Literatura

Milton Hatoum no cinema

Redação O Tempo

Por LUCIANA ROMAGNOLLI
Publicado em 08 de março de 2011 | 17:20
 
 
 
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Por uma feliz coincidência, três diretores brasileiros de quem o escritor amazonense Milton Hatoum admira a obra se interessaram, quase ao mesmo tempo, por adaptarem seus romances para o cinema.

À medida que "Relato de um Certo Oriente" for transposto à tela grande por Marcelo Gomes ("Cinema, Aspirinas e Urubus"), "Órfãos do Eldorado" ganhar a adaptação de Guilherme Coelho (documentarista de "Fala Tu") e "Dois Irmãos" for convertido por Luiz Fernando Carvalho ("Lavoura Arcaica" e "Hoje É Dia de Maria") para cinema e televisão, a obra de Hatoum deve alcançar novos públicos.

"Tive muita sorte, porque o Luiz Fernando Carvalho é um grande diretor, tenho certeza de que vai fazer um trabalho que não irá frustrar meus leitores", diz o autor, sobre a iniciativa mais antiga e adiantada das três, a adaptação de "Dois Irmãos" - a história dos gêmeos Yaqub e
Omar, filhos de imigrantes libaneses.

A ideia - que integra o projeto Quadrante, do núcleo de minisséries da rede Globo - existe há quatro anos e já foi adiada por causa da crise econômica. "Agora está tudo mais ou menos encaminhado para que seja filmado neste ano. Li o roteiro e gostei muito", diz Hatoum.

O escritor acredita que a exposição de suas histórias no cinema e na TV pode atrair novos leitores - e de "qualidade". "Uma coisa é um filme comercial ou um seriado banal. Outra, um filme com linguagem mais ousada. Pode conquistar um público que nem se interessa por literatura brasileira".

Na segunda quinzena deste mês, escritor e diretor vão se encontrar para conversar sobre a "tradução criativa" que um projeto como esse exige. "No cinema, é mais difícil explorar a densidade psicológica e passar para a imagem o sofrimento do personagem ao longo do romance. Por isso exige um roteiro que fale profundamente do romance sem tentar reproduzir tudo", diz Hatoum.

Ele conta que entregou a Carvalho - assim como à tradutora alemã de livros seus - o esboço da casa onde se passa "Dois Irmãos", fotos da Amazônia e cartões-postais dos anos 1940 e 50, retirados de sua coleção particular. "Talvez meu modo de organizar o espaço seja uma herança da minha história com a arquitetura, dos projetos que eu gostaria de ter feito e não fiz".

A cidade que servirá de locação para "Dois Irmãos" deve ser decidida pela produção, mas Hatoum lembra que há uma externa que precisa ser feita em Manaus.

"O Marcelo Gomes vai encontrar menos dificuldade porque, em ‘Relato de um Certo Oriente’, muita coisa acontece no casarão", diz Hatoum. Em compensação, o escritor considera esse seu primeiro romance de adaptação complexa para o cinema, pelo tom memorialista e os raros diálogos. "Não sei que estratégia de narrador ele vai usar, mas o problema é dele. Já passei anos da minha vida para terminar esse livrinho", ri o escritor.

Marcelo Gomes conta que planeja recompor a memória da família pela narração em off, a partir do cruzamento de pontos de vista dos personagens. O diretor escolheu o livro de estreia, de 1990, exatamente pela reconstituição de lembranças e por trazer à tona o tema da alteridade.

"É o encontro entre diferentes personagens, de diferentes culturas, vivendo em um lugar nada peculiar, a Amazônia, e construindo a capacidade de conviver com o diferente e de se permitir um olhar interior para eles próprios a partir das diferenças do outro", analisa Gomes.

Já o desafio de Guilherme Coelho, o responsável por filmar "Órfãos do Eldorado", será maior na medida em que o cineasta transita do documentário - linguagem que desenvolveu até hoje - para uma novela romântica de alto teor onírico. "Ele vai atravessar o espelho", metaforiza Hatoum. "É louco pelo livro e tem uma ligação afetiva com Belém".

Agora, para a filmografia de seus romances ficar completa, só falta mesmo um dos cineastas brasileiros preferidos de Hatoum - Karim Aïnouz ("O Céu de Suely" e parceiro de Marcelo Gomes em "Viajo Porque Preciso, Volto Porque te Amo") - resolver filmar "Cinzas do Norte".

 

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