O presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Agostinho Patrus (PV), afirma que trabalhará em uma emenda para que parte do acordo do governo de Minas com a Vale seja destinada ao desenvolvimento de uma vacina contra a Covid-19 pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A destinação do recurso ainda precisa ser aprovada pelo deputados estaduais. A expectativa de Patrus é que a emenda esteja formalizada até o começo de maio, quando os detalhes do acordo com a mineradora serão discutidos na Casa. Se a emenda for aprovada, ele diz esperar que o recurso chegue à universidade ainda no primeiro semestre deste ano.
Segundo a reitora da Federal mineira, Sandra Goulart, são necessários R$ 30 milhões para que os próximos testes do imunizante, considerado um dos mais avançados no processo pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), avancem e ele esteja disponível em 2022. Em reunião dos deputados com a reitora na manhã desta quarta-feira (14), o presidente da Casa disse que o recurso deverá ser garantido pelo acordo com a Vale, que soma quase R$ 38 bilhões.
“Vamos incluir, entre as obrigações que a Vale terá que cumprir, o repasse dos valores necessários para o desenvolvimento e produção dessa vacina. A UFMG terá o recurso ainda neste ano. Espero que a emenda seja assinada pelos 76 deputados desta Casa”, disse. O dinheiro é necessário para a finalização das fases um e dois dos testes, mas a fase três, que envolve testagem em massa em humanos, demandará mais recursos no próximo ano. Patrus indica que novos montantes serão alocados para a pesquisa na Lei Orçamentária para 2022, a ser discutida pela assembleia ainda neste ano. A própria universidade é incapaz de patrocinar a pesquisa inteiramente, de acordo com Goulart, pois sofrerá um corte de quase 19%, ou R$ 40 milhões, no orçamento de custeio neste ano.
A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) também afirma estar em diálogo com a reitoria da UFMG para avaliar uma possível ajuda financeira, que ainda não detalhou. Na última semana, a reitora se reunuiu com deputados federais, por intermédio do deputado Diego Andrade (PSD-MG), líder da bancada mineira e da maioria na Câmara dos Deputados, e eles também sinalizaram apoio à pesquisa. Caso parte dos R$ 30 milhões surja de outras fontes, segundo Agostinho Patrus, a ALMG deve completar a quantia.
Cerca de R$ 300 milhões podem ser necessários para teste em massa
Até então, o projeto de desenvolvimento do imunizante do CTVacinas recebeu cerca de R$ 4 milhões do governo federal, explica Ana Paula Fernandes, professora da Faculdade de Farmácia e pesquisadora do CTVacinas. A quantia, ela detalha, não foi maior porque o grupo já tem parte da equipe e da estrutura necessária para o trabalho. Quando chegar à fase três dos testes, a soma necessária pode chegar a R$ 300 milhões, segundo as estimativas do MCTI, pois será necessário vacinar dezenas de milhares de voluntários. “É um caro que sai barato, porque é um investimento necessário. O Brasil ter a cadeia de produção da vacina do começo ao fim é um passo gigantesco”, pontua Fernandes.
Os R$ 30 milhões que são demandados atualmente são necessários para várias etapas do processo, exemplifica a pesquisadora: “Precisaremos de cerca de 300 voluntários, produzir um lote piloto da vacina, que tem um custo, contratar laboratório para fazer mais teste em animais. E tudo isso precisa de autorização da Anvisa, com um dossiê completo do que foi feito desde o início do desenvolvimento da vacina. Temos, inclusive, que contratar equipe para fazer toda a documentação para começar os testes clínicos (com pessoas)”. Hoje, cerca de 30 profissionais atuam na pesquisa, entre estudantes da graduação ao pós-doutorado e professores.
Outra ambição do CTVacinas é construir um prédio próprio, em um terreno já doado nas cercanias do Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-TEC). O projeto executivo e arquitetônico do local foi feito, segundo Fernandes, e a construção está orçada em torno de R$ 80 milhões, valor que ela diz poder ser negociado com o MCTI e com o governo de Minas.
“Ele estaria pronto para funcionar em dois anos. Você pode imaginar que, dele, vão sair várias vacinas, o que será uma economia para todo o país, tendo em vista o custo para o desenvolvimento dos imunizantes vai ser reduzido no longo prazo. Hoje, precisamos de R$ 30 milhões, mas se tivéssemos essa estrutura, o custo seria reduzido enormemente”, completa Fernandes. Ela explica que a ideia é utilizar a estrutura para que o próprio CTVacinas possa produzir lotes-piloto de imunizantes para futuros testes.
Como funciona a vacina da UFMG
Segundo Goulart, a produção industrial do imunizante deve ser realizada pela Fundação Ezequiel Dias (Funed), com a qual a Federal está em negociação. “A UFMG faz pesquisa e testa, mas depois tem que entregar a vacina para uma empresa ou para uma entidade pública. É o que a Oxford fez com a AstraZeneca”, disse a reitora, na reunião com a ALMG. Ela lembrou a vacina contra leishmaniose canina desenvolvida pela universidade na década passada, pela qual a UFMG ainda recebe royalties.
Ela lembrou que há possibilidade de vacinas contra a Covid-19 precisarem ser aplicadas anualmente, como é o caso da vacina contra a gripe, especialmente em meio ao surigmento de novas variantes do coronavírus, daí a necessidade de o país deixar de depender de insumos importados. “Por que os EUA têm excesso de vacinas? Em maio de 2020, eles fizeram uma operação que injetou US$ 18 bilhões para que os EUA tivessem toda a cadeia de produção de vacinas no próprio país. É uma necessidade que temos para o nosso país”, questionou a reitora.
As sete vacinas em desenvolvimento na UFMG:
- Spintec: a opção mais avançada nos testes utiliza a tecnologia quimera proteica, em que uma bactéria modificada geneticamente produz proteínas do coronavírus para que o corpo as reconheça e combata. Utiliza recursos do MCTI e do CNPq.
- Vacina intranasal: a segunda opção com testes mais avançados, segundo a reitora da UFMG, não precisa ser injetada. Ela usa o vírus H1N1 modificado e também pode proteger contra a gripe. Utiliza recursos do MCTI, do CNPq e da Fiocruz.
- Vacina de DNA: produzida por meio de genes que estimulam anticorpos, também está em avanço, com composto finalizado. Utiliza recursos do MCTI e do CNPq.
- Vacina de BCG+Covid-19: o composto ainda está sendo elaborado, mas espera-se que ele proteja contra tuberculose e Covid-19 ao mesmo tempo. Utiliza recursos do CNPq.
- Vacina de RNA Mensageiro: tecnologia parecida com a da vacina da Pfizer, tem a vantagem de ser fácil de adaptar caso haja mutações do vírus. Utiliza recursos do MCTI e do CNPq.
- Vacina com vírus da varíola: é baseada em alterações genéticas do vírus MVA, da varíola. O composto está finalizado. Utiliza recursos do MCTI e do CNPq.
- Vacina com adenovírus: utiliza um adenovírus, causador de doenças respiratórias, como a vacina da AstraZeneca. Já está em teste com camundongos. Utiliza recursos do MCTI e do CNPq.
Esta matéria foi atualizada às 17h15.