Da negligência que levou ao desabamento do viaduto Batalha dos Guararapes em plena avenida Pedro I, na região de Venda Nova, duas vidas perdidas sentidas diariamente pelas famílias. O clima de Copa do Mundo no dia 3 de julho de 2014 bruscamente interrompido pela tragédia que abalou Belo Horizonte, até hoje sem reparação e nenhum culpado condenado judicialmente.

E depois de seis anos, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) solicitou à Justiça o bloqueio de R$ 30 milhões em bens das empresas Cowan e Consol, responsáveis pelo projeto da estrutura e as intervenções, além de valores entre R$ 100 mil e R$ 250 mil das pessoas físicas envolvidas nas obras – funcionários públicos da prefeitura, ligados à Sudecap, e engenheiros estão incluídos no pedido.

A ação civil pública, que foi encaminhada no fim de abril à 3ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública Municipal da Comarca de Belo Horizonte, tem como objetivo reparar os prejuízos, além de garantir o pagamento de multas e danos morais coletivos provocados pelo desabamento do viaduto. 

"As empresas, os engenheiros e os servidores da Sudecap geraram prejuízo aos cofres públicos por não terem seguido normas de engenharia adequadas à construção, desde a fase de planejamento até a fiscalização da sua execução", justifica o MPMG. Conforme o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), o processo aguarda um parecer do juiz sobre quais serão os próximos passos.

Ao custo de quase R$ 14 milhões dos cofres públicos, a prefeitura não recebeu de volta nenhum centavo pelos erros na construção do viaduto. Em nota, a prefeitura declarou que a questão "está sendo analisada na Segunda Vara dos Feitos da Fazenda Pública Municipal em medida cautelar para a produção antecipada de perícia para a verificação da causa do desabamento do viaduto". Já a Justiça não respondeu sobre o andamento da indenização.

Ainda em 2016, MPMG, Consol e Cowan tentaram fechar um acordo sobre a questão, com o repasse de quase R$ 13 milhões ao Executivo municipal. Porém, mesmo depois de três anos, não chegaram a uma conclusão. As empreiteiras foram procuradas, mas não responderam aos questionamentos da reportagem.

Nenhum culpado até hoje

Após quase um ano de investigações, a Polícia Civil concluiu em 2015 que falhas no projeto técnico do viaduto levaram à construção das alças de sustentação sem a quantidade mínima de aço. Minutos após operários retirarem uma estrutura metálica de sustentação usado na obra, todo o concreto veio a abaixo. No momento, passavam um carro e um micro-ônibus da linha suplementar 70 – os motoristas dos veículos, Charlys Frederico Moreira, na época com 24 anos, e Hannah Caldeira, 24, morreram na hora. 

Meses depois, 11 pessoas foram denunciadas pelo MPMG por envolvimento na queda do viaduto – entre eles, estavam um ex-secretário municipal, um diretor de Obras da Sudecap, além do supervisor da obra do viaduto e os profissionais ligados às empresas que realizaram o projeto e a execução das intervenções.

Todos respondem por crime de desabamento, agravado pelo desastre ter provocado lesão corporal e morte – juntas, as penas podem levar a até oito anos de reclusão. Até hoje, nenhum dos envolvidos chegou a ser condenado. O processo criminal, que começou a tramitar em agosto de 2014 e corre em segredo, está há um ano na mesa do juiz aguardando uma sentença.

De acordo com o TJMG, o juiz responsável pelo caso precisou se afastar por motivo de saúde em duas ocasiões, ao longo do último ano. Apesar da designação de juízes de direito auxiliares para atuar na 11ª Vara Criminal de Belo Horizonte, o processo sobre o desabamento ainda não foi sentenciado. "O TJMG reconhece que se trata de um episódio grave e doloroso, e que o caso, de grande complexidade, receberá a atenção devida do Judiciário", finaliza a nota.

Sobre o desastre, a Sudecap declarou que prestou todas as informações e esclarecimentos solicitados pela Justiça.

'Obra sem necessidade'

À época, o órgão lembrou que ocorreram erros até durante a fiscalização das obras, que faziam parte de um pacote de R$ 460 milhões para a implementação do Plano de Mobilidade do BRT para a Copa de 2014. Todo o projeto foi executado durante a gestão do ex-prefeito Marcio Lacerda (sem partido). 

Já o atual governo disse, em nota, que estudos apontaram que a estrutura não é "uma obra prioritária" e os semáforos implementados nos cruzamentos da região onde o viaduto caiu "vem atendendo de forma adequada ao movimento atual de veículos".