Falência Múltipla

Afetado, comércio se encolhe 

Com menos emprego e salários atrasados, varejo computa unidades fechadas

Por Ludmila Pizarro / Queila Ariadne
Publicado em 04 de abril de 2016 | 03:00
 
 
 
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Ipatinga, Montes Claros e Uberaba. O desemprego aumenta, o povo compra menos. As vendas diminuem, a prefeitura arrecada menos impostos e atrasa os salários dos servidores. Eles compram menos, as vendas diminuem e o desemprego aumenta. Nessa ciranda, fica difícil saber se demitiu porque não comprou ou não comprou porque foi demitido. O resultado é um festival de placas de “passa-se o ponto” espalhadas pelos centros comerciais das cidades-polo. “Não sabemos ao certo quantas lojas fecharam em Montes Claros, mas em dezembro, janeiro e fevereiro, a inadimplência chegou a 5%, e o comércio está empregando 9% a menos”, afirma o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Montes Claros (CDL), Gilberto Eleutério.

Nunca se fechou tanta vaga em Ipatinga, no Vale do Aço. No ano passado, o saldo entre contratações e demissões ficou negativo, com menos 6.941 empregos, o pior desde 2002, segundo o Caged. Desse total, 73,5% está concentrado na indústria de transformação e na construção civil, e 26%, no comércio e serviços.

Não há números oficiais em Ipatinga, mas, pelo “olhômetro”, em uma simples caminhada pelo quarteirão da avenida 28 de Abril, principal ponto do comércio de rua do centro, é possível ver muitas portas baixadas. O presidente da CDL local, Cláudio Zambaldi, afirma que a redução chega a 10%.

A empresária Alcione Gonçalves Pereira fechou uma das duas lojas de roupas. “Muita gente ainda está ganhando o mesmo e não foi afetada, mas fica com medo e para de comprar”, explica. “Trabalho há sete anos no comércio e nunca vi isso. A crise da economia é uma justificativa, mas a situação da Usiminas – que está em negociação para evitar uma recuperação judicial – faz o medo piorar”, comenta a funcionária Crislaine Ferreira, demitida da loja de Alcione. “As vendas caíram muito desde outubro. Para não fechar, a gente reduz os funcionários e faz promoção”, afirma a gerente da loja Torra Tudo, Érika Martins.

Sadala Azor Fakhouri, 60, é dono da loja São Paulo, que existe há 26 anos, em Uberaba, no Triângulo Mineiro. “O que eu sinto é da falta de circulação de dinheiro. Acho que por causa do desemprego, principalmente, e também falta de crédito. As minhas vendas nesses primeiros meses de 2016 caíram pelo menos 50% em relação ao ano passado”, diz.

Segundo ele, a crise foi planejada. “Venderam de tudo para todo mundo, carro, geladeira, Minha Casa, Minha Vida. Agora não tem como consumir, comprar no crédito com plano de 45, 60 dias”, afirma.

O comerciante Ildeu Nunes Moreira, 41, tem nove lojas de roupa e uma de construção. Ele calcula que as vendas caíram de 10% a 15% em 2015. “Com relação a equipe, não demiti, mas os empregados que saíram não foram repostos e, ao todo, diminuí de 20% a 30%”, diz.

Crise se alastra até chegar ao campo

Montes Claros. Rosilene da Silva, 25, e Ronildo Freitas, 39, acabaram de ser demitidos. Eles não foram dispensados do comércio, mas afetam diretamente as demissões do setor, pois passaram a consumir menos. “Eu era empregada doméstica, e minha patroa me mandou embora por causa da crise”, conta Rosilene. “Eu estou dando entrada no seguro-desemprego. Trabalhei durante um ano em uma fazenda, mas meu patrão disse que as coisas ficaram difíceis”, afirma Ronildo.

FOTO: UARLEN VALERIO
Crise na cidades polos de Minas Gerais norte de Minas
Ronildo Freitas trabalhava no campo e foi demitido devido à crise

O presidente da Sociedade Rural, Osmani Barbosa, explica que a crise econômica é agravada no Norte de Minas por uma seca que dura cinco anos. “Os agricultores ficam endividados, o crédito está mais caro, e eles não têm como pegar novos financiamentos.” Segundo ele, os ministérios da Fazenda e da Agricultura e os bancos de fomento precisam montar um plano para alongar prazos de dívidas antigas e liberar dinheiro novo. 

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