A dona de casa Ilma Maria Barbosa Ferreira, 62, e o marido precisavam se mudar de Governador Valadares, na região do Rio Doce, para Belo Horizonte. Eles encontraram o apartamento ideal para alugar no bairro Santo Antônio, na região Centro-Sul, fizeram uma proposta, conseguiram fiadores e tiveram a ficha aprovada.
O casal, então, contratou a mudança, empacotou tudo em casa e, quando veio à capital para assinar o contrato, foi informado de que não poderia fechar o negócio: o imóvel já tinha sido alugado, por meio de outra imobiliária.
“Eu já tinha até combinado com o proprietário da casa onde eu moro em Valadares de sair, já estava tudo pronto. Fiquei muito decepcionada, porque é difícil achar um apartamento que a gente gosta, com o tamanho, o preço e a localização ideais”, desabafa Ilma, que acabou alugando outro imóvel na capital.
Casos de locação em duplicidade, que podem ocorrer quando o proprietário de um imóvel recorre a mais de uma imobiliária, têm se tornado mais comuns, principalmente com as imobiliárias virtuais, segundo o presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG, Kênio de Souza Pereira.
Segundo ele, não é ilegal entregar o imóvel a mais de uma imobiliária, mas isso favorece a assinatura de dois contratos para uma única propriedade. “A locação em duplicidade é extremamente fácil de acontecer, porque, com a chave do imóvel, a imobiliária tem procuração para fechar o contrato. O proprietário deve escolher uma única empresa para ter segurança e saber a quem cobrar se tiver algum problema”, afirma.
De acordo com o advogado, o proprietário que provoca a locação em duplicidade pode ser responsabilizado judicialmente. “O inquilino preterido, que assina o contrato e fica sem o imóvel, tem direito a requerer indenização por danos materiais, que geralmente se baseia em seis meses de aluguel, e danos morais, pelo sofrimento, angústia, vergonha e desgaste que passou”, ressalta Pereira.
O advogado aconselha proprietários que querem uma divulgação maior do imóvel a optarem por uma rede de imobiliárias.
A diretora da imobiliária Céu Lar Imóveis, que cuidava do aluguel de Ilma, Adriana Magalhães, ressalta que a locação em duplicidade prejudica principalmente o inquilino, mas, também, a própria imobiliária, uma vez que a empresa só recebe quando fecha o negócio.
Adriana ressalta que trabalhar com exclusividade é o ideal, mas tornou-se mais difícil: “É uma relação de confiança, tanto que a gente tem procuração dos proprietários para assinar por eles. Como estamos em recessão e o período em que o imóvel está vago gera despesas, o proprietário fica ansioso para alugar rápido e é assediado por imobiliárias”, diz, ressaltando que o proprietário deve avisar se já estiver trabalhando com outra imobiliária.
Imobiliária 'original' deve ser comunicada pelo corretor
Trabalhar com um imóvel que já esteja com outra imobiliária sem comunicar a ela fere o código de ética da corretagem, segundo o presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG, Kênio de Souza Pereira. O texto veda ao corretor “aceitar incumbência de transação que esteja entregue a outro corretor sem lhe dar prévio conhecimento por escrito”.
“A imobiliária tem que procurar saber se o imóvel já não está sendo anunciado por outra e, se estiver, ela só pode trabalhar com o imóvel após comunicar a outra”, diz Pereira. Segundo o advogado, o corretor que age dessa maneira pode sofrer um processo no Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci), receber multa e até ser suspenso da atividade imobiliária.
Dono da imobiliária Colonial Imóveis, Dias Vieira, diz que, muitas vezes, os proprietários não avisam que já entregaram seu imóvel a outra imobiliária. “Isso aumenta as chances de problema”, afirma.
A reportagem questionou o Creci-MG sobre o assunto, mas não obteve retorno.