Estatísticas elaboradas pela Secretaria Municipal de Saúde apontam para um alarmante aumento na taxa de ocupação dos leitos nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI), que alcançou índices recordes entre domingo (21) e essa terça-feira (23). O crescimento na quantidade de pacientes que necessitam de ventilação mecânica, um recurso específico destes leitos, é a principal preocupação de um grupo de 39 médicos que coordenam alas de cuidado intensivo em hospitais das redes particular e pública de Belo Horizonte. Pertencem a eles as assinaturas em uma carta que está circulando nesta quarta-feira (24) nas redes sociais e em grupos do WhatsApp.
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O documento online traz um apelo à população e aponta que este é o momento mais crítico da ocupação de leitos públicos na capital mineira desde o começo da pandemia. Um levantamento feito pelo grupo de médicos nessa terça-feira (23) indica que o número de pacientes infectados pelo coronavírus e que precisam de ventilação mecânica quadruplicou em apenas um mês.
A quantidade de infectados que necessitam receber atendimento em um leito de UTI mais que dobrou no mesmo período. Além da preocupação com o esgotamento dos leitos, médicos intensivistas têm lidado com a dificuldade na compra dos medicamentos necessários à sedação de pacientes que estão intubados.
“Acompanhamos um aumento constante nas internações nas unidades de terapia intensiva. Cresceu em quatro vezes o número de pacientes que precisam de ventilação mecânica. Nós sabemos que se leitos não tivessem sido abertos recentemente pela Secretaria Municipal de Saúde, nós já teríamos entrado em colapso, que acontece quando os pacientes precisam de ventilação, mas não temos leitos disponíveis. Outra preocupação é com a falta dos medicamentos que são usados para sedação. Os laboratórios que produzem não estão conseguindo atender a demanda”, esclareceu o pneumologista Maurício Meireles, que assina a carta e é diretor do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais.
A ausência de medicamentos no mercado é fruto não apenas do crescimento na quantidade de pacientes que ocupam leitos de UTI em Belo Horizonte, como também do fato de que muitos permanecem internados e sedados por um longo tempo e, em função disso, demandam uma quantidade maior de remédios para que seja mantida a intubação completa. O uso de medicamentos secundários é considerado em muitas unidades de saúde.
“Nós estamos chegando muito perto do limite. O paciente que necessita de ventilador mecânico precisa ficar completamente sedado e você gasta uma certa dose de medicação para sedá-lo adequadamente. Além disso, um paciente com coronavírus exige o dobro ou triplo de medicação para que seja mantido na sedação se comparado com pacientes com outras doenças. Os médicos estão fazendo ginástica, precisando usar medicamentos alternativos”, detalha Reynaldo Gomes de Oliveira, professor aposentado da Faculdade de Medicina da UFMG que criou o grupo com coordenadores de UTIs de Belo Horizonte.
Segundo ele, existe uma preocupação muito séria com o crescimento na quantidade de infectados – são, pelo menos, 4.668 na capital mineira – e no esgotamento também da força de trabalho. “Quando você acompanha pelo noticiário um paciente saindo do hospital com palmas, é para aplaudir mesmo. O que aconteceu lá dentro do hospital para que ele sobrevivesse é impressionante. São necessários cerca de 30 profissionais para salvar uma pessoa na UTI, entre médicos, enfermeiros, fisioterapeutas respiratórios. É um exército. A sociedade tem que entender que os recursos estão acabando, os medicamentos estão acabando, os leitos estão acabando e a capacidade de trabalho desses profissionais também está se esgotando”, alerta o ex-intensivista.
De acordo com ele, Belo Horizonte ainda tem capacidade de criar novos leitos de UTI, entretanto ela está próxima de acabar. “Não queremos que ninguém morra na sala de emergência porque não tínhamos como intubar ou porque não tinha um ventilador. Nós não queremos deixar que alguém morra em Belo Horizonte por não termos recursos”.
A escassez dos leitos é uma realidade, e pacientes antes tratados em UTI estão sendo transferidos para enfermarias. “Antes os médicos podiam tratar pacientes menos graves na UTI com mais instrumentos, equipamentos. Mas, agora só os casos graves estão indo para a UTI, só aqueles que realmente precisam de ventilação mecânica. Temos estudos que apontam que quatro a cada cem infectados precisarão de um leito".
A carta escrita pelos médicos é principalmente, segundo eles, um apelo à sociedade para que sejam respeitadas as normas sanitárias e as medidas de isolamento social. “Temos notado que os moradores de Belo Horizonte não estão usando máscaras, o isolamento não é respeitado e aglomerações têm acontecido. São fatores que contribuem para o aumento da circulação do vírus e o crescimento no número de casos e pacientes em estado grave”, explica o pneumologista Maurício Meireles.
Situação em Belo Horizonte
A taxa de ocupação dos leitos públicos do Sistema Único de Saúde (SUS) de Belo Horizonte alcançou um índice recorde nesta semana e, segundo a Secretaria Municipal de Saúde, está em 83% nesta quarta-feira (24). A expectativa é que sejam abertos outros 59 leitos além dos 282 existentes na cidade até o momento exclusivamente para pacientes com suspeita ou confirmação de Covid-19.
São mais de 4.668 moradores infectados na capital mineira que estuda anunciar lockdown, medida mais rígida de isolamento social, na sexta-feira (26). Mais de cem pessoas nascidas em BH morreram após contraírem o coronavírus.
Leia a carta na íntegra:
Nós, médicos intensivistas que estamos cuidando dos pacientes mais graves com COVID-19 em Belo Horizonte, queremos alertar que o número de pacientes graves internados continuou subindo muito nessa última semana (16/06 a 23/06).
A ocupação dos leitos públicos só não atingiu o nível mais crítico porque foram abertos mais 30 novos leitos de UTI. Também foram abertos novos leitos nas UTIs privadas para manter preservada sua capacidade de atendimento até o momento.
Mas é importante que todos entendam:
O número de pacientes internados em UTI ao fim dessa terceira semana de junho é MAIS DO DOBRO que 30 dias atrás.
O número de pacientes em ventilação mecânica artificial é MAIS DO QUÁDRUPLO do que a 30 dias atrás.
Isso mostra que tem aumentado muito o número e a gravidade dos casos que estamos atendendo. É certo que o risco de uma pessoa se infectar está aumentando nessa mesma proporção.
Por isso, para que não cheguemos a uma situação de colapso, é absolutamente essencial que aumentemos nossos cuidados e medidas de prevenção para conseguir reduzir a velocidade atual de transmissão.
As medidas de prevenção são:
Manter o distanciamento de 2 metros de outras pessoas e só sair de casa se absolutamente essencial.
Evitar qualquer local com acúmulo de pessoas, sobretudo se for ambiente fechado.
Intensificar a frequência de higiene das mãos antes e após qualquer situação de risco.
Usar máscaras corretamente, cobrindo o nariz e a boca.
Ao primeiro sintoma suspeito (como febre, tosse, cansaço, perda de olfato) entrar em contato com o médico, procurar fazer o teste e iniciar o isolamento.
Se cuidem e compartilhem esse alerta com seus familiares e amigos.