Após marcharem feito zumbis, crianças entram em uma máquina de triturar e saem como carne moída. Essa é apenas uma das mais emblemáticas e impressionantes cenas do videoclipe “Another Brick in the Wall”, marco da discografia do Pink Floyd presente no álbum “The Wall” (1979), ópera-rock adaptada para o cinema em 1982. O caráter revolucionário, ali, já era latente e dava continuidade aos protestos políticos enfatizados em tantos outros álbuns, como “Animals”, lançado em 1977.
Principal letrista da banda, Roger Waters, 75, partiria em carreira solo em 1985, após desentendimentos com os demais integrantes. Mas o espírito revoltado jamais abandonou o britânico, que aos 5 meses perdeu o pai para a Segunda Guerra Mundial, morto na Itália. Tanto que é esperada para a turnê que chega neste domingo (21) a Belo Horizonte a continuidade das manifestações que em São Paulo e Brasília receberam vaias e aplausos, enquanto em Salvador o próprio astro foi às lágrimas.
“Quem conhece o Pink Floyd e, principalmente, a história do Roger sabe que todas as letras dele se inserem nessa linha de ativismo e inconformismo social e político”, afirma Luiz Oscar Niemeyer, diretor artístico da turnê “Us + Them” no Brasil. Em meio a um turbulento processo eleitoral no país, o músico não se absteve de exibir um telão com críticas ao deputado federal Jair Bolsonaro, ao chamar o candidato do PSL à Presidência do Brasil de neofascista e reproduzir as palavras de ordem “ele não”.
Na segunda apresentação em São Paulo, Waters turbinou as provocações ao cobrir o nome de Bolsonaro com a frase “ponto de vista político censurado”. E, em Salvador, foi além. Doze crianças em situação de vulnerabilidade social do Projeto Axé o acompanharam no palco durante a icônica canção “Another Brick in the Wall Part 2”, vestidas de presidiários estadunidenses, com macacões laranjas e capuzes pretos sobre a cabeça, além de trazerem a palavra “resistência” escrita nas camisetas.
Para completar, o artista homenageou Mestre Moa do Katendê, capoeirista baiano morto com 12 facadas após discussão em que declarou voto a Fernando Haddad, candidato à Presidência da República pelo PT. Foi nesse momento que, sem conter a emoção, Waters chorou frente a um público ao mesmo tempo triste e extasiado com a demonstração de sensibilidade do ídolo. “Roger tem uma história respeitável de resistência e militância ao longo de sua carreira, e eu não esperaria nada diferente dele”, declara a advogada Samantha Bauer, 29.
Gerações
Fã do Pink Floyd desde a infância, quando repetia com a irmã a famosa cena da marcha de estudantes no videoclipe de “Another Brick in the Wall”, Samantha garantiu o ingresso para o espetáculo em BH e aguarda com expectativa a chance de presenciar o que até hoje só viu pela TV. “Não é apenas um show de rock, é um convite a uma série de questionamentos e sensações. Nos tornamos pessoas melhores quando deixamos de ser um tijolinho na parede e pensamos livremente”, destaca.
O ator Alexandre Toledo, 54, assistiu pela primeira vez a um show de Waters há cinco anos, na capital paulista. Ainda assim a ansiedade para a apresentação na cidade mineira continua alta. “Estou até mais empolgado, porque, além de ‘The Wall’, ele vai tocar músicas dos álbuns ‘Dark Side of the Moon’ (1973), ‘Wish You Were Here’ (1975) e ‘Animals’. Espero que ele cante ‘Dogs’, que é uma das minhas canções favoritas”, diz.
Já o empresário Alexandre Lopes, 30, lembra dos tempos em que se arriscava no contrabaixo. “Gosto muito de ‘Comfortably Numb’ por ser parte de um repertório que eu tocava”, recorda. A música também é a predileta do administrador Raphael Alvarenga, 32. “Ela mistura psicodelia, melodia, harmonia e poesia, tudo que me encantou no grupo”, revela.
Roteirista, Mayra Santos, 25, dedicou seu trabalho de conclusão de curso na faculdade à banda. “Pink Floyd me torna mais humana e, ao mesmo tempo, me faz acreditar que existe muita coisa além dessa realidade enquadrada que vivemos”. A advogada Marcella Araújo, 29, segue a mesma linha. “As músicas do Pink Floyd sempre foram de resistência e de crítica, então acho que isso influenciou meu pensamento”, afiança. Para arrematar, o servidor público Leandro Nogueira, 39, retoma as controvérsias em torno de Waters. “Um dos papéis da arte é ilustrar as mazelas da sociedade de modo lúdico e poético, levando os indivíduos à reflexão”, conclui.
Repertório
“Speak to Me”
“Breathe”
“One of These Days”
“Time”
“The Great Gig in the Sky”
“Welcome to the Machine”
“Déjà Vu”
“The Last Refugee”
“Picture That”
“Wish You Were Here”
“The Happiest Days of Our Lives”
“Another Brick in the Wall Part 2”
“Another Brick in the Wall Part 3”
“Dogs”
“Pigs”
“Money”
“Us and Them”
“Smell the Roses”
“Brain Damage”
“Eclipse”
“Mother”
“Comfortably Numb”
Agenda
O quê
Show de Roger Waters
Quando
Domingo (21), às 21h
Onde
Estádio do Mineirão (av. Abrahão Caram, 1.001)
Quanto
De R$150 a $490