A porta-bandeira do bloco Afro de Belo Horizonte OriSamba, Maryh Beneditta, de 35 anos, denuncia ter sido vítima de racismo e intolerância religiosa após ter a entrada proibida em um restaurante do bairro Lourdes, na região Centro-Sul, mesmo com o estabelecimento funcionando normalmente. Maryh explica que só entendeu que se tratava de discriminação pela cor após um garçom, também negro, confessar que se solidarizava com a causa dela, mas que não poderia fazer nada. O caso aconteceu nesse domingo (4 de fevereiro), e as pessoas brancas que estavam acompanhando a vítima, segundo ela, tiveram a entrada liberada.
“Foi muito difícil estar em um lugar como aquele, sabendo que eu não tinha nenhuma intenção errada, e ver como vítima de discriminação. Era um dia de Carnaval, de alegria, e isso me afetou muito”, lamenta a carnavalesca. Segundo Maryh conta, ela estava participando do desfile do bloco OriSamba na região do Largo do Rosário, entre as ruas da Bahia e Timbiras, no bairro Lourdes, quando decidiu entrar no restaurante para consumir uma bebida.
No entanto, antes mesmo de chegar à entrada do local, viu a porta se fechar. “Eu sei que, no Carnaval, alguns restaurantes só permitem a entrada quando há consumo. Então, cheguei perto e disse ao garçom que não tinha nem interesse de ir ao toalete, só queria entrar, sentar e consumir uma bebida. Mas, simplesmente, fecharam a porta e negaram”, continua Maryh Beneditta.
A porta-bandeira relata que questionou, mais de uma vez, o motivo de não poder entrar. “O restaurante estava aberto, funcionando normalmente, com pessoas consumindo. O que estava errado?”, questiona. Foi quando um garçom, o primeiro a atendê-la, confessou que só estava seguindo ordens, mas disse que era “solidário com a causa”.
“Nesse momento eu comecei a ter dimensão do que estava acontecendo. Ele era negro, como eu. Chamei o gerente, que fez hora para me atender e me tratou com deboche o tempo todo”, denuncia. Maryh Beneditta também sentiu repulsa sobre sua vestimenta, tradicional de religião de matriz africana. “Eu estava com meus trajes, estava vestida em homenagem à Iemanjá. Vestia meu fio de contas, minha guia. Estava tudo visível, é a expressão da minha religião”, conta.
Algumas pessoas também pediram para entrar no restaurante, logo atrás de Maryh Beneditta, uma vez que a porta estava fechada. Elas se solidarizaram com a mulher e começaram a filmar, mesmo sem conhecerem a porta-bandeira. Assim que a vítima desistiu de tentar entrar e consumir no restaurante, esses outros clientes tiveram a entrada liberada. “Eram todos brancos. Quando saí, estava muito abalada. Eu faço parte de um bloco afro periférico, nós participamos de diversas manifestações culturais antirracistas. Estar nesta luta e sentir na pele o preconceito é muito triste”, lamenta a porta-bandeira.
A carnavalesca registrou boletim de ocorrência na Delegacia Especializada de Investigação de Crimes de Racismo, Xenofobia, LGBTFobia e Intolerâncias Correlatas (Decrin), no Barro Preto, nessa segunda-feira (5 de fevereiro). Além da investigação criminal, Maryh também pretende entrar com ação cível contra o restaurante. “O nosso intuito é que isso vá contra a estatística, que não seja mais um caso ignorado. Eu penso nas crianças pretas, nos meus futuros filhos, e quero para eles justiça e um futuro melhor”, afirma.
Na delegacia, a porta-bandeira foi informada que, naquele mesmo domingo (4 de fevereiro), mais quatro casos de homofobia e dois de homofobia haviam sido registrados. Denúncias do tipo podem ser realizadas presencialmente na Decrin, pelo Disque 100 (Direitos Humanos) ou Disque 181 (Disque Denúncia Unificado - DDU).
A reportagem entrou em contato com o restaurante e aguarda retorno.