Quando, no fim da manhã deste sábado (1º), motocicletas da Guarda Municipal de Belo Horizonte passaram pela movimentada avenida Abílio Machado, na região Noroeste, muitos lojistas se apressaram para baixar as portas de seus estabelecimentos com receio da fiscalização, que acabou não acontecendo. Tamanha tensão ocorre porque, de acordo com a Prefeitura de BH, o comércio não essencial na capital deverá permanecer fechado, ainda que não seja essa a realidade em alguns pontos da cidade.
Embora o executivo municipal tenha apresentado um plano reabertura, este só será colocado em prática quando os números da taxa de ocupação de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) em função da Covid-19 apresentar queda significativa e atingirem alertas verdes ou amarelos.
A notícia de que a flexibilização foi adiada frustrou os comerciantes. O empresário Raphael Lima Ferreira tinha esperança de que a PBH anunciasse um passo no sentido da reabertura, mas a notícia foi um balde de água fria nas pretensões do lojista. Desde o início da pandemia, em março, ele mantém fechada a loja de calçados que administra há 14 anos no Centro de BH. Segundo ele, o déficit de venda já ultrapassou R$ 300 mil, valor que diz ser irrecuperável.
Há uma semana, o comerciante começou a montar seu novo estabelecimento de calçados na avenida Abílio Machado.
Com as portas entreabertas, Ferreira decidiu abrir a loja neste sábado mesmo com o estoque incompleto. Ele lamenta a condição sob a qual tem de gerir seus negócios. "Estamos trabalhando igual traficante. Infelizmente, o jeito é descumprir a regra. Faço isso para colocar comida em casa. Não tem jeito: ou descumpro ou morro de fome", ele diz. Ferreira e sua esposa, que está grávida, têm um filho de 4 anos.
Raphael Lima Ferreira critica a postura do prefeito de BH. De acordo com o empresário, Alexandre Kalil está "destruindo o sonho das pessoas" e prejudicando o comércio da cidade e seus trabalhadores por não ter um plano para o setor. “Não recebemos nenhum tipo de auxílio dos governos municipal, estadual ou federal”, acrescenta.
Supervisor de vendas de uma loja de confecção na mesma avenida, Vitor Hélio Souza Pires diz que está tomando remédio para dormir por conta da tensão da rotina. "Acordo de madrugada achando que estou sendo perseguido. Estou me sentindo um bandido, nunca passei por isso por estar apenas trabalhando", diz. O estabelecimento do ramo de cama, mesa e banho tem 26 empregados. Caso a medida de fechamento do comércio não essencial se mantiver por mais 15 dias, Souza Pires já espera o pior: "Vamos falir, não tem outro caminho".
Um rapaz, que preferiu não se identificar, diz que os comerciantes estão sendo tratados como se fossem bandidos. Funcionário de uma floricultura na mesma região, ele está trabalhando de segunda a sábado, mas diz que se sente inseguro e receoso não só pela rotina desgastante, mas também sobre o futuro incerto. "O que o prefeito está fazendo é um absurdo. Estou aqui todos os dias nesse levanta e abaixa porta. Falta planejamento e humanidade ao Kalil. Isso é uma covardia", ele comenta.
Contrastes: Barreiro e Centro sem movimento
Na avenida Sinfrônio Brochado, na região do Barreiro, a situação era completamente diferente da avenida Abílio Machado. Apenas agências bancárias, que, pelo decreto, podem funcionar durante a pandemia, estavam funcionando. Porém, o movimento era fraco na manhã deste sábado.
Em outro ponto do Barreiro conhecido pela atividade comercial, a Praça da Febem, o clima de tranquilidade também foi o que a reportagem de O TEMPO encontrou. No Centro de Belo Horizonte, a mesma situação: poucas lojas abertas e sem registro de aglomerações.