MANIFESTAÇÃO

Tragédia em Brumadinho completa 5 anos com 'sede de Justiça'

Série de atos recorda a tragédia em Brumadinho; 272 balões serão soltos no mesmo horário em que a barragem se rompeu

Por Rayllan Oliveira
Publicado em 25 de janeiro de 2024 | 09:59
 
 
 
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"O que a memória ama permanece vivo, e aquilo que não é dito não é lembrado. Nós jamais permitiremos que esse crime caia no esquecimento". O desabafo de Andressa Aparecida Rodrigues, mãe de uma das vítimas do rompimento da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, e presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos do Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão em Brumadinho (Avabrum), se soma ao sentimento de centenas de pessoas que, nesta quinta-feira (25 de janeiro), cobram por Justiça.

A tragédia que matou 272 pessoas completa cinco anos sem que os 16 réus no processo que corre na Justiça Federal tenham sido condenados. "É um grito, um clamor, para que o Judiciário cumpra o seu papel e tenha celeridade", completa.

Na cidade da região Central de Minas Gerais, uma série de atos recorda a tragédia. São homenagens às vítimas e manifestações por Justiça. Uma missa é celebrada às 9h. O ato religioso seguirá com uma romaria até o letreiro da cidade, onde 272 balões serão soltos no mesmo horário em que a barragem se rompeu.

"É mais um dia de tristeza, com o sentimento que estamos sozinhos", relata a agricultora Maria Aparecida Soares, irmã de uma das vítimas e moradora da comunidade do Tejuco, em Brumadinho. A comunidade, que existe há cerca de 300 anos e reúne cerca de 1.500 moradores, denuncia desde 2019, ano do rompimento da barragem, a má qualidade da água e a falta de abastecimento. "Vivemos com a água mineral que a Vale fornece, do caminhão pipa da Copasa. Não temos mais água para a agricultura, para fazer aquilo que fazíamos antes. Hoje, temos sede. Sede de água, de Justiça", expõe. 

A denúncia da agricultora se assemelha a do cacique Sucupira, da comunidade indígena Naô Xohã, localizada às margens do rio Paraopeba, em São Joaquim de Bicas, na região Central do estado.

"Foi um crime contra o meio-ambiente, sem ele não existe vida. Essa tragédia exterminou o nosso projeto de vida. Não temos mais como caçar, como pescar, como cultivar. É um crime sem fiança, o dinheiro não compra um rio, um peixe, uma árvore. Precisamos que a Justiça possa valer para todos aqueles que perderam entes-queridos e que foram afetados", disse o cacique.

Em 2023, 16 pessoas ligadas à mineradora Vale e à consultora alemã Tüv Süd se tornaram novamente réus por crimes relacionados com a tragédia. O processo tramita na Justiça Federal, após decisão tomada no dia 24 de janeiro do ano passado, com base em um pedido protocolado pelo Ministério Público Federal (MPF).

O processo deixou de tramitar na esfera estadual, após ter sido invalidado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Os denunciados respondem pelos crimes de homicídio qualificado, além de crimes contra a fauna, crimes contra a flora e crime de poluição. Ninguém foi condenado.

A reportagem entrou em contato com a Justiça Federal e a Vale sobre as acusações feitas pelos moradores da região. Em nota, a mineradora informou que segue com a distribuição ininterrupta de água por meio de caminhões-pipa e com o fornecimento de água mineral aos moradores de Tejuco, até que seja concluída uma solução definitiva para o abastecimento da comunidade.

"Os caminhões-pipa são abastecidos com água da Estação de Tratamento Rio Manso, da Copasa, e antes de cada entrega é feita a análise da água e a medição da concentração de cloro", informou na nota que pode ser lida na íntegra abaixo.

O acidente

A barragem da Mina Córrego do Feijão, da mineradora Vale, em Brumadinho, se rompeu no dia 25 de janeiro de 2019, causando a morte de 272 pessoas e espalhando resíduos de minério pela bacia do Rio Paraopeba. Desde o ocorrido, 267 mortos foram encontrados e identificados, incluindo duas mulheres grávidas. Outras três pessoas seguem desaparecidas.

Nota da Vale na íntegra

"A Vale segue com a distribuição ininterrupta de água por meio de caminhões-pipa e com o fornecimento de água mineral aos moradores de Tejuco, até que seja concluída uma solução definitiva para o abastecimento da comunidade. Os caminhões-pipa são abastecidos com água da Estação de Tratamento Rio Manso, da Copasa, e antes de cada entrega é feita a análise da água e a medição da concentração de cloro.

Como solução definitiva, o Termo de Compromisso - "TC Águas", firmado entre a Vale, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, a Copasa, o Estado de Minas Gerais e o Município de Brumadinho, prevê a construção de um novo sistema de abastecimento hídrico. A Vale irá custear a obra de interligação de Tejuco ao sistema integrado da Copasa, para o abastecimento de água potável da comunidade.

Com relação à Aldeia Naô Xohã, ainda em 2019, foi assinado, junto ao Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União, um Termo de Ajuste Preliminar Emergencial - "TAP-E Pataxó", que definiu repasses mensais e outras obrigações da Vale com relação aos indígenas atingidos pelo rompimento da barragem. Todas as obrigações assumidas pela Vale têm sido cumpridas.

Recentemente, em cumprimento à decisão judicial, a Vale adquiriu um terreno de mais de 300 hectares para a realocação temporária dos integrantes da Aldeia Naô Xohã. Além disso, está em fase de contratação a entidade que fará os estudos socioeconômicos referentes ao diagnóstico dos danos causados aos indígenas Pataxó e Pataxó HãHãHãe.

Nos anos de 2022 e 2023, reconhecendo a autonomia dos indígenas e respeitando os protocolos de consulta livre, prévia e informada das comunidades, a Vale iniciou tratativas com três grupos indígenas, assistidos por advogados particulares, por eles livremente escolhidos, que assinaturam acordos de indenização, os quais foram homologados judicialmente.

Esses acordos abrangem a reparação e compensação integral dos danos, perdas e prejuízos individuais e coletivos sofridos por essas comunidades, em decorrência do rompimento. Parte desses valores foi antecipada pela Vale em favor dos indígenas, e o pagamento das demais parcelas previstas será realizado após a certificação final da homologação pela Justiça".

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