A aprovação do Projeto de Lei (PL) que cria um marco geral para o licenciamento ambiental na Câmara dos Deputados, na madrugada desta quinta-feira (17/7), desagradou entidades ambientalistas, mas está sendo exaltada no setor produtivo. O texto, que agora será encaminhado para a sanção do presidente Lula, busca unificar as diversas leis relacionadas à concessão de licenças ambientais e ajustar as regras vigentes. 

Para o Observatório do Clima, o avanço da proposta traz prejuízos ao país e 'detona as regras do licenciamento ambiental'. “A aprovação do Projeto de Lei 2.159/2021 é o maior retrocesso ambiental legislativo desde a ditadura militar (1964-1985) e ocorre a menos de quatro meses da COP30, a conferência do Clima da ONU que será realizada em Belém”, diz a entidade. 

O Observatório do Clima defende que o projeto seja vetado na íntegra. “O licenciamento ambiental pode ser aperfeiçoado, mas isso deve ser feito com participação da sociedade e critérios técnicos e científicos. O PL 2.159 é a antítese da solução para o licenciamento”, complementa. De acordo com a entidade, o texto é inconstitucional e será contestado na Justiça. 

O PL, defende o Observatório do Clima, vai resultar em conflitos e insegurança jurídica a empreendedores e investidores. “É o fim de quatro décadas de construção da legislação ambiental e o retorno de um modelo de desenvolvimento econômico que causa descontrole, poluição e morte”, reclama. 

A Fundação SOS Mata Atlântica alerta para o risco de aumento do desmatamento no país, especialmente em áreas protegidas. Para a entidade, o PL põe em xeque os compromissos firmados pelo Brasil nos acordos climáticos e de biodiversidade.  “Alterar um sistema legal comprovadamente eficaz é institucionalmente temerário e juridicamente questionável, colocando em risco os compromissos assumidos pelo Brasil perante o Acordo do Clima e as COPs da Biodiversidade e do Clima”, salienta. 

Apoio 

Apesar das críticas, setores produtivos celebraram a aprovação do PL. A Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) analisa que o PL avança na direção de um modelo mais eficiente, seguro e ágil para o licenciamento ambiental. O setor industrial classifica o texto como um marco histórico, por estabelecer regras claras e simplificadas, que podem destravar a fila de obras paradas no país aguardando a emissão de licenças. 

O presidente da Fiemg, Flávio Roscoe, cita que são 5.600 obras públicas em stand by no país em função da complexidade da legislação ambiental vigente e da insegurança de processos. “Ganhamos em celeridade, em segurança jurídica e, sobretudo, em desenvolvimento. A legislação não precariza o meio ambiente - ao contrário, ela garante critérios técnicos e objetivos, dando mais eficiência ao processo e reduzindo entraves burocráticos”, avalia Roscoe.
 
A entidade também celebra a inclusão da atividade de mineração no escopo da legislação, além de diferenciar os níveis de exigência conforme o impacto ambiental das atividades, com regras mais simples para empreendimentos de baixo risco. “Ao simplificar sem precarizar, o Brasil dá um passo importante rumo à sustentabilidade com desenvolvimento. Essa nova legislação vai permitir que obras essenciais avancem, investimentos se concretizem e que o país continue crescendo com responsabilidade ambiental”, finaliza.

O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), em nota, diz que a inserção da mineração no PL tem provocado uma onda de desinformação. O instituto ressalta que o texto aprovado pelos deputados não diz respeito à segurança das barragens de rejeitos minerais.

"As barragens são disciplinadas por outra legislação, no caso, a Política Nacional de Segurança de Barragens, instituída pela lei 14066/2020, e pela resolução 95/2022 da Agência Nacional de Mineração (ANM). Ademais, o setor tem agido com muita atenção e investido recursos diversos para tornar a atividade cada vez mais segura e responsável", disse.

Conforme o Ibram, o projeto de lei aprovado confere mais agilidade aos processos envolvidos no licenciamento e isso não significará menos rigor para autorizar os empreendimentos do setor mineral. "Todos desta indústria seguem obedecendo regras rígidas, mas o setor público terá que se capacitar a cumprir o que está na nova lei", acrescenta.

Entenda o PL 

A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei (PL) que estabelece o marco geral do licenciamento ambiental durante sessão na madrugada de quinta-feira (17/7), encerrando o semestre legislativo. A proposta, relatada pelo deputado Zé Vitor (PL-MG), conta com apoio da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) e de parte da bancada do PT. 

A versão final com as mudanças feitas por Senado Federal e Câmara dos Deputados também passou por conversas com a equipe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Esses encontros reuniram os ministros Rui Costa, chefe da Casa Civil, e Marina Silva, do Meio Ambiente.

Embora a ministra do Meio Ambiente e o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, sejam críticos à proposta no Palácio do Planalto, mantiveram diálogo com o relator. Um marco para unificar as regras do licenciamento ambiental é discutido há 21 anos no Congresso Nacional. A proposta avançou nos últimos meses com a aprovação do texto no plenário do Senado Federal.

Pouco antes do recesso, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), cumpriu a promessa de pautar o projeto para votação no plenário, encerrando a tramitação da mudança na legislação no Congresso. A proposta constitui um arcabouço legal para uniformizar as diversas leis em diferentes competências que tratam da concessão de licenças e ajustar as regras vigentes. 

Setores produtivos liderados pela FPA e bancadas afins avaliam a proposta como um meio necessário e indispensável para desburocratizar processos. O relator Zé Vitor manteve muitas das alterações feitas na proposta pelo Senado Federal. Uma das principais mudanças refere-se às atividades mineradoras. Pelo texto aprovado na Câmara, as operações de mineração de grande porte ou de alto risco serão submetidas às regras do marco geral.

A outra opção era manter a concessão de licenças para mineração a cargo do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).O parlamentar também estabelece o prazo de validade da Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC), que será de 5 a 10 anos. Essa ferramenta já era adotada por estados como Bahia, Ceará e Rio Grande do Sul e, se a proposta receber sanção, valerá para outras unidades da federação.

O modelo preocupa ambientalistas, pois permite que empreendedores obtenham licenças por meio de autodeclarações. Nela, o proprietário assume que conhece a lei e se compromete a cumprir as exigências ambientais. Esse tipo de licença só seria aplicado às atividades e operações de baixo impacto ambiental.

No relatório, Zé Vitor mantém a possibilidade de Licença Ambiental Especial (LAE) para atividades estratégicas, incluindo a exploração de petróleo na Margem Equatorial, uma iniciativa apoiada por Lula e pela Petrobras, mas contestada pelo Ministério do Meio Ambiente.

O trecho é apoiado pelo próprio presidente Lula e pela presidente da Petrobras, Magda Chambriard, grandes defensores do início da exploração petrolífera na região da foz do Rio Amazonas. A ministra do Meio Ambiente, no entanto, é contra.