O motorista do ônibus da linha 5715 (Gávea II / Terminal Morro Alto), de 37 anos, foi estratégico tanto no planejamento dos criminosos quanto dos policiais militares na ocorrência de incêndio na MG-10, em Vespasiano, na região metropolitana de Belo Horizonte, nessa segunda (12 de agosto). O trabalhador foi escolhido pelos suspeitos para guardar uma carta que, supostamente, traz denúncias do sistema penitenciário. Do outro lado, foi ele quem entregou à polícia as características dos homens, o que permitiu a identificação e prisão de um deles

Não está nas funções do cargo de motorista de ônibus metropolitano, no entanto, lidar com tamanha adrenalina e responsabilidade. Principalmente ao ter que tranquilizar os passageiros em meio à ação dos criminosos. É o que argumenta o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários de Belo Horizonte e Região (STTRBH), Paulo César da Silva. 

O representante afirma que os condutores estão acumulando uma pressão que os adoece ou os afasta da profissão. A violência repentina de uma invasão com incêndio, segundo ele, está na ponta do problema. "Essa é uma das mazelas que nossos profissionais enfrentam (os incêndios em ônibus). É cotidiana a pressão psicológica que os motoristas sofrem, enfrentando trânsito, a pressão da população, a necessidade de cumprir horário com esse trânsito caótico. Temos tido bastante problema com o adoecimento precoce da categoria, inclusive os profissionais têm migrado para outras profissões", denuncia César da Silva. 

Ainda conforme o STTRBH, o sistema de transporte coletivo tem encontrado dificuldade de contratação devido a esse tipo de violência. "Infelizmente, com a ausência da segurança pública, o que prevalece é o crime. Pedimos às autoridades que intensifiquem a fiscalização dentro dos ônibus e até mesmo na via pública, para dar mais segurança para nossos condutores e para os usuários", continua o representante. 

Qual a recomendação em casos de invasão do ônibus?

O diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviário da Região Metropolitana de Belo Horizonte (STRRM.BH), Rubens Ruas, orienta os trabalhadores a não reagirem à ação dos criminosos. "O recomendado pelo sindicato e pelas empresas é que o motorista pare o ônibus com segurança, para que ele e os usuários desçam do veículo e fiquem em local seguro. Depois, acione a empresa e a Polícia Militar", diz.

Queima de ônibus na Grande BH causou prejuízo de R$ 450 mil

A queima do ônibus da linha 5715 (Gávea II / Terminal Morro Alto) causou um prejuízo de R$ 450 mil. O dado, calculado pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros Metropolitano (Sintram), torna palpável um infortúnio mais difícil de ser mensurado: ainda não há previsão de quando um veículo substituto passará a fazer o trajeto. Ou seja, nos próximos dias, o coletivo deve acumular maior lotação e atraso. 

De acordo com o Sintram, este foi o quarto ônibus metropolitano incendiado no ano – o que indica um prejuízo total de mais de R$ 1 milhão. Em todo 2023, foram queimados oito coletivos. O sindicato lamentou a perda do veículo na MG-10, essa segunda (12), por prever impactos negativos na circulação da frota. 

"O Sintram se preocupa bastante com outro impacto significativo de episódios assim: o da possibilidade de descumprimento de viagens, uma vez que, em muitos casos, há a necessidade de reprogramação para compensar a falta do ônibus atingido. Ou seja, afeta a empresa associada em mais de uma frente, mas o usuário final, infelizmente, também é afetado no seu trajeto do dia a dia", afirmou. 

Nos últimos anos, mais da metade dos brasileiros 'desistiram' dos ônibus 

Os ônibus deixaram de ser uma opção de deslocamento para mais da metade dos brasileiros (56,9%) que utilizavam o veículo no Brasil. Menos de um terço da população (32,1%) continua com demanda cativa para o meio de transporte. Pouco conforto, falta de flexibilidade de horários e rotas, além do elevado tempo de deslocamento, são as principais explicações para o “abandono” dos coletivos. Os dados compõem a pesquisa CNT Mobilidade da População Urbana, divulgada na última quarta-feira (7/8). 

O levantamento mostrou que, nos últimos sete anos, os deslocamentos realizados no transporte coletivo tiveram participação reduzida em 18,1 pontos percentuais. Os ônibus continuam sendo o principal meio de transporte usado no país, com representatividade de 30,9% dos deslocamentos, mas, em 2017, essa taxa era de 45,2%. Já o carro próprio, que é a segunda opção mais usada no país, subiu de 22,2% para 29,6% no mesmo período.

Polícia Militar prendeu um dos suspeitos do incêndio: 'alta periculosidade'

A Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) localizou e prendeu, nessa segunda-feira (13 de agosto), um dos criminosos suspeitos de incendiarem o ônibus da linha 5715 em Vespasiano. O homem tem 23 anos, é natural de São Paulo e foi considerado, pela corporação, como de "alta periculosidade pelo envolvimento em quadrilhas e/ou grande número de registros policiais e processos judiciais em andamento". 

O comparsa, identificado pelo vulgo "Belão", de 34 anos, natural de BH, continua sendo procurado. Conforme o boletim de ocorrência, o motorista do coletivo foi crucial para a identificação dos suspeitos. O trabalhador conseguiu lembrar de características físicas dos homens e do tipo de roupa que estavam vestindo no momento que incendiaram o ônibus. 

As informações dadas pelo motorista bateram com registros fotográficos do Departamento de Estradas de Rodagem (DER). O órgão estava monitorando uma manutenção no ponto de ônibus na marginal do MG-10 e conseguiu flagrar a movimentação dos suspeitos antes do crime. 

Tatuagem no rosto entregou suspeito

Os militares, então, utilizaram as provas para realizar buscas pelos criminosos. O mais novo, de 23, foi flagrado caminhando pelo bairro Morro Alto, em Vespasiano, com o rosto coberto por um capuz. A ação chamou atenção dos policiais, que fizeram a abordagem.

A tatuagem de cifrão ($) no rosto e o boné, o mesmo das imagens do DER, confirmaram o suspeito. Ainda, a camisa usada no momento do incêndio foi localizada na residência do preso.

Fogo em ônibus foi por ordem de detentos de Patrocínio 

O jovem disse aos militares que apenas acompanhou o comparsa, "Belão", no crime, mas que não teria sido ele quem ateou fogo no ônibus. Ele afirmou que participou da ação por ordem de detentos do presídio da cidade de Patrocínio, no Alto Paranaíba. O suspeito foi encaminhado para a delegacia da Polícia Civil. 

O ônibus foi liberado para a empresa Saritur, que ficou responsável por recolher o veículo queimado. 

Entenda: carta de revolta 

O incêndio ocorreu na tarde desta segunda-feira (12). Um vídeo feito pela Polícia Militar anuncia que o ato seria uma reinvindicação contra o sistema penitenciário mineiro.

Conforme moradores da localidade, que preferiram o anonimato, antes de atear fogo no veículo, os criminosos deixaram com o condutor do coletivo uma carta com supostas reclamações a respeito do tratamento que é dado aos detentos nos presídios mineiros. O material também foi citado no boletim de ocorrência. 

Veja vídeo: 

O que diz o Sintram?

"O Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros Metropolitano (Sintram) confirma que na tarde da última segunda-feira, (12), um ônibus da linha 5715 Gávea II/Terminal Morro Alto, que pertence a uma de suas empresas associadas, foi vítima de vandalismo e pegou fogo no entroncamento da rodovia MG-424 com a rodovia MG-10, na altura da cidade de Vespasiano, na região metropolitana de Belo Horizonte.

A Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros foram imediatamente acionados e chegaram ao local em poucos minutos. Não houve feridos já que tanto passageiros quanto motorista desembarcaram antes do veículo
começar a ser incendiado. Quem ainda permaneceu no local foi amparado e orientado.

O Sintram identificou os dois possíveis suspeitos de terem causado intencionalmente o incêndio e a informação foi repassada à Polícia Militar, que já prendeu um deles e está fazendo um trabalho de busca pelo outro.

O Sintram mais uma vez repudia os atos que, além de gerar prejuízos financeiros, causam, sobretudo, insegurança a usuários e trabalhadores do transporte metropolitano e atrapalham a mobilidade urbana".