Substância anticongelante bastante aplicada em sistemas de refrigeração pelo mundo, o dietilenoglicol não costuma ser usado nas instalações das cervejarias artesanais brasileiras. Além dos riscos de contaminação – mesmo que reduzidos –, o produto tem preço alto se comparado a uma solução de água e álcool etílico – igualmente capaz de manter a cerveja resfriada.
É este o exato ponto defendido tanto por fabricantes quanto pelo presidente da Associação Brasileira de Cervejarias Artesanais (Abracerva), Carlo Lapolli, como forma de deixar os consumidores mais tranquilos.
O uso do dietilenoglicol no refrigeramento de bebidas alcoólicas acendeu o alerta das autoridades e dos clientes das cervejarias ainda na noite dessa quinta-feira (9). Isso, pois, a substância foi encontrada em amostras da cerveja Belorizontina da Backer, que teriam sido ingeridas por pacientes posteriormente internados com grave síndrome nefroneural.
Oito homens são observados em hospitais de Minas Gerais com quadro sério de insuficiência renal e alterações neurológicas. Todos eles teriam consumido a bebida que, por sua vez, teria sido adquirida em supermercados no bairro Buritis, na região Oeste de Belo Horizonte. Assim, os dois lotes que estariam contaminados pela substância foram retirados de circulação.
A utilização dessa substância específica é considerada rara nas instalações para produção artesanal de cerveja no país. Não à toa, assim como outras cervejarias instaladas na capital mineira e nos municípios da região metropolitana, a Backer negou aplicar dietilenoglicol em seus sistemas de refrigeração.
"Acredito que quase a totalidade das cervejarias opta por usar álcool etílico, álcool puro, que não tem nenhum tipo de risco de contaminação se entrar em contato direto com a cerveja. Aliás, a Cervejaria Backer negou utilizar o dietileno na sua fábrica. Essa é uma pergunta que tem que ser respondida", pontuou Lapolli.
Ainda de acordo com alguns produtores de cerveja, sai mais caro optar pela compra de dietilenoglicol ao invés da mistura com álcool. "Nós, por exemplo, não usamos (o dietilenoglicol). Usamos o etanol, que não é tóxico. Os próprios fabricantes de máquinas recomendam o uso do dietilenoglicol, pois é menos corrosivo, e é mais eficiente. É uma coisa muito comum usá-lo, mas não é uma questão de custo. Inclusive é mais caro", explica Herwig Gangl, sócio-proprietário da cervejaria Krug Bier.
'Muito raro de acontecer'
A hipótese de uma contaminação da cerveja por ruptura nos tonéis de armazenamento ainda gera desconfianças entre alguns cervejeiros. Os mecanismos de segurança existentes nos recipientes e o controle rígido na qualidade da bebida seriam responsáveis por evitar quaisquer tipos de encontro entre a substância tóxica e a cerveja.
"A possibilidade de contaminação (por dietilenoglicol) é muito remota. Pra que exista essa contaminação, é preciso que os equipamentos estejam com algum problema. Mesmo usando esse dietilenoglicol, ele não entra em contato com o produto. Teria de furar com uma espessura grande de inox", comenta o proprietário da cervejaria Krug Bier.
O mesmo ponto a respeito da segurança dos materiais empregados nos processos de produção da cerveja é reforçado por Carlo Lapolli. De acordo com o presidente da Abracerva, caso seja confirmada a contaminação acidental da bebida por contato com dietilenoglicol – presente em sistemas de refrigeração – trataria-se, então, de um caso inédito.
"Um vazamento no sistema de refrigeração é muito raro. E quando ele vaza, ele vaza para o isolamento térmico. Um vazamento para dentro do tanque (de cerveja) é muito raro. Particularmente não tenho notícias desse tipo de ocorrido na indústria, (a substância) não tem contato direto com a cerveja. O dietilenoglicol teria que estar em uma concentração muito grande para fazer mal. Como ele é utilizado já bem diluído no sistema de refrigeração, se houvesse um vazamento (a substância) seria diluída nos milhares de litros de cerveja preparados, não teria essa questão de causar dano. É um evento muito raro de acontecer", confirma.
Além disso, há mecanismos para detectar quaisquer casos de vazamentos em tanques, como explica Herwig Gangl: "Usamos (na Krug Bier) um corante no etanol para verificar se houve um vazamento. Isso é um procedimento regular no tanque, que fazemos a cada seis meses. A inspeção nos tanques é recorrente, muito por conta da qualidade do produto".
(Com Wallace Graciano)