Maria Madalena Prata Soares, de 78 anos, viúva do ex-estudante da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) José Carlos Mata Machado, recebeu R$ 590 mil de indenização por danos morais, mais de cinco décadas após a morte do marido durante a Ditadura Militar. Mata Machado foi torturado e morto em 1973 no Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), em Recife, capital de Pernambuco. Quando morreu, ele deixou a mulher e o filho Dorival, hoje com 53 anos.

“É notável a demora para um desfecho. Ainda que tardia, foi feita Justiça à família. Há vasta jurisprudência no sentido de que são imprescritíveis as ações indenizatórias por atos contra os direitos fundamentais praticados por agentes do Estado”, afirmou o advogado Eduardo Diamantino, um dos representantes da família. O processo foi conduzido por ele e pelos advogados Diamantino Silva Filho (in memoriam), e Frederico Diamantino. A petição da ação de indenização foi apresentada em 1999 e a sentença que condenou a União saiu quatro anos depois, em 2003.

Na ocasião, o juiz federal Carlos Augusto Tôrres Nobre rejeitou a alegação da União de que os atos de José Carlos Mata Machado contribuíram para a sua morte. “Quando o Estado custodia pessoas, é dever inafastável zelar pela integridade física delas. Se o agente estatal chega ao limite intolerável da barbárie e tortura, que não justifique seu ato criminoso com rótulos que pôs na vítima. O vício moral é do torturador. E nas suas entranhas se aloja a sementeira do mal. Não deve buscá-la em outrem”, escreveu o magistrado. A sentença apontou que a Lei 9.140/95 não foi suficiente para reparar o sofrimento dos familiares de mortos e desaparecidos políticos. “Evidente que ficaram de fora os danos morais dos familiares que sofreram a perda em condições trágicas”, sentenciou.

A morte

José Carlos Mata Machado era uma liderança do movimento estudantil em Belo Horizonte, presidindo o Centro Acadêmico Afonso Pena, da Faculdade de Direito da UFMG. Ele também era militante da esquerda católica e atuou pela Ação Popular (AP) e pela Ação Popular Marxista-Leninista (APML). Machado foi morto junto com outro companheiro de militância, Gildo Lacerda.

Ele havia sido preso durante um congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) em São Paulo, enquanto Gildo foi detido em Salvador, na Bahia. Ambos foram levados à capital pernambucana, onde foram mortos sob tortura. À época, a versão do regime militar apontava que eles haviam sido mortos por outro militante, que fugiu após um tiroteio.

De acordo com a nota oficial na época, Mata Machado e Gildo foram baleados na avenida Caxangá por um homem chamado Antônio. Ele teria atirado após desconfiar da presença de policiais à paisana. O episódio ficou conhecido como "Teatro de Caxangá". A versão, no entanto, foi considerada falsa pela Comissão Nacional da Verdade.

Os restos mortais de Machado foram encontrados no início da década de 1990, em uma vala clandestina em Perus, no interior de São Paulo. Todos os ossos do crânio estavam quebrados, conforme apontado pela defesa. A morte de Mata Machado só foi reconhecida pelo Estado em 1995, com a Lei 6.683/95.

“Não foi dado ao cônjuge da autora a condição de morto, muito menos de vivo, foi-lhe emprestado um status diverso, semelhante às almas do purgatório de Dante, o de 'desaparecido’”, considerou a defesa da família de Machado na petição da ação de indenização.