A opção de compra do excedente produtivo dos setores afetados pelo tarifaço de 50% de Donald Trump às exportações brasileiras pode ser uma alternativa viável para minimizar impactos na economia brasileira. A possibilidade foi aventada pelo governo federal, para distribuição no mercado nacional, de itens como frutas, café e pescados.
Especialistas ouvidos pela reportagem de O TEMPO avaliam que a medida pode dar um suporte, a curto prazo, às cadeias que contabilizarem perdas com as reduções de exportações aos Estados Unidos. Na semana passada, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), afirmou que a União pode alterar a legislação e permitir que os governos estaduais possam comprar o excedente de alimentos que deixarem de ser negociados com o mercado norte-americano.
A mudança na legislação, que pode ocorrer por meio de medida provisória ou projeto de lei, é necessária porque exigirá mudanças na regulação de compras governamentais. Em vez de seguir a lógica tradicional, com pregões eletrônicos pelo menor preço, com margem de preferência para produtos nacionais e cota de pelo menos 30% para produtos da agricultura familiar (no caso do PAA), as compras passariam a beneficiar os exportadores.
O economista e professor de Relações Internacionais do Ibmec-RJ José Luiz Niemeyer analisa que a medida seria mais eficaz na fruticultura. Uma das grandes preocupações se dá com a manga, a principal fruta in natura exportada pelo Brasil aos Estados Unidos. Uma alternativa para a distribuição no mercado interno seria para uso em merenda escolar, segundo o docente, que prevê uma queda no preço do produto.
“O Estado gastar dinheiro e comprar essa produção pode ser, sim, uma solução. Mesmo que ela vá atingir apenas alguns setores específicos, mirando os pequenos produtores, como o de frutas”, complementa o professor, que rechaça a possibilidade de aquisição de itens como a carne vermelha.
Para o Niemeyer, essa produção deveria ser comercializada no mercado interno pelos frigoríficos com açougues ou então com novos mercados. “Esse plano, se acontecer, os setores afetados e que são mais intensivos em capital, setores grandes do agronegócio, têm condições de ofertar esses produtos no mercado interno sem compras governamentais. Os outros, que são setores mais sensíveis, formado por pequenos e médios produtores, o governo pode sim bancar essa conta para distribuir no mercado interno”, complementa.
O especialista em comércio exterior Jackson Campos endossa a avaliação. “Creio que os produtos frescos e perecíveis que estragariam no pé poderiam ser comprados pelo governo. A carne em si provavelmente não valeria a pena para o mercado nacional, pois é possível que não seja abatida”, disse Campos. Ele também vê entraves para absorver itens de outros setores industriais, como o segmento calçadista.
“Isso porque as mercadorias que são produzidas para exportação são feitas com qualidade superior para atender os mercados internacionais e os investimentos dos produtores são altos, que normalmente não compensariam o preço vendido no Brasil”, arremata.