Ao subir no túmulo de um cemitério em Três Pontas, no Sul de Minas, em plena luz do dia, nesta terça-feira (25), e se masturbar enquanto olhava para uma adolescente, Juliano Souza Gentil, 37, conhecido pelos policiais da cidade por cometer atos desse tipo, não esperava ser preso. Enquadrado no crime de importunação sexual, conforme lei sancionada pela Presidência da República na última terça-feira, Gentil pode pegar entre um e cinco anos de prisão. Práticas como encoxar, passar a mão, masturbar-se, beijar ou ejacular em alguma pessoa sem o consentimento dela para satisfazer desejos próprios ou de terceiros deixam de ser contravenções penais e se tornam, oficialmente, crimes. Levantamento da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) aponta que, somente em Minas Gerais, foram registrados por dia, nos oito primeiros meses do ano, três casos de importunação ofensiva ao pudor.

Até terça-feira, esse era o nome dado para o crime de importunação sexual. Casos de abuso em transporte coletivo, por exemplo, eram considerados contravenções, punidas com multa, cesta básica e trabalhos comunitários. Em todo o ano passado, 939 práticas como essas foram registradas em Minas. Entre janeiro e agosto deste ano, houve 819 registros, 54% a mais do que no mesmo período de 2017, quando foram contabilizadas 531 ocorrências no Estado.

“Toda prática de ato libidinoso virou crime. Então, entra qualquer ato. Não precisa ser necessariamente masturbação. Pegar no seio da mulher, ficar encostando, encoxando, isso tudo sem o consentimento da pessoa, já é um crime. É uma grande vitória, que vem de uma grande luta das mulheres. O Brasil é um país machista”, afirmou nesta terça-feira, em entrevista à rádio Super, a juíza do 1º Juizado da Violência Doméstica Familiar contra a Mulher, Maria Aparecida Consentino.

Para a delegada Larissa Mascotte, da Delegacia Especializada de Investigação a Violência Sexual, a expectativa é que haja um aumento no número de casos: “Acho que foi um avanço. Já passava da hora de isso se tornar crime. Muitas mulheres eram abusadas e não viam uma punição justa para o autor. Acho que agora vai aumentar muito os registros”.

Denúncias

Avanço. Com a nova lei, o Ministério Público pode denunciar casos de importunação mesmo que a própria vítima não faça uma representação contra o autor do crime.

 

Norma inclui divulgação de vídeo de sexo

Além de prever pena de um a cinco anos de prisão para quem cometer ato libidinoso em público, a Lei 13.718/2018 determina a mesma punição para quem divulgar vídeos ou fotos de sexo, nudez ou até mesmo cenas de estupro sem a permissão dos envolvidos. Se o crime for praticado por quem manteve relação sexual com a vítima, como é o caso de ex-namorados motivados por vingança, a pena ainda pode aumentar em até dois terços.

“Às vezes, (a vítima) termina um relacionamento, e o autor fica com raiva e, para humilhar a pessoa, para agredi-la, ele compartilha vídeos de nudez, essas coisas, para tentar reatar o relacionamento de alguma forma”, detalha a delegada Larissa Mascotte.

Estupro. A nova lei também aumenta em até dois terços a punição para estupro coletivo – quando o ato envolve dois ou mais autores – e estupro corretivo – quando é praticado para controlar o comportamento sexual ou social da vítima.

Minientrevista

Maria Consentino

Juíza do 1º Juizado da Violência Doméstica Familiar contra a Mulher

Como a senhora vê a alteração da lei, passando de contravenção para crime?

É uma grande vitória, que vem de uma grande luta das mulheres. O Brasil é um país machista. Estamos no quinto lugar da prática de feminicídio. Aqui, a cada 15 segundos, uma mulher é espancada. Então, essa lei é uma conquista para desconstruir a cultura machista e fazer uma sociedade melhor para nossos filhos, para nossos descendentes, uma sociedade mais igualitária. Com essa mudança, a reprimenda está bem severa.

Quais as expectativas com a mudança?

Quero dizer para as mulheres que, ao tomarem conhecimento dessa lei, não deixem de buscar a Justiça, principalmente se ex-companheiros quiserem intimidá-las. Nós temos uma média de 5.000 a 7.000 processos de algum tipo de violência contra a mulher por vara.

Como a senhora vê, hoje, as medidas para conter a violência doméstica? 

Está mudando. A medida protetiva, por exemplo, eu vejo que, com certeza, nunca vai segurar um psicopata ou uma pessoa que está determinada a matar, mas ela, sem dúvida, dá um fortalecimento para a mulher e uma intimidação para o homem. Então, corta o ímpeto dos criminosos, o ímpeto de querer bater, de destruir aquela mulher.