Funcionária de uma lanchonete no município de São Gotardo na região do Alto Paranaíba, a médica cubana Sunia Maria de La Torre Garcia, 50, espera há mais de três anos uma publicação no diário da União que alerte para a abertura de inscrições para o Revalida. O exame teórico para validação de diplomas de medicina obtidos no exterior obrigatoriamente teria que ser feito a cada seis meses, entretanto em dezembro deste ano ele será aplicado pela primeira vez desde 2017. A indisponibilidade do Revalida após o fim do programa Mais Médicos obrigou que milhares de cubanos se distanciassem da medicina para procurar empregos informais e com salários extremamente baixos se comparados com os da categoria.

Esta história, que é a de Sunia Maria de La Torre García, se repete com cerca de cem outros médicos cubanos residentes em Minas Gerais que, após o anúncio da aplicação do exame no mês de dezembro, se desdobram com salários-mínimos para guardar o necessário à taxa de inscrição, às etapas da prova e ao deslocamento necessário para municípios onde o teste será aplicado. Em linhas gerais, apenas a taxa de R$ 330 cobrada pela primeira etapa do Revalida já causará um rombo no orçamento de quem depende de contados R$ 1.045 recebidos por mês para garantir o pagamento de recursos básicos como alimentação, moradia, água e luz.

Há três anos dependendo do salário mínimo para pagar aluguel e alimentação que divide com uma colega, Sunia Maria de La Torre García ainda não sabe como custeará as taxas do Revalida, sua única esperança para retornar à medicina no Brasil. “Quando acabou meu contrato com o Mais Médicos, comecei a trabalhar informalmente em lanchonetes ou vendendo produtos de catálogos para ter pelo menos uma renda mínima, pagar alimentação. Agora estou trabalhando em uma lanchonete também, o salário mínimo não dá nem para o aluguel que divido com uma colega”, detalha ela. A situação da cubana é principalmente complicada porque ela não pôde ser contemplada pela medida provisória que garantiu a alguns médicos do antigo programa a possibilidade de exercerem a profissão pelos próximos dois anos, como aconteceu com Yurisel Brown Ciprian.

A cubana, ex-trabalhadora de uma lanchonete também em São Gotardo, recebeu no mês de agosto uma convocação para integrar o Médicos pelo Brasil por um período de dois anos. O programa criado em dezembro do ano passado pretendia ampliar a oferta de médicos em regiões vulneráveis do país, e contempla também o retorno de cubanos que atuaram pelo Mais Médicos até novembro de 2018 quando o acordo entre os países acabou reincidido. Sunia Maria de La Torre García tinha tido seu contrato com o programa rompido pouco tempo antes da recisão entre Cuba e Brasil e, portanto, não cumpre os requisitos exigido pelo Médicos pelo Brasil. “Eu e outros colegas na mesma situação estamos com grandes incertezas. O Revalida traz esperança, mas nós precisamos dar um jeito de pagar. O problema é que não temos um salário que corresponde”, afirma ela. 

Apesar de viver um outro cenário após ter retomado seu posto como médica em uma unidade básica no município de Medeiros, a 145 quilômetros de São Gotardo, Yurisel preocupa-se com colegas que não conseguiram como ela retornar ao trabalho. “Tenho amigos que não conseguiram entrar no programa. Este trabalho que apareceu é de grande ajuda para mim, sem ele eu não poderia bancar o Revalida com a taxa de inscrição, o valor da prova, o deslocamento… Uma série de quantias que eu não teria condições de arcar”. Reincorporada pelo Médicos pelo Brasil, ela fará o Revalida em dezembro.