Morreu na madrugada deste sábado (9) o jornalista Dídimo Miranda de Paiva, aos 90 anos.  Ele estava internado desde o último sábado (3) por causa de complicações em decorrência de uma pneumonia. Dídimo era natural de Jacuí, no Sul de Minas Gerais, e já trabalhou em jornais do Rio de Janeiro, na Tv Globo e no Estado de Minas. 

No jornal mineiro ele foi  editor dos cadernos de Nacional, Internacional, Opinião. Um documentário sobre o jornalista foi feito pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). CLIQUE AQUI para assistir ao vídeo. 

"Trabalhei com ele 30 anos no Estado de Minas. O Dídimo era uma pessoa muito íntegra, com relação, sobretudo na atividade de jornalista. Ao longo da vida foram oferecidos a ele muito cargos públicos e ele não aceitou. Como jornalista ele ganhou a vida", disse o jornalista Mauro Werkema. 

Luta durante a ditadura

Dídimo foi presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG) entre 1975 e 1978 no período da Ditadura Militar. Ele é bastante reconhecido por sua luta nesse período. 

"O Dídimo era muito corajoso. Ele teve um papel muito importante na época da ditadura, quando nós da imprensa estavamos muito acuados pelo regime militar. Ele sempre era muito corajoso com os governantes e sempre teve uma postura de vanguarda, tanto no jornalismo quanto na luta sindical", considerou o editor de opinião do jornal O TEMPO, Victor de Almeida. 

O corpo do Dídimo está sendo velado na Casa do Jornalista neste sábado, desde 9h da manhã. O enterro está marcado para às 16h no Cemitério Parque da Colina, no Bairro Nova Cintra, na região Oeste de Belo Horizonte. Dídimo deixou a esposa, cinco filhos e sete netos.

"Ele foi responsável por mudar a forma de se pensar o sindicalismo no Brasil. Nessa casa( casa do jornalismo) se reuniu todo mundo. Aqui muitos sidicatos cresceram", disse o jornalista José Eustaquio Oliveira. 

A presidente do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais, Alessandra Melo também falou sobre Dídimo. "Um cara muito importante na luta pela liberdade de expressão, pelo jornalismo independente. Ele foi presidente do Sindicato em um momento muito difícil, e presidiu com altivez e abriu o sindicato. E quem trabalhou com ele, como eu, sabe a pessoa agradabilíssima que era. Mas ele deixa a certeza na gente que temos que lutar pelo jornalismo e pelo direito ao trabalho" , disse. 

"Referência de todos nós, jornalistas e os que o conheceram, dos mais diferentes segmentos e setores, Dídimo Paiva honrou-nos todos com sua vida, exemplo e trabalho. O Sindicato e a Casa do Jornalista, onde exerceu liderança que está na História do Jornalismo mineiro, prestam sua homenagem a este companheiro,  essencialmente jornalista, que dignificou e elevou a profissão  e que nos deixa seu exemplo para as gerações que o sucedem", informou a nota da Casa do Jornalista. 

O perfil oficial do ex-presidente Lula no Twitter comentou a morte do jornalista mineira. "Meus sentimentos à família e aos muitos amigos do companheiro Dídimo Paiva. Jornalista corajoso que teve importante papel na construção e articulação nacional do novo sindicalismo. Para sempre em nossa memória".

 

 

 

 

Filho de Dídimo, escreveu uma carta para o pai, leia na íntegra:

Meu pai foi um homem bravo. Tinha um estopim curtíssimo. Ficou mais doce com o passar dos anos - sobretudo depois que os netos nasceram. Era um cara bonito: olhos azuis impressionantes, o rosto triangular, o nariz grande e bem feito - e uma cicatriz na testa, obra de um golpe errado de um machado na hora de cortar lenha na juventude. Mas não era nem um pouco vaidoso. Não me lembro de tê-lo visto entrar em alguma loja para experimentar um novo terno ou camisa de grife. Não gostava de viajar, tinha medo de avião, bebia pouquíssimo, fazia barba todos os dias. Detestava tecnologia. Nunca teve celular nem perfil em rede social. Dirigia devagar - não passava de 80 por hora. Dirigia mal mas só bateu o carro uma vez na vida, e ele jurava que não foi culpa dele. Por uma razão desconhecida, só gostava de carros da Volkswagen. Era discreto e misterioso. Nao sei se acreditava em Deus ou se era ateu - mas acho que ele não sabia de cor o pai nosso. Gostava mesmo de duas coisas: ler e escrever. Era um vício, uma doença, uma missão. Uma paixão.  Muitos domingos acordei ao som do tec tec da máquina de escrever - e fui dormir ouvindo lá longe aquele barulhinho repetitivo. Meu pai e sua velha máquina de escrever, uma Remington, que ele martelava diuturnamente com os dois dedos indicadores, o datilógrafo mais rápido do Brasil, como costumava  gargantear. Também era um mestre na arte de pregar idéias libertárias. Amava a democracia, a liberdade de imprensa, o respeito entre os poderes. Na minha infância, em Belo Horizonte, meados dos anos 70, nossa casa era uma espécie de quartel general das liberdades democráticas. A casa vivia cheia - eram longas conversas com gente da esquerda, da direita e do centro. Acho que foram alguns dos anos mais ativos - e felizes - da vida dele.  Meu pai começou a morrer no dia em que deixou o "Estado de Minas". Era um vínculo poderoso demais para ter aquele desfecho.  Não suportou o fim da carreira no jornal. A vida do velho repórter perdeu um pouco da graça.  Redação era uma extensão dele próprio.  Tinha um orgulho danado de ter escrito o código de ética do jornalista. E nesse campo era imbatível. Se gabava de não aceitar viagens, presentes, convites. Achava que se aceitasse qualquer mimo perderia independência. Amava a política, mas nunca aceitou entrar para a política - embora convites não tenham faltado ao longo dos seus 90 anos de vida. Conseguiu viver fiel aos seus princípios.  Vai direto pro céu. Valeu por tudo pai. Com amor e admiração,  seu filho, também jornalista, Esdras Paiva.