Ruth Corrêa de Freitas nasceu em Nova Lima, na região metropolitana, e se mudou para Belo Horizonte no ano de 1940. Mãe de 11 filhos, morou no Conjunto Taquaril, na região Leste da cidade. Faleceu em 2010 e, neste ano, virou nome de rua, a última registrada na capital, segundo a Câmara Municipal. A homenagem é pela constante luta de Ruth por melhorias no bairro onde vivia. E conhecer um pouco da história por trás dos nomes das ruas é um jeito de saber mais sobre as origens de Belo Horizonte, que completa 124 anos.
Afonso Pena, por exemplo, nomeia uma das principais avenidas da cidade. A homenagem não foi por acaso. O jurista, que em 1892 era governador de Minas Gerais, foi um dos grandes defensores da substituição da capital de Ouro Preto por uma mais moderna. Ele se dedicou aos planos de construção de Belo Horizonte, que foi inaugurada cinco anos depois, quando Bias Fortes, que também dá nome a outra importante via de BH, era governador.
Na época, Ouro Preto já não representava os valores da República recém-proclamada. “Havia uma identificação de Ouro Preto com um passado colonial, escravista e minerador que se queria superar”, aponta o professor associado do Departamento de História da UFMG Tarcísio Botelho.
A Comissão Construtora da Nova Capital de Minas, chefiada pelo engenheiro Aarão Reis, chegou à região escolhida para sediar a capital em 1894. O professor da Escola de Arquitetura da UFMG Flávio Carsalade explica que BH nasceu junto com a efervescência da ciência do urbanismo. A região escolhida para a “Cidade de Minas” (nome original de Belo Horizonte, que perdurou até 1901) foi a do Curral del Rey, onde havia um arraial “tipicamente mineiro”, segundo o professor Tarcísio Botelho.
Desapropriação
De acordo com Botelho, existe uma falsa impressão de que BH já estava pronta quando foi inaugurada, em 1897, mas isso não é verdade. “Quando veio a desapropriação do Arraial, a parcela da população que tinha mais recursos econômicos – personalidades que inclusive hoje dão nomes a ruas e avenidas de Belo Horizonte – teve os bens desapropriados, com indenizações significativas, inclusive na forma de lotes.
Essa população ainda teve o direito de continuar morando na cidade até que os imóveis fossem destruídos. O Arraial não foi destruído da noite para o dia”, explica Botelho. De acordo com ele, a própria Comissão Construtora usou os imóveis do lugar para se instalar, enquanto as obras mais importantes eram realizadas e as casas foram sendo destruídas, na medida em que ruas eram abertas e os novos lotes eram delimitados.
Já os mais pobres, majoritariamente negros, tiveram que sair. “Quando foi decretada a sentença de morte do Arraial do Curral del Rey, a população menos abastada sofreu, porque foi sumariamente expulsa”, conta o professor e pesquisador Alessandro Borsagli.
Dentro dos limites da avenida 17 de dezembro, atual avenida do Contorno, só ficou quem o professor Tarcísio Botelho chama de “tipo ideal de habitante para a nova cidade”: as pessoas que tinham condições de arcar com os valores elevados dos lotes que eram delimitados pela Comissão Construtora.
Na década de 1920, já dava para ver que o plano original da cidade não era suficiente para abrigar toda a vida que se instalava na nova capital. Povoados como Calafate, Engenho Nogueira, Venda Nova, Barreiro e Arraial da Pampulha já tinham uma população considerável. “Esses locais receberam boa parte desse contingente populacional que foi expulso da área do traçado inicial”, aponta o professor e pesquisador Alessandro Borsagli.
Praça Sete de Setembro de 1966, local onde hoje está o Obelisco
Mesmo com tanto planejamento, Belo Horizonte não foi construída de uma única vez, e, ao longo dos anos, alguns dos planos iniciais foram modificados. “Por exemplo, no lugar onde hoje fica o Colégio Arnaldo (na avenida Brasil, no Santa Efigênia), era para existir algumas secretarias de Estado, que acabaram indo para a praça da Liberdade. A praça da Municipalidade, onde fica o Automóvel Clube, seria a prefeitura, mas isso acabou não acontecendo”, destaca o professor de arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Flávio Carsalade.
Cerca de 40 anos depois da inauguração da capital mineira, quando Juscelino Kubitschek era prefeito de BH, o poder público passou a reconhecer que a cidade se estendia para além da avenida do Contorno.
Foi nessa época que a lagoa da Pampulha se tornou um dos principais pontos de lazer da cidade, com a inauguração, em 1943, do Conjunto Arquitetônico da Pampulha, hoje Patrimônio Mundial da Unesco. Os prédios projetados por Oscar Niemeyer e construídos a mais de 10 km do limite inicial da cidade eram uma demonstração do tamanho que a capital já tinha.
No principal cartão-postal da cidade, a homenagem em uma das principais avenidas é a mais um político. Octacílio Negrão de Lima foi prefeito da cidade por dois mandatos. O engenheiro nasceu em Nepomuceno, no Sul de Minas. Chegou a ser deputado, mas renunciou ao mandato quando foi eleito prefeito da capital pela primeira vez, em 1935.