A foto de Pedro Henrique Dias Soares, de 28 anos, assassinado na noite do segundo turno das últimas eleições presidenciais (em outubro de 2022), estampava a camisa de seus familiares enquanto eles penduravam uma faixa pedindo por justiça em frente ao Fórum Lafayette, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, nesta segunda-feira (30 de junho). Passados dois anos e oito meses do atentado que tirou a vida de Pedro e de Luana Rafaela Oliveira Barcelos, de 12, no bairro Nova Cintra, na região Oeste da capital, o caso avança para a audiência de instrução do acusado. O réu, à época do crime com 36 anos, é apontado como eleitor de Jair Bolsonaro e teria se revoltado com o resultado das urnas.
A audiência deve ouvir cerca de 24 testemunhas, entre acusação e defesa. Se houver tempo, o réu — que está presente no Fórum — também será interrogado nesta segunda. Entre os familiares, o sentimento é uma mistura de ansiedade por justiça e o peso contínuo do luto. A mãe de Pedro Henrique, Alexandra Dias, se emocionou ao lembrar do dia do crime.
“É um pesadelo. Já se passaram mais de dois anos, e nada vai trazer meu filho de volta para mim. Eu espero por Justiça, para que, pelo menos, o atirador não saia impune. Ainda mais por um motivo ridículo [político] para sair atirando e matando pessoas. Temos que saber respeitar o próximo”, desabafa.
A funcionária pública lembra que estava na casa alvo dos ataques no dia em que seu filho foi executado. Para ela, não restam dúvidas de que o crime teve motivação política. “A família comemorava a vitória [de Lula (PT)] quando ele chegou. Esse homem simplesmente gritou 'Bolsonaro' e saiu atirando. Só não atirou em duas pessoas que estavam com a blusa do Brasil. Se salvou quem conseguiu correr, mas era para ter matado todo mundo. Quando eu deitei no chão, meu filho já estava caído", lamenta. Alexandra tem no braço a cicatriz de uma das balas.
Suspeito não está preso
Ainda segundo a família de Pedro, o atirador não está preso, mas cumpre medidas cautelares em domicílio. Durante o processo, alegou problemas de saúde mental. “Isso é revoltante. Independentemente de qualquer coisa, ele cometeu um crime. Ele matou duas pessoas inocentes. Espero que hoje comece verdadeiramente essa Justiça que a gente precisa", afirma.
O atirador responde por dois homicídios qualificados (por motivo fútil e com recurso que dificultou a defesa das vítimas) e por outras seis tentativas de homicídio. Na época do crime, a polícia apreendeu na casa do suspeito, que tinha certificado de Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador (CAC), um rifle, duas pistolas e mais de 500 munições.
Relembre o crime
O crime foi registrado por volta das 19h45, instantes antes da vitória do ex-presidente petista nas urnas ser sacramentada. Segundo familiares da vítima, informações indicam que o suspeito gritava "Bolsonaro" nas ruas da região pouco antes do crime.
Além disso, eles afirmam que, há poucos dias da eleição, o homem teria feito uma postagem em um perfil já apagado das redes sociais afirmando que, se Bolsonaro (PL) perdesse, ele sairia fazendo "uma desgraça" nas ruas.
Após a prisão, o homem confessou ter atirado e disse que teria passado o dia ingerindo bebidas alcoólicas na casa de um familiar, até que, em dado momento, ficou "desorientado", foi para casa e pegou as armas. Ele alegou ainda que sofre de ansiedade e outros problemas psiquiátricos, mas que há 1 mês não fazia uso de medicamentos.
Na versão dele, armado, ele foi até um beco próximo para "tirar satisfação" com indivíduos que sempre usavam drogas no local. Conforme o depoimento dado pelo suspeito aos PMs, ao não encontrar ninguém no beco, ele continuou andando e, em uma rua, ao ver pessoas andando, resolveu atirar de forma indiscriminada.
Foi neste momento que ele atingiu duas pessoas, uma criança de 12 anos e uma mulher de 40 anos. As duas foram socorridas para a UPA Oeste, mas a criança acabou não resistindo.
Logo depois, ele passou pela casa de amigos de Pedro Henrique, onde ele, sua mãe, uma prima e outros conhecidos - a maior parte deles eleitores de Bolsonaro - confraternizavam após a eleição. O homem teria pedido para as pessoas se deitarem no chão e, após eles obedecerem, teria dito "vou atirar assim mesmo" e alvejando em seguida as vítimas.
O jovem, eleitor do PT e que usava um adesivo do partido, segundo amigos, foi atingido no abdômen e no ombro e acabou não resistindo, falecendo antes de dar entrada no hospital. Além dele, também foram atingidas a mãe do rapaz, de 47 anos, uma prima dele, de 40.