O resultado do exame toxicológico do caminhoneiro envolvido no grave acidente na BR-116, em Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, destaca a importância da testagem periódica entre os motoristas da categoria, segundo o especialista em trânsito e coordenador do SOS Estradas, Rodolfo Rizzotto. A legislação foi alterada em 2023 (Lei 14.599/23), tornando obrigatório o exame toxicológico de larga janela – que detecta o uso de drogas nos últimos 90 a 180 dias – para condutores habilitados nas categorias C, D e E, ou seja, caminhões, ônibus e carretas.
Desde então, eles devem refazer a testagem a cada dois anos e seis meses, além dos momentos de renovação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), mudança de categoria ou admissão e demissão em empresas. O caminhoneiro preso nesta terça-feira (21 de janeiro) estava sob efeito de cocaína, ecstasy, medicamentos e álcool.
“A principal importância da mudança na lei do exame toxicológico é a prevenção de acidentes. Ela retira do mercado motoristas que não fazem o teste porque sabem que não passarão, pois são usuários recorrentes de drogas e não conseguem mais ficar sem as substâncias. Nos últimos anos, houve uma redução significativa no número de habilitados. Quando o exame entrou em vigor, eram 13 milhões de condutores da categoria C, D e E. Hoje, são 11 milhões", pondera o especialista Rodolfo Rizzotto.
Um levantamento do SOS Estradas revelou que o exame toxicológico de larga janela identificou seis vezes mais motoristas usuários de drogas do que a Operação Lei Seca flagrou condutores dessas categorias dirigindo alcoolizados. Entre 2016 e 2023, 29.605 motoristas foram autuados por uso de álcool ao volante, enquanto 188.873 tiveram resultado positivo no toxicológico.
Rizzotto ressalta que a periodicidade do exame é fundamental, já que caminhoneiros raramente são parados em fiscalizações. “Nas estradas, a fiscalização de ônibus, caminhões e carretas ocorre, basicamente, por denúncia. A questão é também operacional: uma blitz que pare cinco caminhões já bloqueia 150 metros de pista. No caso de ônibus, para onde iriam os passageiros? A fiscalização é praticamente inexistente, e não é exagero dizer que o único controle do uso de substâncias por caminhoneiros é o exame toxicológico”, afirma.
Abuso de drogas: qual o efeito nos motoristas e nas estradas?
De acordo com o especialista Rodolfo Rizzotto, o uso de drogas por motoristas de caminhão tornou-se uma forma de manter a produtividade no transporte de cargas, que exige uma rotina exaustiva de horas nas estradas. Mas o vício impacta diretamente a condução. “Sob efeito de substâncias, o motorista perde completamente a noção de risco, tem alucinações e pode desmaiar abruptamente ao volante. Já foram registrados vários casos de caminhoneiros que aceleraram excessivamente por acreditarem estar sendo perseguidos e tiveram crises de pânico”, explica.
Na tragédia da BR-116, a chefe da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), delegada-geral Letícia Gamboge, afirmou a responsabilidade do caminhoneiro pelas mortes, atribuídas à condução sob efeito de diversos entorpecentes, em alta velocidade e com carga acima do limite permitido. A próxima demanda do SOS Estradas é a implementação do exame toxicológico randômico. “É o que estamos propondo: testagens a qualquer momento. O motorista receberá um alerta surpresa e deverá apresentar um laudo negativo em até 30 dias. Isso reduzirá ainda mais os riscos nas estradas. Motoristas drogados são ameaças de tragédias”, afirma.
Penalidade
- A penalidade de multa para as infrações prevista na Lei 14.599/2023, é de natureza gravíssima (cinco vezes) no valor de R$ 1.467,35 e sete pontos na CNH.
O outro lado
A defesa do caminhoneiro envolvido no acidente na BR-116 que causou a morte de 39 pessoas afirmou que os exames toxicológicos não comprovam que ele estivesse sob efeito de substâncias psicoativas no momento da batida, já que as análises foram feitas dois dias depois. Além disso, garantiu que irá recorrer da prisão preventiva, para garantir o direito do motorista de responder ao processo em liberdade. Veja o posicionamento completo aqui.
O acidente na BR-116
Um grave acidente envolvendo um ônibus de viagem interestadual, uma carreta e um carro mobilizou as forças de segurança no dia 21 de dezembro, na BR-116, em Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, em Minas Gerais. O coletivo, que levava 45 passageiros, e pegou fogo após a batida. A tragédia causou a interdição da rodovia federal. Ao todo, 39 pessoas morreram e outras nove ficaram feridas.
O coletivo seguia de São Paulo com destino à Bahia. Entre as vítimas, há moradores dos estados de São Paulo, Bahia, Minas Gerais e Paraíba. Outras seis pessoas que estavam no ônibus sobreviveram. Três pessoas que viajavam no carro tiveram ferimentos leves. O motorista da carreta fugiu sem prestar socorro.