Agendada para acontecer na manhã de quinta-feira (27), a ação para reintegração de posse no bairro Cidade de Deus, em Sete Lagoas, na região Central de Minas Gerais, foi adiada por determinação judicial na noite dessa quarta-feira (26). A operação para despejo de moradores do espaço que pertence à Prefeitura de Sete Lagoas irá ocorrer, segundo cronograma, na segunda-feira (31).

Hoje, a ocupação popular, nomeada "Cidade de Deus", abriga cerca de cem famílias e 97 crianças. Opções de abrigo apresentadas pelo município depois da emissão da ordem de despejo são lidas como inadequadas pelos moradores, como esclarece a arquiteta Luíza Cabral, ligada à luta pela manutenção da ocupação.

"Hoje, a ocupação é muito organizada, e moradores construíram uma escola, uma cozinha comunitária… E, nesse processo de reintegração de posse, a Prefeitura de Sete Lagoas não ofereceu a eles nenhuma opção viável. Os únicos espaços para onde eles podem ir, de acordo com a prefeitura, são uma escola, que foi oferecida pelo município, ou um abrigo para pessoas em situação de rua que, aliás, já está cheio. Outro ponto é que se trata de um espaço que recebe usuários de drogas, e não é, portanto, adequado para crianças". 

O imbróglio em torno do terreno no bairro Cidade de Deus começou recentemente, quando a ocupação estava prestes a completar seu primeiro ano de existência. De acordo com a arquiteta, a área é afastada das regiões mais centrais de Sete Lagoas e não era usada há cerca de duas décadas. "O terreno pertence à prefeitura, e ali no bairro Cidade de Deus são muitas as residências construídas para programas de habitação. O lote da ocupação não era usado, exceto quando a prefeitura decidia colocar entulhos de obras ali. Por isso, os moradores foram para lá", detalha.

Imóvel sem destinação

Publicada na noite dessa quarta-feira (26), às vésperas do despejo, a determinação judicial que adiou a ação partiu de um pedido da deputada Andréia de Jesus (PSOL). Ela argumentou que a reintegração foi marcada com o curto prazo de 15 dias de antecedência, em data que antecedeu, por pouco, o aniversário de um ano da ocupação. Por meio da ordem, a juíza Wstânia Barbosa Gonçalves determinou que oficiais de justiça devem comparecer à ocupação para lavrarem um relatório com informações sobre o espaço – número de residências, se há banheiros, quantidade de crianças, fornecimento de energia elétrica e outras.

Quanto à reintegração de posse, limitou-se a dizer que haverá mediação extrajudicial marcada para a próxima segunda-feira (31), e que o desejo deverá se iniciar já com a audiência. Quanto à argumentação de que o lote, antes da ocupação, não cumpria sua função social, a magistrada declarou que “não é admissível a inversão de valores, sob o pretexto de que o imóvel estava sem destinação, permitindo a invasão do patrimônio público na tentativa de fazer justiça com as próprias mãos”.

Resposta

Questionada, a Prefeitura de Sete Lagoas informou por meio de nota nessa quinta-feira (27) que nos autos do processo para a reintegração de posse foi demonstrado “que parte do terreno não pode receber qualquer tipo de habitação por se tratar de área de preservação permanente”< e confirmou que a retirada das famílias que ali residem acontecerá na próxima segunda-feira.

De acordo com o município, foi oferecido a esses moradores abrigo na Escola Municipal Juca Dias, situada na região da ocupação. "Tal escola, que oferece espaços dignos como cozinha, cantina, banheiros e salas amplas e arejadas, servirá de abrigo provisório até que sejam totalmente reformadas as dependências do projeto Acolher", disse em nota. Ainda segundo a administração, as famílias da ocupação "Cidade de Deus" não possuem condições dignas de habitações. "Eis que as ligações de energia elétrica são clandestinas, não possuem ligações de água potável e saneamento básico", informou – leia abaixo o documento na íntegra.

Nota de posicionamento da Prefeitura de Sete Lagoas:

- A reintegração de posse da área pública foi determinada por decisão judicial. Nos autos do processo também está demonstrado que parte do terreno não pode receber qualquer tipo de habitação por se tratar de área de preservação permanente. O ato deveria ser cumprindo nesta quinta-feira, 27 de maio, mas a mesma Vara da Fazenda Pública e Autarquias decidiu suspender sua decisão propondo uma audiência de mediação marcada para a próxima segunda-feira, 31 de maio. A decisão seguiu sugestão de um desembargador do TJMG.

- Vale ressaltar que a decisão judicial anteriormente proferida nunca tratou de despejo, e sim de reintegração de posse. A ação foi proposta há quase um ano e somente agora seria cumprida. Antes, houve o devido cadastramento das famílias ali estabelecidas e várias reuniões para tentar resolver o conflito de forma pacífica.

- A Prefeitura propõe alojar todas as famílias oferecendo incialmente as dependências da Escola Municipal Juca Dias, situada na região da ocupação. Tal escola, que oferece espaços dignos como cozinha, cantina, banheiros e salas amplas e arejadas, servirá de abrigo provisório até que sejam totalmente reformadas as dependências do projeto Acolher.

- Por exigência legal, o Município, sob qualquer gestão, é obrigado a reivindicar a posse de qualquer área pública ocupada irregularmente.

- O Município planeja a implementação, em parte da área em questão onde não existe a lei de preservação, de programa habitacional consistente, dentro da legalidade, observando propiciar à população necessitada condições mínimas de habitação, com energia elétrica, água potável e saneamento básico. As famílias da ocupação, devidamente cadastradas serão priorizadas, observando os critérios legais exigidos pelas normas de assistência social. Hoje as famílias ali estabelecidas não possuem condições dignas de habitação, eis que as ligações de energia elétrica são clandestinas, não possuem ligações de água potável e saneamento básico.

- Vale ressaltar, ainda, que é dever do Município zelar pela preservação de seu meio ambiente e propiciar um crescimento urbano sustentável, dando à sua população condições dignas de moradia, o que será providenciado através de políticas públicas consistentes e dentro da legalidade, a curto, médio e longo prazos.

- Em julho de 2019, a Prefeitura de Sete Lagoas e a Caixa Econômica Federal entregaram 500 unidades habitacionais para pessoas cadastradas no programa Minha Casa, Minha Vida. Os imóveis fazem parte do condomínio Lagoa Grande II, localizado na região do bairro Cidade de Deus. Agora, estão abertas as inscrições em outra modalidade do Minha Casa, Minha Vida para a distribuição de mais 500 casas. As residências serão construídas no condomínio Lagoa Grande I, também na região do bairro Cidade de Deus. Além disso, o Prefeitura possui o Departamento de Regularização Fundiária, que em dois anos garantiu escritura para mais de duas mil famílias que moram em diversos bairros, mas não tinham seus imóveis regularizados.

À disposição para outros esclarecimentos que se fizerem necessários.

Atualizada às 8h39 de 28 de maio de 2021.