O ano letivo para os alunos das escolas municipais de Belo Horizonte teve início no dia 5 de fevereiro. Porém, para a pequena Bia, de 7 anos, uma garotinha autista e com paralisia cerebral, as aulas só tiveram início este mês, conforme denúncia da mãe da criança, Brisa Araújo, de 30 anos. Em entrevista concedida a O TEMPO nesta sexta-feira (16 de maio), a mulher denunciou que, ao longo dos anos, constatou que as escolas municipais e estaduais da capital mineira parecem não ter compreendido o verdadeiro significado de "inclusão". 

Formada em marketing, a mulher se dedica hoje exclusivamente aos cuidados da filha. Brisa conta que a menina está na escola desde os 3 anos, sendo sempre muito participativa nas aulas. Porém, em 2024, ela teria ingressado no ensino fundamental em uma rede estadual, onde cursou o 1º ano. 

"Apesar da frequência, ela teve pouquíssimo avanço no aprendizado, não por falta de capacidade, mas por falta de estrutura adequada. Falta auxiliar de inclusão, e quando tem, chega no meio do ano. Falta material adaptado, planejamento individualizado, metas possíveis para minha filha. Falta preparo dos professores, que muitas vezes não têm formação para lidar com crianças com deficiência intelectual ou autismo, falta psicopedagoga", reclama a mãe.

Diante da pouca evolução da filha e ainda buscando por uma escola que oferecesse a "verdadeira inclusão", neste ano Brisa resolveu matricular Bia em uma instituição municipal, o Imaco. Porém, já na hora de fazer a matrícula, ela se deparou com o que chamou de "primeiro choque". 

"A pessoa responsável me disse que eu não deveria criar expectativas, que provavelmente a Bia não seria alfabetizada e que a escola não teria como oferecer o suporte ideal. Era como se ela já estivesse sentenciando o futuro da minha filha ali, antes mesmo do ano letivo começar. Faltava auxiliar, faltava adaptação, faltava vontade institucional. O auxiliar só foi disponibilizado agora em maio, por isso a minha filha só conseguiu começar a frequentar a escola nessa semana", denuncia a mulher.

Entretanto, já na primeira semana de aula, a mãe afirma estar sofrendo com barreiras na nova escola. "Recebemos um dever de casa completamente incompatível com a realidade dela. Para uma criança típica da idade dela, aquilo seria simples. Mas, para a minha filha, que tem deficiência intelectual, não é. O material não foi adaptado e ela simplesmente não conseguiu fazer. É frustrante para ela e para mim, porque parece que, mais uma vez, o sistema falha em reconhecer o que é necessário para incluir de verdade", lamenta. 

Reunião na próxima semana

Ainda conforme Brisa, na segunda-feira (19 de maio) acontecerá uma reunião com o Imaco para discutir estas questões referentes à inclusão da criança. "Quero saber o que será adaptado, o que não será e, principalmente, quem vai se responsabilizar por essas adaptações, porque não dá mais para empurrar as famílias de crianças atípicas para a beira do sistema, esperando que a gente se vire sozinha com tudo", pontua.

A mulher lembra ainda que a educação é um direito garantido por lei, e que a inclusão não é um favor, mas, sim, uma obrigação legal. "Minha filha não é um estorvo, não é um peso para ninguém. A inclusão hoje em dia está no papel, ela tá na propaganda, no cartaz, na porta da escola, mas, no ato mesmo, ela não acontece", conclui a mãe da garota. 

Procurada pela reportagem de O TEMPO, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e a Secretaria Municipal de Educação (Smed), lamentaram o atraso no atendimento da aluna Maria Beatriz, que se deu em razão, segundo eles, de pendências no contrato com a MGS, empresa que oferece prestação de serviços e que pertence ao governo de Minas. 

"Quanto à oferta de atividades consideradas incompatíveis, a Smed informa que o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) da estudante, documento responsável pelo acompanhamento e pelo desenvolvimento da aprendizagem de cada aluno, será revisto com o objetivo de aprimorar a abordagem pedagógica e potencializar o processo de ensino e aprendizagem. A Smed reforça seu compromisso com a inclusão, o respeito à diversidade e a garantia de um atendimento educacional de qualidade para todos os alunos", afirmou em trecho do posicionamento.

Em nota divulgada neste sábado (17), a a Minas Gerais Administração e Serviços S.A. (MGS) alegou que tem garantido, dentro dos prazos estabelecidos nos contratos com a SMED, o preenchimento dos postos de Auxiliar de Apoio ao Educando (AAE). "Atualmente, o tempo médio para ocupação dos postos tem sido inferior aos 15 dias previstos contratualmente, demonstrando agilidade e eficiência da empresa no atendimento às demandas da rede municipal de ensino", completou.

A empresa estadual destacou ainda que os AAE são selecionados por meio de Processo Seletivo Público Simplificado e recebem capacitação específica em comunicação, trabalho em equipe, mediação de acessibilidade e manejo de situações comuns no ambiente escolar. A função destes trabalhadores de nível médio é oferecer suporte direto às atividades de inclusão e às necessidades funcionais de alunos com deficiência.

"Por fim, a MGS reitera seu compromisso com a educação inclusiva e com a prestação de serviços públicos de qualidade, pautada pela responsabilidade, eficiência e alinhamento às diretrizes dos órgãos contratantes", concluiu.

Também procurada por O TEMPO, a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE) e o governo de Minas também foram questionados. Por meio de nota, a SEE/MG disse que  a informação de que uma estudante atendida pela Escola Estadual Bueno Brandão, em Belo Horizonte, teria sido transferida por falta de suporte adequado à educação especial não procede.

A pasta disse também que a estudante permaneceu na escola até dezembro de 2024, recebendo todo o suporte necessário, incluindo acompanhamento de professor de apoio e materiais didáticos específicos para inclusão na sala de recursos e que a transferência foi solicitada pela mãe da estudante devido à necessidade de uma escola em tempo integral, modalidade que não é oferecida na unidade de origem.