chegou aos grandes teatros da capital (Sesc Palladium, em 2012 e Palácio das Artes, em 2014), ganhou convidados nacionais (Dori Caymmi, em 2014, e Lô Borges, em 2016), ultrapassou fronteiras em palcos de rua (Praça da Estação nos 120 anos de BH, em 2017), tornou-se um festival com programação ampliada (Praça de Santa Tereza, em 2018, e Parque Lagoa do Nado, em 2019), gerou um braço formativo multiplicador nas áreas de artes cênicas – tanto de palco como backstage, virou um documentário espetáculo com artistas da favela em parcerias nacionais (“Não Há Sol a Sós”, em 2021, com Elza Soares, Carlinhos Brown, Fernanda Takai, Mônica Salmaso) e conquistou diversos parceiros no ecossistema cultural, dentro e fora da favela, ampliando suas ações para Contagem, Betim e Nova Lima.
O Somos Comunidade existiria sem o Instituto Unimed?
O Somos Comunidade só é possível porque há uma instituição responsável que investe em ações socioculturais desde 2003, o Instituto Unimed-BH. É interessante porque é o maior case de patrocínio de pessoa física do país e envolve mais de 5.700 médicos e colaboradores para fazer a cultura girar em Minas. Em 2007, o Instituto Unimed-BH fundou a Escola de Artes com seu mesmo nome no Morro das Pedras e, nesses 18 anos, atende anualmente centenas de alunos com aulas de danças clássica, jazz, urbanas e percussão. A continuidade ininterrupta desse investimento e a visão estratégica de proporcionar visibilidade a esses jovens desde 2012 - através dos festivais produzidos junto à Coreto - nutre e gera empoderamento, mudando a perspectiva de milhares de vidas originalmente vulnerabilizadas.
E o Grupo Somos?
O Grupo Somos surgiu em 2024 diante da evolução artística de muitos alunos que começaram quando crianças na Escola de Artes Instituto Unimed-BH e se tornaram jovens capazes de maiores desafios artísticos. No espetáculo montado ano passado, lançamos a proposta de misturar modalidades - clássico, jazz, dança de rua, percussão - entre esses veteranos. O resultado foi tão maravilhoso que viabilizamos bolsas-auxílio em 2025 para ampliar aulas e realizar práticas formativas que, na verdade, são apresentações de cenas. Essa circulação acontece em sete dos mais importantes eventos da região metropolitana de BH.
Como a arte e a cultura transformam vidas?
O Somos Comunidade já levou centenas de crianças e jovens periféricos a se apresentarem nos melhores palcos da cidade. Mas, mais do que subir ao palco, buscamos proporcionar experiências que valorizem cada jovem, elevem sua autoestima e lhes deem voz e poder sobre suas trajetórias. Acreditamos que a arte é uma ferramenta concreta de transformação e vemos nossos alunos se tornarem cidadãos conscientes, realizados e atuantes graças a essas vivências. Com oportunidade e afeto, um sonho lá no morro pode se tornar uma grande história de vida.
Um exemplo, por favor!
A Thais Gabrielly, a Thaizinha, entrou no projeto ainda criança; hoje, aos 21 anos, é orientadora artística da Escola de Artes e uma referência para os novos participantes. São 15 anos de trajetória, de aluna a educadora, que mostram como a cultura abre caminhos. Outra jovem, Kamilla, começou a dançar aos 4 anos e encontrou no jazz sua voz; atualmente, além de continuar dançando, ela é professora auxiliar no núcleo artístico e está cursando educação física. Já Hellen, que começou brincando com os tambores, é a primeira mulher preta de favela a estar à frente de um grupo de percussão na cidade. Histórias como as delas ilustram que, quando uma criança periférica descobre seu talento artístico, nasce ali uma nova perspectiva de futuro. Ver esses jovens é realmente testemunhar a arte abrindo caminhos e criando futuros diante dos nossos olhos.
Mudando de assunto ou voltando, o que têm em comum Virada Cultural, Festival Internacional de Teatro (FIT) e Festival de Quadrinhos (FIQ)?
Têm Coreto! (Risos!). Participamos em várias edições desses projetos, seja com a Coreto ou com o Instituto Periférico. São alguns dos mais importantes festivais da capital, executados pelo poder público municipal. Geram oportunidades aos artistas locais, trazem referências nacionais e internacionais, injetam renda no ecossistema cultural e, como é sabido, multiplicam o investimento financeiro do governo e retornam para a população e a cidade.
Muito é muito pouco para Lilian Nunes?
Cultura é comportamento. E viver é plural. Sempre fui curiosa e empolgada com a arte e suas possibilidades infinitas. O palco é uma casa que deve acolher a todos. E o público é o que nos impulsiona. Moto contínuo.
Planos para o fim de 2025 e para 2026?
No programa Somos Comunidade, pretendemos dar continuidade ao trabalho de profissionalização dos veteranos, o Grupo Somos, e buscar caminhos para se apresentarem cada vez mais em eventos culturais e corporativos, gerando oportunidades e renda. Também nos planos, uma nova mostra de resultados com participação ampliada de alunos, artistas e grupos convidados, além da ampliação da capacitação e do incentivo ao empreendedorismo criativo nas favelas. Para tudo isso acontecer, contamos com o Instituto Unimed-BH e outras empresas e instituições parceiras que apoiem esse importante motor de inclusão e transformação social: a cultura.