Quando o estudante de engenharia Carlos Maranhão de Souza, 21, saiu de casa, em BH, para ir a um hospital no fim do mês passado não imaginava que as insuportáveis falta de ar e dor no peito o levassem ao diagnóstico tardio de asma, doença respiratória que matou 39 pessoas em Minas Gerais nos seis primeiros meses de 2019 – 116,6% que no mesmo período do ano passado. O jovem procurou socorro imediato. No entanto, de acordo com especialistas, grande parte das mortes acontece por negligência do paciente com o tratamento.

“Nunca tive problema respiratório. Fiquei com medo da dor no peito e fui ao hospital por cobrança dos meus pais, que estavam alertas porque eu já perdi uma prima para a doença”, contou Souza.
Apenas de maio a junho deste ano, o Estado registrou 18 mortes por asma, o mesmo número de todo o primeiro semestre de 2018. Na capital, segundo a Secretaria Municipal de Saúde, até o último dia 16, 32 pessoas morreram em decorrência da doença em 2019. A estimativa do Ministério da Saúde é de seis mortes a cada dia no país devido à doença.

O debate sobre a asma veio à tona após a morte da atriz, escritora e apresentadora Fernanda Young, 49, no último domingo, em Gonçalves, no Sul do Estado. Mas a incidência da doença, que segundo a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia acomete 20 milhões de brasileiros, já assustava pneumologistas do país. Em Minas, 3.427 foram internados por complicações da asma neste ano (dados até maio), segundo o governo. Em todo o ano passado, foram 8.739.

Controle

Casos como o do universitário Souza são comuns, mas o maior problema da doença está na negligência dos já diagnosticados, segundo o professor do departamento de pediatria do curso de medicina da UFMG Cássio Ibiapina. “Não é necessário ter asma na infância para ter (a doença). Mas não deveria haver mortes por asma. São muitos casos em Minas e, na maior parte das vezes, a crise pode ser controlada, mas a pessoa não detecta a doença precocemente”, disse.

O importante, segundo o pneumologista, é que os já diagnosticados procurem o médico para identificar os sintomas da crise. “É preciso saber o momento de tratar em casa e a hora de procurar o hospital. Retardar (o socorro) pode ser fatal”, alertou.

Uma a cada quatro crianças da capital mineira têm asma 

Na primeira tosse diferente da filhinha Luísa, de 6 anos, a advogada Letícia Otoni, 32, que mora em BH, não pensa duas vezes antes de levar a criança ao hospital. É que Luísa, que faz tratamento contra a asma desde os 2 anos, é medicada todos os dias e apresenta sintomas bem conhecidos da família. “Sei quando está diferente pela tosse dela. Quando vejo que é mais grave, trato em casa, mas corro para o hospital também”, contou Letícia.

Cerca de 25% das crianças da capital têm asma, segundo estimativa da Secretaria Municipal de Saúde – são cerca de 112 mil crianças, se considerado o último censo do IBGE, segundo o qual BH tem cerca de 450 mil pessoas com idade entre 0 e 14 anos.

E é justamente a alta incidência da doença nessa faixa etária que motivou a criação do programa Criança que Chia, da prefeitura, que há 23 anos assiste integralmente as crianças com asma em todas as regionais. A iniciativa identifica os asmáticos da área de cada centro de saúde e os estimula a serem acompanhados pela equipe da unidade. São fornecidos medicamentos inalatórios e espaçador. 

Socorro

A ambulância da Prefeitura de Gonçalves que socorreu Fernanda Young durante a crise de asma chegou ao sítio onde a atriz estava apenas com o motorista – sem enfermeiros ou paramédicos. A paciente foi levada a Paraisópolis, a cerca de 30 km do local. A prefeitura informou que tem problemas financeiros e que pacientes graves devem ser transportados pelo Samu. O Estado informou que o serviço não foi acionado.

 

Minientrevista

Cássio Ibiapina

Professor do departamento de pediatria do curso de medicina da UFMG

A asma deve ser tratada em que momento?

Sempre. O que acontece, na maior parte das vezes, é que a pessoa usa somente o medicamento e procura socorro nas crises, e tem que tratar todos os dias. É uma doença inflamatória. Os medicamentos de prevenção são drogas anti-inflamatórias. É importante que cada paciente saiba como a asma se manifesta nele. O que vemos é que a pessoa não dá o devido valor à sua doença, não trata adequadamente.

Há fatores que podem proporcionar mais crises?

Existem muitos gatilhos. Gripes, resfriados e até a baixa umidade do ar desencadeiam crises. Obesidade e inatividade física também contribuem. É importante praticar atividade física, se alimentar bem e combater o estresse. No outono e no inverno, mais vírus circulam na região Sudeste, o que é potencializado pela umidade do ar mais baixa.