Sacré-Coeur

Após venda para grupo de SP, escola católica tradicional de BH acaba com bolsas

Fim do benefício para alunos carentes revoltou pais e alunos, que protestaram em frente ao colégio SEB Sagrado, antigo Sagrado Coração de Maria, na última sexta-feira (27)

Por José Vítor Camilo
Publicado em 30 de outubro de 2023 | 16:29
 
 
 
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Eternizado na música "Rua Ramalhete" do músico mineiro Tavito, que cita o "muro do Sacré-Coeur", o tradicional colégio católico Sagrado Coração de Maria, localizado no bairro Serra, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, foi vendido no fim de 2022 para um grande grupo paulista. Na época, tanto a antiga direção quanto o novo administrador da instituição prometeram que os estudantes que tinham bolsas teriam o benefício mantido até que eles concluíssem o ensino médio. Porém, passado um ano, as famílias acabaram surpreendidas na última semana com a notícia de que a promessa não seria cumprida, abalando os alunos bolsistas e motivando um protesto realizado na tarde da última sexta-feira (27 de outubro) na porta da instituição.

Nesta segunda-feira (30), O TEMPO conversou com pais de alunos da escola que, temendo represálias aos filhos, preferiram não se identificar. Segundo um homem que é pai de um dos bolsistas, o anúncio da "venda" para o Grupo Sistema Educacional Brasileiro (SEB) aconteceu por meio de uma live em setembro de 2022. Pouco depois, após rumores sobre a manutenção das bolsas, eles fizeram um abaixo-assinado com mais de 600 assinaturas pedindo a permanência dos alunos bolsistas. Foi então que, em uma reunião no auditório do local, os diretores do instituto e da nova empresa garantiram que as bolsas seriam mantidas.

"Isso levou muita emoção para todos nós da comunidade. Mas, este ano, parte das família recebeu um e-mail com um cadastro para renovação das bolsas, mas, algum tempo depois, fomos surpreendidos com uma nova mensagem comunicando que o SEB Sagrado não manteria as bolsas, mas que estariam fazendo parcerias com algumas escolas filantrópicas para poder receber estes alunos", explicou.

Apesar da "solução" com a transferência para outras escolas ter sido apresentada, o problema é que, em algumas delas, os estudantes farão uma prova e só terão direito à bolsa caso consigam passar. "Isso gerou uma questão emocional nos meninos, eles tiveram pouquíssimo tempo para se preparar. Alguns passaram, outros não, o que já é um problema. Mas, além disso, tem todo o impacto que a mudança de escola causa, a mudança de ritmo. Sem falar que alunos de baixa renda, dependendo da distância, até mesmo o transporte e a alimentação podem se tornar um problema", reclama o pai do aluno bolsista.

Outro problema citado pelo pai é com relação à exposição que os estudantes que contavam com bolsa acabaram sofrendo com a situação. "Estão sofrendo bullying na questão social mesmo, gozação sobre a pobreza, falando que não mereciam estar ali. Tem até apelidos sendo colocados por causa disso", detalhou o homem.

A escola, que tem mensalidades que variam de cerca de R$ 1.500 no ensino fundamental até R$ 2.700 no ensino médio, ainda segundo os pais, teria atualmente cerca de 600 estudantes, sendo apenas 30 deles bolsistas.

Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do Grupo SEB informou, por nota, apenas que "não irá se manifestar". O grupo pertence ao empresário libanês naturalizado no Brasil Chaim Zaher. Com um patrimônio de cerca de R$ 3,5 bilhões, ele aparecia, no fim de 2022, como o 1º lugar na lista da Forbes de bilionários brasileiros do setor da educação. No ranking geral de bilionários, ele aparece na 103ª posição.

As chamadas "escolas confessionais", aquelas filantrópicas ligadas a alguma entidade religiosa, contam com uma legislação que prevê a isenção no imposto de renda. O TEMPO procurou o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino no Estado de Minas Gerais (Sinep), que informou que, após a venda, o colégio SEB Sagrado deixou de ser "confessional".

Mãe pretende tirar as filhas da escola

Mãe de duas meninas que estudam na escola sem bolsa desde antes da venda para o grupo paulista, uma mulher que também não quis ser identificada garante que pretende tirar as filhas da escola após o episódio.

"O Sagrado Coração de Maria sempre foi uma escola acolhedora, com uma proposta de formação humana e ética de seus alunos. Sempre existiu na instituição essa preocupação social, com recursos direcionados para filantropia, com bolsas para vários alunos. O que mais me incomodou nesse processo foi a falta de transparência por parte do Grupo Seb e o descumprimento da promessa feita, inclusive registrada em live e numa reunião com centenas de pais de alunos de que manteriam as bolsas", reclama.

"Não temos bolsas de estudos e nem desconto na escola, mas nos solidarizamos com a causa por uma questão de empatia, por acreditar nos valores humanos que o Sagrado sempre disseminou entre a comunidade. Não é à toa que minhas filhas estão mudando de escola a partir do ano que vem", finalizou a mãe.

O Instituto Sagrado Coração de Maria, antigo mantenedor do colégio, foi procurada, mas não se posicionou até a publicação da reportagem.

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