As minúcias da reforma tributária podem ficar restritas a contadores e ao departamento financeiro das empresas, mas ela afetará, em maior ou menor grau, todos os brasileiros. Entre tudo o que mudará, pode estar na mira o sonho da casa própria. Por um lado, o governo federal afirma que os preços não subirão devido à reforma. Mas o setor da construção civil contesta e avalia que é inevitável que fique mais caro comprar uma casa a partir de agora.

No centro dessa discussão, está a mudança dos tributos pagos pelo setor. A reforma tributária prevê a organização dos atuais impostos em apenas dois: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), devido a Estados e municípios, e o Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), direcionado ao governo federal. A soma da alíquota de ambos deve girar em torno de 26,5%, segundo as atuais projeções do governo. Ocorre que, hoje, antes da reforma, a carga da construção civil é de cerca de 8%.

Para minimizar a alta que surgiria com a mudança, o governo prevê uma redução de 40% da nova alíquota para o setor. Ainda assim, as empresas preveem que a carga tributária aumente entre 15,4%, no caso de imóveis com menor valor, e 51,7%, no caso dos mais caros. O cálculo é da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). A entidade argumenta que os preços só não aumentarão para o consumidor se a alíquota for reduzida em 60%, em vez dos 40% propostos. Essa mudança vale para os imóveis vendidos por empresas e não para transações entre pessoas físicas, que não serão tributadas.

No caso do aluguel, a alíquota foi reduzida em 60%, contudo o setor exige redução de 80%, sob o argumento de que a carga tributária da locação aumentaria 136,2% com a atual proposta.

O advogado tributarista e professor da UFMG e da PUC Minas Flávio Bernardes avalia que, na forma atual, a reforma de fato significará aumento do preço dos imóveis das construtoras. “Todo o setor terá impacto. O IBS e o CBS são pagos por quem vende, não é o adquirente quem paga. Mas, naturalmente, o custo estará no preço. É a essência da tributação. Se ela aumenta, o custo sobe e o preço da venda tem que aumentar para manter a margem”, explica.

O governo federal justifica que não é bem assim. Na prática, as novas regras de tributação reduzirão o valor dos imóveis de mais baixo custo e elevará o dos mais altos, segundo o Ministério da Fazenda. “Com esse novo modelo de tributação, sem considerar os ganhos de eficiência que resultam da reforma tributária, o custo de um imóvel popular novo (valor de R$ 200 mil) deverá cair cerca de 3,5%, e o custo de um imóvel de alto padrão novo (valor de R$ 2 milhões) deverá subir cerca de 3,5%”, diz nota da pasta, que contesta as informações do setor imobiliário.

O ministério acrescenta que, devido à lógica não acumulativa de impostos proposta pela reforma, os tributos pagos nos materiais de construção serão recuperados. Além disso, está previsto um redutor social de R$ 100 mil na compra de imóveis. Isto é, se um imóvel vale R$ 200 mil, a empresa paga um imposto referente a somente R$ 100 mil. Da mesma forma, se ele vale R$ 2 milhões, a empresa paga por R$ 1,9 milhão. No aluguel, a lógica é a mesma, com redutor social de R$ 400.

O relator da regulamentação da reforma, o deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG), sublinha que ela pode tornar os imóveis mais acessíveis para a população mais pobre. “Se você comprar uma casa de R$ 150 mil, R$ 100 mil estão fora. Se comprar uma de R$ 1 milhão, também saem R$ 100 mil. Beneficiamos as camadas de menor poder econômico e as casas de menor preço. Depois, ainda criamos um redutor de lote. Achamos que ficou muito equilibrado e fortaleceu a construção civil”, diz.

Ainda não há uma conclusão sobre as regras finais para o mercado imobiliário, que podem mudar. A regulamentação da reforma tributária, na forma do Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024, passou na Câmara dos Deputados e, agora, segue para o Senado, onde pode receber novas modificações. A perspectiva é de uma aprovação ainda neste ano. Depois disso, a reforma será implementada gradualmente.