Noites em claro, medo constante e dias dedicados à limpeza e à contabilização de prejuízos. As inundações constantes vividas durante o período de chuva por moradores da avenida Tereza Cristina, na região Oeste de Belo Horizonte, podem estar com os dias contados. Isso porque com a finalização de novas bacias de detenção, somente chuvas tão raras, com probabilidade menor de 4% de acontecerem, serão capazes de tornar o local palco de inundação. A chance desse perfil de tempestade ocorrer é a cada 25 anos. A informação foi revelada pelo secretário Municipal de Obras e Infraestrutura, Leandro Pereira, em entrevista exclusiva à reportagem de O TEMPO.  

Segundo a secretaria, a conta se baseia no fato de as bacias de detenção construídas ao redor dos cursos d’água da avenida possuírem capacidade de amortecer em 70% as vazões do córrego Ferrugem e, em média, 30% das vazões do Ribeirão Arrudas no local. A área técnica da secretaria de obras usou como referência uma chuva crítica para a região, com 95 mm por 2 horas seguidas.

“Quando falamos em risco, estamos nos referindo a probabilidades. Depois das obras finalizadas temos chances bem menores de alagamento da avenida do que tínhamos no ano passado. Mas, óbvio que uma chuva de mil anos como tivemos em 2020 não tem cidade que esteja preparada”, explica o secretário. Se o resultado esperado se efetivar, vai ser um feito inédito para a avenida. Neste ano, por exemplo, a via teve que ser fechada por pelo menos dois momentos. O primeiro em janeiro e o segundo em fevereiro, quando placas do asfalto chegaram a ser arrancadas em função da força da enxurrada. Os transtornos na região são tão comuns que há uma equipe de moradores que se disponibiliza a ajudar a Defesa Civil nos trabalhos de prevenção na área.

A realização de oito obras é o que justifica a confiança do secretário quanto ao futuro da via. Dessas intervenções, a construção de quatro bacias de detenção já foram completamente finalizadas: a BD Bonsucesso, na região do bairro Olhos D’água, A BD Túnel/Camões, no Barreiro, a BD Jatobá, também no Barreiro e a BD Santa Lúcia, na Prudente de Morais. Além disso, outras quatro estão em execução, sendo que três delas já têm funcionalidade, ou seja, já conseguem reter a água. A outra ficará pronta em outubro de 2024.   

“Temos duas obras funcionais na bacia do Arrudas que afetam diretamente a avenida Tereza Cristina. É a obra do Olaria, que tem capacidade de retenção de 70 milhões de litros d’água, que já está funcional. Além da bacia B5 que a prefeitura está executando, com capacidade de retenção de 278 milhões de litros d'água. Então temos duas grandes estruturas para reduzir o risco de inundação na Tereza Cristina, tornando a probabilidade de a gente verificar aquelas cenas de períodos anteriores de chuva menores”, reforça o secretário ao citar as obras mais relevantes. 

Para muitos, a lembrança das frequentes inundações na região seguem vivas na memória. Morador da Tereza Cristina há mais de 20 anos, Nilton Cândido Batista, de 70 anos, relembra as vezes que passou noites em claro observando o volume do rio Arrudas, enquanto as chuvas caiam pela janela. "Passei não uma, nem duas. Quando começa a chover que eu vejo que está fora do limite, já levanto e fico olhando pela janela para poder gritar com a turma 'racha fora que lá vem água'. Já fiquei três dias limpando minha casa. Só caminhão de barro tirei dois, fora o que eu lavei e joguei fora. E isso já foi umas 8 vezes. Nos últimos anos choveu menos e por isso não entrou água. A obra está feita mas não quer dizer que vai amenizar", conta. 

Para quem já sentiu na pele as inundações, o sentimento com a possibilidade de ter ao menos um ano sem inundações é de “ver para crer". "Eu fiz uns portões de contenção na minha casa prevendo inundação de 1,20 metros. Daqui para cima é só Deus, mas eu não estou confiando (nessas obras). Vamos esperar e ver, que Deus ajude que essas obras retenham um pouco dessa água. Sentimento ainda é aquele: começa a chover no Barreiro e a gente fica acordado a noite inteira, todos os moradores da Tereza Cristina. Ficamos com a sirene ligada", afirma.   

Outros pontos de atenção

A avenida, palco de muitas tragédias durante o período chuvoso e problema histórico na capital, é um dos nove pontos de maior atenção elencados pela Defesa Civil Municipal. A lista inclui ainda as avenidas Vilarinho, Cristiano Machado, na altura dos bairros Primeiro de Maio e Vila Suzana, Bernardo Vasconcelos, Prudente de Moraes, Heraclito Mourão, Francisco Sá e Silviano Brandão. Esses pontos são considerados de maior atenção em função do risco iminente de tragédia e por serem corredores importantes para o trânsito da cidade, ou seja, têm impacto na vida de pessoas para além dos moradores das áreas específicas. 

Os locais possuem protocolos específicos para atuação em caso de riscos de inundações, e a maior parte dos pontos passa por obras de macrodrenagem. “Intensificamos intervenções de macrodrenagem. Estamos executando obras nas principais bacias da cidade, que já serão funcionais neste período de chuvas e outras obras de grande complexidade que já estão em andamento”, detalha o secretário. 

Ainda conforme o secretário de Obras, em BH, pelo menos 1.000 famílias moram em áreas de risco geológico. Para dar mais segurança e tranquilidade para a população que vive nesses locais, a prefeitura criou um programa para intervenções em encostas. Ao todo, 208 obras previstas no projeto já foram concluídas e outras 54 estão em andamento. Além disso, durante o período chuvoso - que ocorre entre outubro e março - a administração promete vigilância 24 horas por dia para agir em casos de riscos.  

“O programa de encostas ataca as áreas em risco geológico para que as pessoas e famílias tenham mais segurança em seus domicílios. Mas como a topografia da cidade é cheia de aclives e declives temos que manter esse programa continuante. Para além disso, monitoramos os domicílios que podem estar em risco, às vezes de médio impacto. Ao longo do período chuvoso, nossa equipes fazem o acompanhamento e se identificar que há necessidade de retirar essas famílias temos todo suporte da nossa área social e ambiental para minimizar a situação”, garante Leandro Pereira. 

Chuvas ainda são ‘incógnitas’ 

Chuvas intensas devem atingir Belo Horizonte a partir deste mês, quando está previsto o início do período chuvoso. A previsão, segundo o secretário, ocorre devido a atuação do fenômeno climático El Ninõ, que deve trazer climas extremos, como ondas de calor intensas e chuvas torrenciais. A realidade faz com que a quantidade de chuvas deste ano seja uma “incógnita”.“Esse período chuvoso é muito influenciado pelo El Ninõ, então esperamos eventos extremos. Podemos ter períodos de seca intensa e chuvas torrenciais. Mas de toda maneira é uma incógnita como o tempo vai se comportar. Por isso a prefeitura precisa estar preparada para eventos de qualquer ordem. Estamos estruturando nossas ações de obra, mas também ações de respostas”. 

Diante da imprevisibilidade, a prefeitura de BH garante estar preparada para qualquer evento climático. “Temos o Grupo de Gestão de Risco e Desastres (GGRD), institucionalizado por um decreto do prefeito. Ele vai se reunir toda segunda-feira para fazer um balanço das estratégias que precisamos adotar para algo que ocorreu no período anterior e para o planejamento da semana para as chuvas que vamos ter naquele período. Tudo isso para termos respostas rápidas”, finaliza o secretário. 

Onde a PBH vê maior risco de tragédias por alagamentos com impacto no trânsito e na vida de maior número de pessoas

Avenida/ Curso d’água/ O que a PBH prevê
1 - Prudente de Moraes/ Córrego do Leitão / Desenvolvendo projeto para obras na região
2 - Francisco Sá/ Córrego dos Pintos / Finalizando projeto para obras na região
3 - Vilarinho/ Córrego Vilarinho/ Em obras com previsão de entrega do reservatório 2 no segundo semestre de 2024 e o 1 no segundo semestre de 2025. 
4 - Cristiano Machado (altura do bairro Primeiro de Maio)/ Ribeirão do Onça/ Entrega do reservatório em dezembro de 2023. 
5 - Cristiano Machado (altura do bairro  Vila Suzana)/ Ribeirão Pampulha e Córrego Cachoeirinha/ Obra em andamento com previsão de entrega no segundo semestre de 2024. 
6 - Bernardo Vasconcelos/ Córrego Cachoeirinha/ Finalizando projeto com recurso já garantido para a primeira etapa de obras. 
7 - Heraclito Mourão/Córrego Ressaca  / Monitoramento do nível do córrego e limpeza de bocas de lobo. Sem previsão de obras em curto prazo.     
8 - Silviano Brandão/Córrego da Mata / Monitoramento do nível do córrego e limpeza de bocas de lobo. Sem previsão de obras em curto prazo.     
9 - Tereza Cristina / Ribeirão Arrudas e Córrego Ferrugem/ Oito obras, sendo quatro em andamento e quatro finalizadas. Entre as quatro em execução, três já estão em funcionamento com execução apenas do projeto paisagístico e uma com previsão de conclusão em outubro de 2024. 

Fonte: Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura de Belo Horizonte.