Avós que criam netos podem ter direito a uma série de benefícios pouco conhecidos, que vão desde a inclusão dos menores como dependentes na declaração do Imposto de Renda e deduções ligadas a essa inclusão, até a isenção total do tributo em caso de doença grave.
Em algumas situações, também é possível deixar para eles a pensão por morte paga pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) ou receber esse benefício, desde que se comprove a dependência econômica.
Esses direitos, no entanto, estão sujeito a regras específicas. Para inserir o neto como dependente no IR e deduzir gastos com educação e saúde, é preciso ter a guarda. No caso da pensão do INSS, lei recente do governo federal incluiu o menor sob guarda no rol dos beneficiários.
Já quem cuida informalmente, mesmo quando os avós são de fato os responsáveis financeiros, costuma enfrentar barreiras legais.
Incluir o neto como dependente no Imposto de Renda garante ao avô ou avó uma restituição maior ou valor menor de imposto a pagar, mas, segundo Marco Antônio Ruzene, advogado tributarista e sócio do Ruzene Advogados, só avós com guarda legal podem declarar os netos e netas como dependentes.
Assim, é possível incluir despesas como educação e saúde, além de conseguir dedução de R$ 2.275,08. No caso do gasto com educação, a dedução é de R$ 3.561,50 por dependente. Despesas com saúde não têm limite.
"O valor dos gastos com um dependente que ultrapassar esse limite não pode ser aproveitado nem mesmo para compensar outros gastos. E vale observar que não é qualquer despesa com educação que pode ser abatida, é com educação forma", diz o advogado.
PENSÃO DO INSS POR MORTE
Uma lei sancionada em março deste ano pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) garante ao menor sob guarda o direito de receber a pensão do INSS caso o adulto responsável morra.
Esse direito estava sendo debatido no STF (Supremo Tribunal Federal) justamente porque a tia de uma criança de oito anos foi à Justiça em busca da pensão porque o avô, que detinha a guarda do neto desde os cinco anos, mas não tinha tutela legal, morreu.
O INSS havia negado a pensão. Agora, com a lei, o direito fica garantido.
Em situações menos frequentes, os avós também podem solicitar pensão por morte do neto. Isso ocorre quando o idoso dependia economicamente do neto, com quem morava e precisar provar que ele era responsável por seu sustento.
Segundo Juan Carlos Serafim, sócio do Aith, Badari e Luchin Advogados, essa concessão depende da comprovação de dependência econômica exclusiva e costuma ser reconhecida apenas na Justiça.
"Não é algo recorrente. O INSS tende a negar o pedido, mas a Justiça reconhece quando há comprovação de que o neto sustentava o avô", afirma.
Além dos direitos relacionados à criação dos netos, os idosos também têm garantias próprias, como a aposentadoria, o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e a prioridade na tramitação de processos judiciais.
O direito econômico mais conhecido entre os idosos é a aposentadoria. Pelas regras atuais da Previdência Social, mulheres podem se aposentar com 62 anos de idade e ao menos 15 anos de contribuição. Para os homens, a idade mínima é de 65 anos, com exigência de 20 anos de contribuição.
É comum também que avós recebam pensão por morte em caso de falecimento do cônjuge. O benefício é destinado aos dependentes do segurado e é concedido em razão de sua morte ou morte presumida.
Outra possibilidade é o acesso ao BPC, que garante um salário mínimo mensal ao idoso com 65 anos ou mais, desde que comprove renda familiar per capita de um quarto do salário mínimo. No BPC, não é preciso contribuir com o INSS, mas também não há 13º salário nem pensão por morte.
Aposentados que apresentam doenças graves e precisam da ajuda de um cuidador também têm direito a um adicional de 25% sobre o valor da aposentadoria. Segundo Serafim, o benefício é concedido independentemente de o aposentado já receber o teto do INSS, e não importa se o cuidador é um familiar ou um profissional.
O critério central é a necessidade de assistência permanente de terceiros para as atividades do dia a dia.
Além desse benefícios, os idosos também contam com o direito a prioridade na tramitação de processos judiciais, sendo necessário que a pessoa tenha 60 anos ou mais e figure como parte no processo.
Lucas Menezes, advogado especialista em direito de família e sócio do escritório Pessoa & Pessoa Advogados, explica que, na prática, isso nem sempre resulta em agilidade. "O Judiciário brasileiro é bastante sobrecarregado, e mesmo os processos prioritários podem levar anos. Mas essa prioridade é um direito que deve ser sempre pleiteado", diz o especialista.
QUANDO POSSO TER ISENÇÃO DO IR?
Segundo Juan Carlos Serafim, idosos acometidos por alguma doença grave - como câncer, cardiopatia grave ou paralisia incapacitante - podem ter direito à isenção total do Imposto de Renda sobre a aposentadoria e a pensão. O benefício também se estende a quem já se curou da doença.
"Isso vale para aqueles avós, aposentados e pensionistas, de qualquer regime. Não só do INSS, como também servidores e aqueles com aposentadoria privada", diz o especialista.
Serafim explica que é comum que aposentados tenham receio de perder o benefício ao pedir a isenção, mas reforça que a ação é tributária, contra a União, e não envolve o INSS. Como o processo não avalia a capacidade do segurado, não há risco de cancelamento da aposentadoria ou pensão.
Nos casos em que o avô é responsável por um neto com algum tipo de deficiência mental ou física o doença grave, incluindo o autismo, e que seja pensionista, também pode haver isenção do IR em nome do menor, desde que a condição seja comprovada.
POSSO INCLUIR MEU NETO COMO DEPENDENTE NO IR?
Sim. Marco Antônio Ruzene, advogado tributarista e sócio do Ruzene Advogados, diz que avós com guarda legal podem declarar os netos e netas como dependentes. e incluir despesas com educação e saúde.
Ele explica que, ao declarar o IR, é preciso fazer simulações para saber se vale a pena incluir o dependente, já que, se o neto tiver renda, mesma que seja baixa, de uma pensão por morte, pensão alimentícia ou um estágio, por exemplo, pode não valer a pena.
HÁ LIMITE DE IDADE E RENDA PARA SER INCLUÍDO COMO DEPENDENTE?
Sim. Ruzene explica que netos e bisnetos podem ser incluídos como dependentes na declaração do IR em três situações: até os 21 anos de idade, desde que o contribuinte tenha a guarda judicial; entre 21 e 24 anos, se estiverem cursando ensino superior ou escola técnica de segundo grau e o responsável tiver detido a guarda até os 21 anos; ou em qualquer idade, no caso de pessoas com deficiência.
Além da idade, há limites de renda que devem ser observados. O principal é se o neto teve rendimentos tributáveis anuais acima de R$ 33.888,00 em 2024 ou rendimentos mensais superiores a R$ 2.824,00, já considerando o desconto simplificado.
Outras situações que também exigem a declaração são as seguintes:
- Se o neto recebeu rendimentos isentos, não tributáveis ou tributados exclusivamente na fonte acima de R$ 200 mil
- Se o neto teve receita bruta de atividade rural superior a R$ 169.440
- Se o neto possuía bens ou direitos com valor total superior a R$ 800 mil em 31/12/2024
- Se o neto realizou operações na Bolsa de Valores com vendas acima de R$ 40 mil ou com lucro sujeito ao Imposto de Renda
- Se o neto obteve rendimentos no exterior, como aplicações financeiras, lucros ou dividendos
COMO EVITAR CAIR NA MALHA FINA?
Para evitar cair na malha fina ao declarar netos como dependentes, é necessário observar que o neto deve ter até 21 anos, ou até 24 anos caso esteja cursando ensino superior ou técnico, e o contribuinte deve ter a guarda judicial da criança. Além disso, o neto não pode ser declarado por outra pessoa, como os pais.
Também é importante manter documentos que comprovem a legalidade da inclusão. Entre eles, estão o termo de guarda judicial emitido, o CPF do neto, comprovantes de despesas com educação, saúde ou pensão alimentícia e, se houver, documentos que atestem os rendimentos do dependente.
QUANDO OS AVÓS PODEM OBTER A GUARDA LEGAL DOS NETOS?
Lucas Menezes, advogado especialista em direito de família e sócio do escritório Pessoa & Pessoa Advogados, afirma que o exercício da guarda dos netos pelos avós é excepcional, mas pode ser essencial em determinadas circunstâncias.
Segundo ele, os avós podem obter a guarda quando os pais estão ausentes, faleceram, são negligentes ou vivem em condições que colocam a criança em risco como em casos de violência doméstica, vício em drogas ou abandono.
"Também é possível quando, mesmo sem problemas legais, a criança já vive com os avós há bastante tempo, está bem adaptada e encontra ali um ambiente de afeto, segurança e estabilidade", diz Menezes.
Nessas situações, é necessário ingressar com uma ação judicial.
O juiz, antes de decidir, costuma solicitar estudos sociais e psicológicos para avaliar se a mudança atende ao melhor interesse da criança.
TER A GUARDA LEGAL GARANTE QUE OS AVÓS POSSAM PEDIR PENSÃO ALIMENTÍCIA AOS PAIS DA CRIANÇA?
Sim. Segundo o advogado, mesmo sem a guarda, os pais continuam sendo os principais responsáveis pelo sustento dos filhos. Quando os avós assumem legalmente essa responsabilidade, passam a ter o direito de solicitar pensão aos pais, a fim de garantir o atendimento das necessidades básicas da criança.
"A lei brasileira deixa claro que a obrigação dos avós é subsidiária ou seja, só entra em cena quando os pais não têm condições. Mas a guarda formal dá força jurídica ao pedido de pensão, além de facilitar várias questões práticas do dia a dia, como a matrícula em escolas ou inclusão da criança em um plano de saúde", diz o especialista.
OS AVÓS PODEM TER QUE PAGAR PENSÃO AOS NETOS?
Sim. Tribunais já decidiram, em diversas ocasiões, que os avós devem arcar com pensão alimentícia aos netos, mas apenas quando os pais não têm condições financeiras de cumprir essa obrigação.
Segundo Lucas Menezes, essa é uma responsabilidade que só recai sobre os avós quando todas as possibilidades de os pais arcarem com os alimentos se esgotam. "Ou seja, não é regra geral, mas uma medida excepcional para proteger os menores", afirma.
E QUANDO OS AVÓS CUIDAM DOS NETOS SEM GUARDA FORMAL?
Essa é uma situação bastante comum, especialmente em famílias que, por afeto ou necessidade, se organizam de forma informal. No entanto, segundo Menezes, nesses casos, os avós não têm os mesmos direitos garantidos por lei.
Sem a devida formalização, eles podem enfrentar dificuldades para tomar decisões importantes, como autorizar tratamentos médicos, matricular a criança na escola ou incluí-la em um plano de saúde. Também podem ter problemas para acessar benefícios previdenciários, como a pensão por morte.
"Aliás, nossos tribunais entendem que, para ter direito a certos benefícios, é preciso comprovar que há guarda formal. Em um caso recente, de junho de 2025, por exemplo, o Tribunal de Justiça da Paraíba negou a pensão por morte a uma criança justamente por falta dessa formalização", diz Menezes.
O advogado explica, no entanto, que existe a possibilidade de reconhecimento da chamada filiação socioafetiva, quando os avós ocupam efetivamente o papel de pais na vida da criança. Nesses casos, os efeitos são ainda mais amplos, inclusive no registro civil.
Em 2024, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) reconheceu esse tipo de vínculo até mesmo entre avós e netos maiores de idade, quando a relação afetiva vai além da convencional. (Júlia Galvão)