Poços de Caldas

MPMG manda cumprir carga horária, e médicos se demitem

Profissionais deveriam trabalhar cem horas mensais, mas concentravam atendimentos

Por Tatiana Lagôa
Publicado em 01 de novembro de 2018 | 03:00
 
 
 
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Investigados pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) por não cumprimento de carga horária, 24 médicos de 11 especialidades com atuação na rede pública de Poços de Caldas, no Sul de Minas, pediram demissão. Outros 18 fizeram solicitação para trabalhar menos horas nos três núcleos de especialidade e três postos de saúde, para onde são encaminhados os pacientes que precisam de atendimento especializado.

Com a situação, a capacidade de assistência para as áreas envolvidas caiu de mil consultas mensais para 700, dificultando ainda mais a vida de quem precisa de atendimento. Em algumas áreas não sobrou nenhum profissional para atender nesses locais.

Segundo o promotor Sidnei Boccia, apesar de os 87 médicos da rede municipal serem pagos para atender por cem horas mensais, eles não cumpriam a carga horária, que tem salário inicial de R$ 3.000. A alegação da categoria é que, em 2006, após um acordo verbal feito com o então prefeito da cidade, Sebastião Vieira Navarro Filho, eles passaram a trabalhar por produtividade.

“Eles se pautaram em uma resolução ou recomendação do Conselho de Medicina que prevê 15 minutos para um atendimento especializado. Em uma hora, um médico atenderia quatro pacientes. Ao longo de uma semana, portanto, atenderia 80 pacientes. Muitos médicos passaram a aglutinar 80 atendimentos em um ou dois dias. Com isso, houve uma diminuição de 50% da carga horária de trabalho, mas mantendo o salário”, explicou Boccia.

Investigação

Em 2016, os promotores receberam uma denúncia de que um médico, que também era vereador na cidade e trabalhava em Goiás, não era encontrado no posto de saúde. Questionado, o profissional contou sobre o acordo. Uma sindicância feita pela prefeitura, a pedido do MPMG, confirmou o descumprimento da carga horária.

Diante disso, a promotoria exigiu que os profissionais adequassem o tempo trabalhado até julho deste ano. Porém, alguns médicos alegaram não ter como cumprir o horário por terem outros empregos e tentaram negociar aumento salarial. Sem acordo com a prefeitura, que nesta terça-feira (30) decretou estado de emergência devido à crise financeira, eles abriram mão dos cargos.

Segundo o secretário de Saúde da cidade, Flávio Togni de Lima e Silva, não sobrou nenhum médico proctologista, pneumologista, endocrinologista, neuropediatra e reumatologista. Saíram também ginecologistas, pediatras, psiquiatras, mastologistas, urologistas e ortopedistas. “É um momento crítico para a saúde aqui. Sem especialistas, muitos deles de difícil contratação, é uma fase delicada”, afirma o secretário.

Para a auxiliar administrativa Janaína Santos, 34, quem paga pelo problema é a população. “Minha mãe uma vez esperou tanto um oftalmologista que ela teve que pagar consulta particular”, contou. O secretário de saúde explica que esses casos são pontuais. (Com Thalita Marinho e Luiz Fernando Motta)

Investigação

Conduta. O MPMG ainda não afirma ter ocorrido crime por parte dos médicos, já que eles teriam sido autorizados pela prefeitura e o prefeito que teria feito o acordo com eles não está mais vivo.

 

Empresa será contratada por seis meses

O quadro de profissionais nos centros de atendimento especializados da Prefeitura de Poços de Caldas deverá ser recomposto em, no mínimo, dez dias. Segundo o secretário de Saúde da cidade, Flávio Togni de Lima e Silva, uma empresa será contratada emergencialmente para garantir a mão de obra terceirizada.

“A empresa vai nos ajudar por seis meses. Nesse período, vamos fazer licitação para contratar quem vai continuar com o serviço”, garante. O trabalho terceirizado será utilizado até que haja um novo concurso público, que ainda não tem data prevista.

Até que os médicos provisórios comecem a atuar, as consultas marcadas ficam suspensas. Uma parcela delas será encaminhada para a Santa Casa da cidade, segundo o secretário.

Saiba mais

Outro lado

A reportagem procurou a Associação Médica de Minas Gerais e de Poços de Caldas, além do Conselho Regional de Medicina e o Sindicato dos Médicos de Minas Gerais, mas nenhum dos órgãos havia dado retorno até o fechamento desta edição.

Próximos passos

Segundo o promotor Sidnei Boccia, ele aguarda a implantação do ponto eletrônico na rede de saúde de Poços de Caldas. Os aparelhos foram comprados e devem estar funcionado até o início de 2019. O MPMG vai encaminhar a apuração do caso para a Polícia Civil investigar possíveis crimes.

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