As sobretaxas de 50% a produtos brasileiros, anunciadas na quarta-feira (9) pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, podem afetar o PIB (Produto Interno Bruto) nacional já neste ano. A estimativa da XP Investimentos é que, até dezembro, o impacto sobre o PIB seja da ordem de 0,3 ponto percentual, reduzindo as expectativas de crescimento da economia dos então 2,5% para 2,2%. Para 2026, o efeito esperado é de 0,5 ponto, levando as projeções da corretora de alta de 1,7% para 1,2%.
O cálculo preliminar foi apresentado pelo economista-chefe da casa, Caio Megale, durante entrevista coletiva nesta quinta-feira (10). A conta considera que as sobretaxas não serão alteradas e que o governo brasileiro não irá retaliar -fatores que podem mudar nos próximos dias, considerando o histórico recente de negociações de países afetados pelo tarifaço de abril e o vaivém de Trump em relação à política comercial.
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A princípio, segundo Megale, os efeitos sobre a balança comercial do país não serão tão expressivos, a exemplo da taxação do aço brasileiro anunciada na primeira leva do tarifaço. O metal é o principal produto exportado do país para os Estados Unidos.
"Sobretaxas de 50% são um movimento bastante agressivo e o impacto sobre alguns setores será importante. Mas temos que fazer algumas considerações: o aço, por exemplo, já estava sendo taxado antes e [a taxação] não afetou muito a perspectiva macroeconômica daqui, nem a balança comercial. Pelo contrário, continuamos exportando aço no mesmo ritmo das exportações anteriores", afirma Megale.
As exportações totais do Brasil para os Estados Unidos representam cerca de 2% do PIB. Ao abrir a cesta, 53% são de bens manufaturados, no qual se incluem produtos semiacabados de aço e alumínio, 28% de produtos agrícolas e o restante petróleo e derivados.
O impacto direto no PIB virá dos bens manufaturados, segundo Megale. Enquanto produtos agrícolas e demais commodities podem ser redirecionados para outros países parceiros, a concorrência da indústria de transformação pode inviabilizar o comércio desse setor com os Estados Unidos.
"Sobretaxas de 50% matam o produto. Os compradores provavelmente vão pegar de outro lugar e não vão pagar 50% a mais pelo produto brasileiro, ainda que seja bom. É provável que as exportações fiquem perto de zero ao longo do tempo, se as tarifas permanecerem assim, e não é fácil redirecionar esses bens para o mercado interno", afirma o economista-chefe da XP.
Há ainda um impacto indireto no PIB. As medidas erráticas de Trump, não raras anunciadas do dia para a noite, inspiram incerteza no mercado. A consequência mais visível é a depreciação do câmbio -o dólar chegou à máxima de R$ 5,60 nesta quinta, depois de ter batido a mínima de R$ 5,40 na semana passada- e escalada das curvas de juros do longo prazo, à medida que as dúvidas sobre a política, a geopolítica e a economia levam os operadores a colocar o pé no freio.
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A mudança nas expectativas e a volatilidade cambial podem aumentar os preços no Brasil, gerando inflação. Isso tem efeitos diretos no consumo e, por consequência, no PIB. Se o governo brasileiro retaliar, o impacto pode ser maior.
"Digamos que o governo imponha a mesma sobretaxa, de 50%, sobre produtos importados dos Estados Unidos. Podemos ver um impacto grande, sobretudo em linhas como remédios, produtos químicos, plásticos, embalagens e combustíveis como querosene de aviação", diz Megale.
"Nada disso tem uma relevância grande na produção doméstica, mas há alguma relevância. É possível que jogue a inflação para cima. Com mais inflação e câmbio depreciado pela aversão ao risco, o Banco Central fica mais conservador. Mantemos a previsão da primeira queda de juros em janeiro, mas, na margem, vemos um choque de oferta negativo. Um pouco mais de inflação, um pouco menos de PIB."
O J.P. Morgan, por outro lado, vê um impacto estimado entre 0,8% e 1,2% do PIB caso a sobretaxa seja integralmente implementada. O banco ressaltou que não está alterando as previsões sobre o crescimento da economia ou sobre o saldo comercial ainda, dada a incerteza sobre a política dos EUA. É possível, segundo os analistas da casa, que aconteça o mesmo que ocorreu com outros parceiros comerciais e que os dois países sentem à mesa para negociar níveis tarifários e prazos.