Após seis anos junto à família que a adotou, uma garota de 8 anos pode ser entregue a avó biológica por parte de pai, conforme sentença expedida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) na última semana. Ontem, até o fechamento desta edição, a informação era de que a ordem de execução da decisão ainda não tinha sido cumprida, e a criança permanecia com os pais adotivos. Eles já entraram com recurso para tentar reverter o caso.

A menina foi adotada após ter passado alguns meses em um abrigo, para onde foi levada depois de ser retirada dos pais biológicos a pedido do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). Na época, o órgão solicitou a retirada da guarda ao constatar que a garota era submetida a uma situação de risco e de maus-tratos.

A família que adotou a menina a conheceu em 2014 e, logo em seguida, ingressou com o pedido de guarda, concedido pela Justiça no mesmo ano. Entretanto, mesmo após a autorização para a adoção, a avó paterna da criança requereu que o tribunal entregasse a ela a guarda da neta, um ano depois de a criança ser levada para um abrigo.
O pedido foi negado pelo juiz de primeira instância, que autorizou a retirada da guarda dos pais biológicos. A avó recorreu logo depois, alegando que os pais adotivos não estariam seguindo os trâmites corretos do processo, e teve decisão favorável em segunda instância, na última semana, quando a desembargadora responsável pelo caso entendeu ser muita drástica a medida de retirada da criança do seio da família biológica e decidiu que a guarda fosse entregue à avó paterna da menina.

“Objeto biológico”
A decisão é criticada pela presidente da Comissão da Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), Silvana do Monte Moreira. De acordo com ela, a criança foi tratada pela Justiça como apenas um objeto biológico, que pertence por direito sanguíneo aos parentes, o que ignora a relação afetiva construída pela criança com os pais adotivos, com quem passou a maior parte da vida. 

“Nada justifica essa tentativa de reinserção na família paterna, que inclusive tem um histórico de assassinato cometido pelo pai biológico, que matou o próprio pai. A reinserção dessa criança na família paterna é absurda”, analisa Silvana. 


O TEMPO entrou em contato com o pai adotivo da criança, que afirmou que, por orientação da advogada, não vai dar entrevista sobre o caso. A defensora também não quis falar do processo, segundol ela para evitar risco de interferência na decisão judicial sobre o recurso. Procurado na noite de ontem, o TJMG não tinha respondido até o fechamento desta edição. A reportagem não conseguiu o contato com o pai biológico da menina. 

 

Especialista

Interesse da criança foi desrespeitado

Assessor jurídico da Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção, Felipe Fernandes também questiona a sentença. “A decisão é teratológica, já que não vai ao encontro do melhor interesse da criança, que já possui vínculos de afinidade e afetividade com a família adotiva”, critica.[NORMAL_A] 
O receio de perder repentinamente a guarda dos dois irmãos que adotou quando tinham 3 e 4 anos assombrou, por quase quatro anos, a gestora em finanças Virgínia de Souza Rodrigues Silva, que mora em Uberlândia, no Triângulo. “Não desejo esse medo pra ninguém. Foi um alívio imenso quando tivemos a guarda definitiva”, lembra. 


Ela fez o processo de forma legal e sabia que a destituição familiar dos menores não tinha sido concluída. “Nossa sorte foi ter um magistrado que explicou toda a situação”, diz.