Quatro dias após enterrar o sogro em uma cerimônia curta e com limite de amigos, Ítalo de Jesus precisou acompanhar a mulher na despedida da irmã dela, Samira Dias Câmpara de 40 anos, igualmente rápida e dolorosa que aconteceu nessa quarta-feira (17). A família belo-horizontina perdeu o pai Paulo Roberto, 75, e a filha dele infectados pelo coronavírus após dias de internação nos hospitais Odilon Behrens e Eduardo de Menezes. Samira deixa um filho de apenas 11 anos, e diante da dor pelo luto a família tenta encontrar forças para rezar pela melhora de Vera Lúcia, mãe de Samira e esposa de Paulo Roberto, que está no CTI do Hospital Eduardo de Menezes também diagnosticada com Covid-19.
Vendedor ambulante, musicista e conhecedor de três idiomas além do português, Paulo Roberto começou a sentir os primeiros sintomas da infecção no começo de junho, e após procurar uma UPA acabou internado no terceiro dia do mês. O primeiro teste feito não acusou coronavírus. Ele tinha um quadro de enfisema pulmonar causado pelo cigarro. “Ele era fumante, fumava uma média de um maço de cigarro por dia. E deu entrada no hospital com sintomas do coronavírus”, conta o genro, Ítalo.
Dois dias após a chegada ao Hospital Odilon Behrens, houve uma piora em seu quadro de saúde e médicos o encaminharam para um leito no CTI da unidade. As duas filhas, Samira e a mulher de Ítalo, o acompanharam no decorrer da internação e só descobriram o diagnóstico de coronavírus depois de 5 de junho.
“O primeiro teste deu negativo e ele foi para a enfermaria, sem os parâmetros que estão sendo usados agora, sem todo o método de segurança. Minha cunhada (Samira) e minha esposa dormiram com ele, tomaram conta dele e minha cunhada contraiu a doença lá”, detalha Ítalo.
Segundo ele, os primeiros sintomas apareceram em Samira em 6 de junho quando ela procurou pela primeira vez atendimento em um centro de saúde na região Nordeste de Belo Horizonte. Médicos não pediram que exames fossem feitos e ela recebeu um diagnóstico de dengue.
“Eles não quiseram dar medicamentos e mandaram ela para casa, disseram que era dengue. Na quarta-feira (10) ela procurou o posto de saúde novamente e aí que eles perceberam que a saturação dela estava baixa. Mandaram ela para a UPA do bairro São Paulo e de lá encaminharam ela de ambulância para o Eduardo de Menezes”, conta o cunhado.
Vera Lúcia, mulher de Paulo Roberto, sentia também sintomas de coronavírus e foi internada com a filha no Hospital Eduardo de Menezes. Instalado na região do Barreiro, a unidade de saúde é referência em Belo Horizonte no atendimento a pacientes com sintomas ou confirmação de Covid-19.
Médicos decidiram entubar Samira Dias Câmpara logo que ela chegou à unidade de saúde. Dez dias após a internação, Paulo Roberto morreu na sexta-feira passada (13). Quatro dias após a morte do pai, Samira faleceu em um leito de CTI do Eduardo de Menezes nessa quarta-feira (17).
A mãe dela não pôde despedir-se da filha ou do marido e está, nesta sexta-feira, recebendo cuidados médicos intensivos em um leito do mesmo hospital onde a filha permaneceu em seus últimos dias de vida. Além da mãe e da irmã, Samira deixa um filho de apenas 11 anos.
Ítalo conta que a cunhada era esteticista e cabeleireira e o sogro um musicista excepcional. “Meu sogro chegou a tocar na época dele com vários músicos, tocava principalmente baixo e instrumentos de corda, percussão também. Qualquer instrumento ele tocava. Minha cunhada arrumou os cabelos de pessoas famosas e era muito boa naquilo que fazia…”, relembra. Após ser submetida a dois exames, a mulher de Ítalo que é funcionária da Saúde em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, testou negativo em ambos para a infecção. Em meio ao luto, a família ainda se tornou alvo de piadas e comentários preconceituosos.