No dia em que a Polícia Civil confirmou a morte do sétimo paciente internado com sintomas de intoxicação por dietilenoglicol – substância tóxica encontrada em lotes de cervejas da Backer –, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) confirmou ter aceitado o recurso da cervejaria e reduziu de R$ 100 milhões para R$ 5 milhões o valor máximo para o bloqueio de bens da empresa, medida adotada para garantir reparação às vítimas. No entanto, advogados que defendem familiares dos consumidores intoxicados afirmam que, em fevereiro, após o TJMG determinar o primeiro bloqueio de bens da Backer, apenas R$ 12.260 foram encontrados em uma de cinco contas mantidas pela empresa. As demais estavam vazias.

Antes do escândalo sobre a contaminação das bebidas, a Backer era a maior cervejaria artesanal do país em volume de produção, com quase 800 mil litros mensais, segundo o SindBebidas (Sindicato das Indústrias de Cerveja e Bebidas em Geral de Minas Gerais). Embora a empresa não revele números, a estimativa, de acordo com empresários do ramo, é que o faturamento mensal da marca girasse em torno de R$ 8 milhões. 

Inicialmente, em 14 de fevereiro, a Justiça havia acatado um pedido do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) para bloqueio de bens e móveis atrelados à cervejaria até o limite de R$ 100 milhões. Contudo, a Backer recorreu da decisão por considerar a quantia “exorbitante”. No pedido, a empresa se justificou ao afirmar ser uma “microcervejaria familiar que, em 2018, apresentou lucro líquido de R$ 985.948, 42”.

Ao decidir sobre a redução do valor de bens a serem bloqueados, o desembargador Luciano Pinto, da 17ª Câmara Civil de Belo Horizonte, afirmou que o bloqueio de R$ 5 milhões representa valor razoável e proporcional para assegurar às indenizações. A Backer, por sua vez, afirmou que a decisão vai permitir que a empresa dê suporte ao tratamento médico dos clientes e às famílias. Nas últimas semanas, familiares de vítimas têm cobrado que a cervejaria assuma os custos de despesas hospitalares dos consumidores afetados.

O advogado José Carvalho Miranda, que representa quatro famílias de pacientes intoxicados, denuncia, no entanto, que os valores depositados nas contas da empresa são irrisórios. “Eles estão blindando todos os seus bens. Tem um movimento de esvaziamento patrimonial. Bloquearam R$ 5 milhões, mas foram encontrados pouco mais de R$ 12 mil (nas contas). Eles estão alegando que por causa do bloqueio não prestam apoio, mas o valor que eles têm oficialmente é irrisório”, ressaltou o advogado. 

"É importante perceber que em momento algum a Backer estava impedida de cumprir as decisões judiciais por conta dos bloqueios realizados. Os valores bloqueados até o momento são irrisórios frente à determinação feita pela justiça, sejam os 100 ou os 5 milhões. Mais uma vez, percebe-se que a Backer continua a não prestar atendimento às vítimas e fica procurando justificativas externas para continuar não prestando", afirmou Guilherme Costa Leroy, outro advogado que representa três famílias de vítimas da Backer.

Investigação.

Desde a abertura do inquérito, em janeiro, a Polícia Civil analisa 38 casos suspeitos de intoxicação por dietilenoglicol. Desse total, quatro pessoas teriam sido intoxicadas no final de 2018. Até agora, exames confirmaram a presença da substância no sangue de 11 pacientes. Entre os casos investigados, há sete óbitos. 

A última vítima morreu neste domingo (8), após permanecer internada por 49 dias no Hospital do Barreiro. Segundo familiares, o caminhoneiro Ronaldo Victor Santos, 49, demorou a procurar ajuda médica, temendo perder um dia de trabalho. 

Outro lado.

Backer. A empresa afirmou que o sigilo dos dados contábeis é garantido por lei e que todas as informações foram analisadas pela Justiça. "O sigilo dos dados contábeis de empresas é garantido por lei. Todas essas informações foram prestadas e consideradas pela Justiça na decisão que desbloqueou os bens da empresa para fins de custeio das despesas médicas de clientes e familiares", informou em nota. 

Familiares ainda esperam por auxílio 

O motorista de caminhão Ronaldo Victor Santos, que morreu anteontem com sintomas de intoxicação por dietilenoglicol, era pai de três filhos. Ele estava internado desde 25 de janeiro no Hospital do Barreiro.

Segundo a assessoria que representa a família de Santos, até o fechamento desta edição, nenhum representante da empresa havia procurado a mulher dele para oferecer auxílio. 

A informação de que Santos teria consumido cervejas da Backer só surgiu após a internação do caminhoneiro, quando um amigo dele relatou que o homem comprou a bebida em uma promoção. 

Em nota, a Backer afirmou que entrou em contato com a família e prestará apoio.