Trinta crianças aguardam por um transplante pediátrico em Minas Gerais. A maioria delas — 93% — espera pela doação de um rim para poder retomar as atividades comuns à sua faixa etária. Em 2025, até o momento, foram realizados 33 transplantes no estado, segundo o MG Transplantes. Apesar de a fila de espera parecer pequena, a dificuldade para que uma criança seja contemplada é maior do que a enfrentada por um adulto, já que uma série de fatores precisa ser considerada para que o procedimento possa acontecer.

Há um ano, Alana Vitória, de 5 anos, está na fila de espera por um transplante. Ao lado da mãe, Olívia Pedroso, de 47, ela deixou a cidade de Cássia, no Sul de Minas Gerais, para realizar tratamento de hemodiálise na Santa Casa de Belo Horizonte. "Em 12 de junho fez um ano que aguardamos pelo tão esperado transplante, mas ainda não conseguimos", diz a familiar da menina.

Na Santa Casa de BH — unidade de saúde onde Alana faz o tratamento — o número de transplantes renais pediátricos está baixo. Em 2024, 14 crianças foram transplantadas, enquanto, neste ano, até o momento, apenas duas.

O diretor do MG Transplantes, Omar Lopes Cançado, explica que o transplante pediátrico é "mais complexo e mais difícil". "O dificultador principal do transplante renal pediátrico é que não depende apenas do tempo de espera na fila, que funciona basicamente como critério de desempate. É muito mais importante a compatibilidade entre doador e receptor e a compatibilidade anatômica. Crianças muito pequenas não conseguem, por exemplo, receber um rim muito grande. Logo, tem que haver compatibilidade de tamanho e imunológica", afirma.

Outro fator que dificulta, conforme explica Cançado, é que a morte encefálica não é comum em crianças — condição mais frequente em adultos — e é necessária para que a doação de órgãos aconteça. Quem corrobora com a análise é a chefe da unidade de nefrologia pediátrica do Centro de Nefrologia da Santa Casa de Belo Horizonte, Maria Goretti Moreira.

Para ela, os baixos números de transplantes renais pediátricos têm "cunho multifatorial. "Acreditamos que uma das principais razões é a redução de doações, tanto de doadores vivos como de doadores falecidos. Atualmente, a oferta de rins de doadores falecidos é insuficiente para atender à demanda. E assim, a lista de espera pelo órgão só cresce".

A doutora em Ciências da Saúde da Criança e do Adolescente pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) aponta que a pandemia de Covid-19 teve um "impacto negativo considerável". "Provavelmente porque houve medo por parte das famílias, que pensavam na logística do transplante e nos riscos. Devemos considerar ainda as nossas desigualdades regionais, o que gera disparidade de acesso ao transplante", afirma.

Transplante: o melhor tratamento

Em uma casa de apoio no bairro Padre Eustáquio, na região Noroeste de Belo Horizonte, Alana fica com a mãe de segunda a sexta-feira. Aos fins de semana, elas viajam até a cidade natal. A mãe da menina, Olívia, conta que sonha com a realização do transplante na filha, pois tem preocupação "com relação à defasagem" no desenvolvimento da criança.

"A gente espera pelo transplante, pois vai proporcionar qualidade de vida. Ela vai poder brincar, aproveitar junto com outras crianças, sem falar na parte da saúde, que é o que nos deixa mais preocupados", diz Olívia.

A preocupação da mãe com a saúde da filha é justificada, conforme explica Maria Goretti. "A diálise deve ser feita durante o menor período de tempo possível devido aos seus riscos. Pacientes pediátricos em tratamento dialítico têm dificuldade para crescer, há atraso do desenvolvimento, alterações neurocognitivas, comprometimento dos ossos e ainda risco cardiovascular muito aumentado, podendo desenvolver hipertensão arterial, hipertrofia ventricular e calcificações vasculares. O melhor tratamento para as crianças e os adolescentes é o transplante renal".

O problema renal enfrentado por Alana também afeta sua mobilidade. "O problema ósseo faz com que isso aconteça. Ela tem feito fisioterapia e acompanhamento com fonoaudióloga", conta Olívia.

Longe de casa

Alana está a quase 400 km de distância de sua casa. Ela retorna à cidade natal apenas aos fins de semana. Ficar longe da família é algo que a pequena sente, como conta a mãe. "Aqui em BH estamos longe dos nossos. Não é fácil. A Alana sente falta do convívio diário com o pai, porém meu marido não consegue vir aqui aos fins de semana por conta dos compromissos de trabalho. O que mais temos é esperança de que logo o transplante vai acontecer, voltaremos para nossa casa e nossa vida voltará ao normal".

Apesar de estar na fila pelo transplante há um ano, Alana faz tratamento em BH há dois anos e seis meses. "Peço a Deus para que as pessoas se sensibilizem e sejam doadoras. Um doador pode salvar muitas pessoas. Espero em Deus que tudo dê certo".

Doe órgãos

"Temos dez vezes mais chance de precisar de um transplante do que de ser doador. Por isso a importância das famílias conversarem sobre o assunto", alerta o diretor do MG Transplantes, Omar Lopes Cançado.

A orientação é para que a pessoa manifeste à família o desejo de ser doadora de órgãos, pois, atualmente, mesmo que alguém tenha esse desejo, a doação só é permitida com o consentimento familiar, depois de comprovada a morte encefálica.

Para que mais pessoas se tornem doadoras, Maria Goretti avalia que "seria de grande valia incluir o tema nas escolas, fazer campanhas específicas sobre o transplante pediátrico, mostrar depoimentos de pais que autorizaram a doação e de famílias de crianças transplantadas, mostrar o impacto positivo do transplante no paciente, na família e na comunidade, combater os mitos e tabus explicando claramente o que é morte encefálica e como ela é confirmada, mostrar que a doação é segura para o doador vivo, reforçar que a distribuição de órgãos é regulada por lei e não depende de dinheiro ou status social, envolver a comunidade para que a decisão não dependa só do momento de luto e usar mídia para alcançar públicos diferentes".

Dados sobre transplante pediátrico em Minas:

  • 2025: 33 transplantes pediátricos até o momento
  • 2024: 115 transplantes pediátricos total

Fonte: MG Transplantes