Alerta

Com medo de falta de insumos, médicos descrevem Minas à beira do colapso

Profissionais de saúde relatam cenário mais grave do que no pico da pandemia em 2020 e reforçam necessidade de população se cuidar neste momento

Por Gabriel Rodrigues
Publicado em 18 de março de 2021 | 17:18
 
 
 
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Embora ainda não viva uma falta generalizada de insumos para internar pacientes com Covid-19, Minas Gerais registra filas de espera e escalada dos preços para obtê-los em algumas regiões e se aproxima do colapso da assitência, segundo o Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Minas Gerais (COSEMS/MG). Médicos que atuam no combate à doença avaliam que a onda atual é mais grave do que o pico de casos de meados de 2020 e dizem se preparar para dias ainda mais duros. 

“Se não conseguirmos conter a proliferação do vírus, acho que, no máximo, em dez, 15 dias, teremos mais problemas. Hoje, a falta de insumos não é generalizada, mas pontual, como foi nas cidades de Januária e de Mangas, no Norte, nesta semana. Entre agosto e outubro do ano passado, tivemos uma fase crítica para adquirir medicamentos do kit de intubação por causa dos fornecedores, e isso tinha voltado à normalidade. Agora, começamos a perceber uma diminuição desses insumos, desta vez em função do número de casos acelerando”, diz o presidente  do COSEMS/MG, Eduardo Luiz da Silva. 

Ele afirma que mais medicamentos foram adquiridos por meio do Ministério da Saúde e da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), contudo não estima até quando ele serão o bastante. Associações que reúnem profissionais de saúde, hospitais e operadoras de planos de saúde temem esgotamento dos remédios em todo o Brasil nos próximos 20 dias, segundo coluna da jornalista Mônica Bergamo.

A Central dos Hospitais, que representa 543 instituições privadas no Estado, detalha que a demanda por oxigênio, por exemplo, cresceu 30% com a onda de novas internações em UTIs. Por ora, ela diz não ter conhecimento de risco de falta do produto em Minas, porém a compra de outros insumos necessários para intubação têm exigido que os hospitais entrem em uma lista de espera. Além disso, o valor de alguns deles, como o sedativo midazolam, aumentou sete vezes, destaca a entidade. 

A Santa Casa Nossa Senhora das Mercês, em Santa Bárbara, na região Central, chegou a pedir doação de cilindros de oxigênio a cidadãos que tivessem o item em casa. “Estamos com problema de compra de sedativos e analgésicos para intubação. Nesta semana, melhorou um pouco, porque o hospital encontrou um lote para comprar, a preço de ouro. A situação pelo interior está dramática”, relata Marconi Moura, diretor do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais (Sinmed-MG).

De acordo com a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), o estoque de medicamentos está sob controle e o nível de abastecimento é monitorado diariamente, sem sinal de falta. A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) também afirma que está abastecida. 

Médicos relatam agravamento da pandemia na linha de frente da pandemia

O momento atual da pandemia em Minas é um cenário inédito para os médicos mineiros, contam profissionais. Com uma média móvel de novos casos em escalada no Estado e no Brasil, a transferência de pacientes para outros hospitais e municípios se tornou mais difícil e algumas instituições recorrem a improvisos para cuidar dos doentes. 

“Atingimos 100% de ocupação, temos 15 leitos de CTI, ontem tínhamos 16 pacientes, com um leito extra, e continuam chegando pessoas. Estamos improvisando leitos e locais de atendimento, usando um fluxo de oxigênio para duas pessoas. O vírus está agressivo e contaminando pessoas mais jovens. Temos um paciente de 25 anos, sem comorbidades, intubado. O ideal é que BH, que é referência, uma cidade maior, nos ajudasse, mas ela também está sobrecarregada”, descreve Marcos André, diretor técnico do Hospital Margarida, em João Monlevade.

Nessa terça-feira (16), o governador de Minas, Romeu Zema (Novo), afirmou que, pela primeira vez, o Estado não tem capacidade de transferir pacientes de uma macrorregião a outra, pois todas estão em risco. A ocupação de leitos de UTI só não supera ou se aproxima de 80% no Jequitinhonha. Um dos principais obstáculos para o Estado abrir mais leitos, neste momento, é a falta de profissionais especializados em atendimento de alta complexidade, segundo o governo estadual. A Fhemig abriu mais de 70 editais de contratação ao longo da pandemia e 14 não tiveram retorno.

“Não se pode formar profissionais de forma imediata. Para trabalhar em terapia intensiva, um médico precisa de anos de estudo. Mas é muito mais importante, agora, tentar reduzir o número de novos casos para diminuir a demanda do que correr atrás de aumento de leitos, que também são necessários”, avalia o presidente da Associação Médica de Minas Gerais (AMMG), Fábio Augusto Guerra. A Onda Roxa, decretada para todo o Estado até o dia 31 de março, tenta reduzir a circulação de pessoas. 

A médica Janice Tomazi, representante da AMMG em Itabira, resume em uma cena o momento que tem vivido no consultório nas últimas semanas: “O cenário mudou muito. Eu atendo pacientes com Covid-19 todo dia. Ontem, vi uma das cenas mais fortes para mim na pandemia. Recebi um paciente que trazia o filho de 9 anos em uma mão e o outro, de três meses, no colo. A mãe do bebê estava internada com a doença e o avô estava sendo enterrado naquele momento. O pai e o mais velho estavam doentes também e o pai não tinha mais com quem deixar os meninos”.

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